Capítulo 2.1

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A voz amoleceu minhas pernas. Meus olhos pareciam não querer olhar no rosto daquele homem, acho que era uma forma de protesto por toda a dor de cabeça que vinha me causando. Respirei fundo. Fechei os olhos e massageei as têmporas. Umedeci meus lábios antes que eu pudesse enfim, encará-lo. Ele sorria.

Já conheceu um idiota? Desses que entorta os lábios em um sorriso cínico e te olha como se você fosse um nada? Havia um desses em minha frente e me olhava de forma zombadora. Dei um dos meus sorrisos mais falso, nos encaramos sem dizer nada por um tempo assustador.

— Você fala com convicção! — as palavras saltaram da minha boca.

Dei as costas para aquele homem grosseiro e rude, estava calculando o que era possível e impossível naquela altura do campeonato. Em quantos anos eu pegaria de cadeia caso viesse a cometer um homicídio. Não vou negar que fiquei nervosa com sua presença, na verdade, estava um pouco repudiada por justamente esse homem ser o milionário que iria derrubar minha biblioteca.

— Sou Ethan Burke!

— Não perguntei seu nome. — respondi sem demonstrar um pingo de educação. Agora, eu não falava apenas com um homem bonito. Agora, eu falava com um homem bonito e destruidor de bibliotecas.

— É costume dos seres humanos serem educados. — cruzou os braços na altura do tórax.

— É costume dos seres humanos destruirem bibliotecas também? — rebati me sentando à mesa. Notei o barulho do seu sapato social passear pelo chão.

— Eu quero minha empresa aqui porque é o melhor lugar da cidade, não tenho culpa se sua biblioteca está neste espaço e só para deixar claro, costumo conseguir o que eu quero. — dirigiu as palavras a mim.

Não me virei, permaneci com meus olhos nas folhas sobre o meu balcão. Não procurava nada especifico, só não queria ter que olhá-lo.

Costumo conseguir o que eu quero!

Humildade passou lá em casa e mandou lembranças.

— Um homem que não aceita perder? — questionei sem o menor interesse em saber de sua vida medíocre. — Você deve ser muito infeliz.

Alguém que precisa diminuir outras pessoas e demonstrar maior poder para sentir-se bem, na certa, deveria ter algum tipo de carência. Esperei por sua resposta. Na verdade, esperei por uma má resposta. Só se ouvia as vozes das garotas mais ao longe e junto delas, o som das folhas quando elas viravam as páginas do livro. Não sei dizer em qual momento elas abriram as portas da sala de estudos.

Deixei o sujeito parado ao lado do balcão e caminhei com a lista de anotações até a prateleira três, onde eu havia guardado os novos livros que chegaram. Mordi a ponta da caneta enquanto meus olhos conferiam os títulos e meu cérebro traçava uma linha imaginária que nos mantinha a um bom espaço de distância.

— Como pode julgar sem me conhecer?

Paralisei. Ele não estava ao lado do balcão como na última vez, por algum motivo desconhecido por mim, ele havia passado pela linha imaginária que eu havia feito entre nós e estava parado atrás de mim. Com seus lábios sibilando palavras perto demais ao meu pescoço.

— Você é um homem esnobe. Não há muito para se conhecer, você não tem nada de bom para oferecer. — falei baixo.

— Tirou suas conclusões baseadas em quê? — tinha um tom indignado.

— Baseadas na sua total falta de compaixão por um lugar repleto de histórias e culturas que você quer destruir para levantar um ridículo cibercafé. — respondi mantendo meus olhos na prateleira. — Agora volte para perto do balcão, senhor Burke.

Peguei um livro qualquer e abri em uma página qualquer, não ouvi o som de sua voz de imediato mas, pude ouvir seus passos afastando-se. Estava indo para perto do balcão. Soltei um suspiro de alívio e guardei o livro em seu devido lugar, comecei a mentalizar algumas palavras em minha mente, algumas do tipo: mantenha a paciência! Uma boa conversa pode resolver as coisas. Minha mãe ficaria orgulhosa em saber que eu ouço sim, o que ela fala. Só não tenho o hábito de praticar.

— É tão perturbadora a minha presença?

Não virei mas, poderia jurar que ele estava com um daqueles sorrisos cínicos nos lábios. Como se a sua presença estivesse de fato me perturbando em algum sentido. Espera! Sim, a presença dele estava me perturbando muito.

— Sim. — soltei um suspiro irritado e o olhei. — a presença do homem que quer destruir a minha vida é bem perturbadora. Peço que se retire da minha biblioteca.

— Já percebi que educação realmente não é o seu forte.

Pude sentir minhas bochechas queimarem. Não havia nenhum modo de ser educada com ele, como poderia exigir isso de mim? Em todo caso, eu não podia virar a vilã da história. Estava na hora de praticar a tal palavra calma que eu vinha escutando o dia inteiro.

— Olha, eu não quis ser...

— Petulante? Ousada? — ele tentou completar minha fala. Mas, da onde que ele havia tirado que eu tinha sido petulante e ousada? Oras, eu só estava protegendo o que era meu.

— Inconveniente. — enruguei o cenho e voltei para perto do balcão parando ao seu lado. — Só estou muito fula por você querer destruir a minha vida. — nossos olhos se cruzaram.

— É só uma biblioteca! — ele rebateu. Cruzou os braços na altura do tórax novamente e me olhou intrigado.

— Para pessoas com pouco cérebro e que só se importam com o número bancário pode sim, ser apenas uma biblioteca. Para mim são mil vidas que lutam diariamente para deixar o mundo saber as lições que elas querem passar. Nunca leu um livro na vida, senhor Burke? — notei em como a minha pergunta o constrangeu.

O observei por poucos segundos tentando decifrar um pouco mais sobre esse homem mas, não obtive nenhuma resposta. Ele continuava um mistério para mim. E eu só conseguia pensar no porquê dele ter escolhido justamente o lugar da biblioteca para construir sua empresa.

Ele não deu nenhuma resposta e nem fez menção disso, apenas deu as costas e caminhou em direção à saída. Fiquei completamente desnorteada com sua reação. Fiquei o observando partir e quase me arrependo da pergunta que havia feito.

Já havia lido em muitos livros que homens ricos e poderosos, normalmente crescem sem a atenção dos pais e, eu como uma leitora voraz estava quase crendo que esse era o caso dele. Antes que Ethan alcançasse a porta ele parou e olhou diretamente para mim, como se pedisse desculpas por algo.

— Só para constar, a ideia de demolir este lugar não foi minha e para ser sincero, eu jamais teria uma ideia dessas.

O Destino EscreveuOnde histórias criam vida. Descubra agora