Sozinha

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Meu quarto sempre foi decorado. Sempre cheio de quadros, alguns espelhos, retratos, posters... Mas parece tão vazio. Como pode uma pessoa como eu, que tem tudo que mais deseja nesse mundo e é cercada de oportunidades e privilégios, ser tão triste e miserável por dentro?

As vezes sinto como se faltasse algo de mim, e a cada dia que passa essa parte faltando aumenta. É como se morresse enquanto eu durmo, caísse da cama e sumisse no carpete do quarto direto para um outro mundo que eu não sei qual. Mas gostaria de saber. Gostaria de ver. Gostaria de ir para lá.

Sonhos, deveres, tarefas... Tudo parece tão distante, tão escuro e tão borrado como se fossem um sonho antigo que forço para lembrar. Dói pensar, dói forçar. Mas ninguém mais liga, ninguém mais quer saber o que eu quero, ou sonho, além de uma folha de papel amarelada que insisto em chamar de "Diário". Aquilo não é um diário, uma vez que não escrevo mais todos os dias. Só escrevo quando está insuportável e não cabe mais no meu peito, e eu preciso colocar para fora antes que me consuma.

Está me consumindo. Parece uma doença grave, uma ferida que não sara e apenas aumenta - mesmo que eu não toque nela por anos. Ninguém mais vê, mas eu sim. Sempre que olho no espelho, sempre que procuro algo em mim para gostar e sempre que alguém me elogia - eu não a vejo, eu a sinto queimar dentro de mim.

Música desliga o mundo, livros são meu avião para fora desse lugar tão escuro e sombrio que chamo de mente. Lá ele não pode me atingir, o botão de autodestruição não pode ser tocado. Eu sou intocável naquele lugar meu, no meu mundinho e cada vez mais estou presa nele. Cada vez mais quero viver nele.

Quem sabe um dia eu vá, e quem sabe esse dia esteja mais perto do que longe. Eu não sei quanto tempo aguentarei, mas estou aqui.

Eu ainda estou aqui. Sozinha. Mas estou.

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