Se o sapato couber

Capítulo 5

     Lucy vai ir embora logo. Segundo ela, como uma pessoa trabalhadora e dona da própria empresa, ela meio que precisa trabalhar. Liam e eu ficamos mais um pouco no Tristan's, terminando as batatas fritas. Conversamos um pouco, sobre amenidades, quando Liam me pergunta:
     "Você vai com qual vestido?"
     A pergunta me pega de surpresa. Eu nem tinha pensado nisso ainda. Vivian, Natalie e Elena já estavam procurando um vestido há meses, mas eu não estava nem um pouco preocupada com isso. Pelo menos não até Liam me lembrar que eu não tinha nada.
     "Então...", comecei, fazendo meu amigo parar imediatamente em me encarar.
     "Não me diga que você não pensou nisso.", ele diz, mas eu responso com apenas um sorriso amarelo, fazendo com que ele jogue os braços para cima "Eu não acredito!"
     Sempre há um grande preconceito com homens que gostam de moda. Normalmente, eles são automaticamente ligados com homossexualismo, o que não precisa ser verdade. Bom gosto e orientação sexual são coisas completamente diferentes. Do mesmo modo, todas as pessoas julgam que os gays são todos daquela maneira, digamos, afetada, que agem como "mulheres". Também é mentira. Orientação sexual e identidade de gênero também são coisas diferentes. Mas pessoas como Liam são o padrão dos esteriótipos: bem arrumado, limpo, animado, que adora ir no shopping fazer compras. A próxima frase dele é tão previsível quando um céu cheio de nuvens escuras.
     "Precisamos ir às compras, Ella!", ele quase grita, fazendo algumas pessoas olharem para nós "Hoje! Você vai ao baile promovido pela família real e mal tem roupa! Você tem tanta sorte de ser minha amiga!". Rapidamente, ele chama a moça que nos atendia, pede para dividir a conta e paga sua parte. Pago a minha logo depois.
     Liam praticamente me arrasta para seu carro, que seu pai comprou faz alguns meses, quando ele fez 17 e tirou a carteira de motorista. Aviso ele da minha bicicleta, mas ele apenas me obriga a entrar no carro, no banco da frente. Ele vai até o bicicletário e retira minha bicicleta, colocando na parte de trás do carro, apoiada no banco traseiro.
     Em alguns minutos, chegamos no centro comercial de Ambrose. Há várias lojas, de todo tipo de coisa. Mas, confesso, o que mais há ali são lojas de roupas e cafés. É parecido com Bervely Hills, apesar de que a cidade americana é muito maior e mais badalada. Entretanto, foi a inspiração.
     Liam e eu entramos em várias, procuramos vestidos, a maioria em tons pastéis. Ele anota todos que vesti e dá um nota, de uma a cinco estrelas. Vamos em várias lojas. Lola, Sherri Hill, Liz Martinez, etc. Para uma pessoa que não tem as compras como poço da felicidade, eu me divirto bastante. Perco a conta de quantos vestidos eu coloco no corpo, a maioria Liam desaprovando. Ele faz comentários como "você está indo numa Igreja ou num baile?", "abra mais o decote", "que coisa é essa que você escolheu?", entre tantas outras frases sarcásticas e críticas. Mas devo dizer que rio bastante.
     De repente, saio do provador com um vestido rosa-claro, com a cintura marcada por uma espécie de cinto com pedrinhas. O busto é tomara que caia, mas o vestido é fechado por um tecido transparente com pedrinhas. A saia é solta e leve. Eu gosto dele, e Liam aprova. Além disso, não é tão caro, o que será uma coisa boa.

     Eu e Liam concordamos que não precisa de colar, mas compro uma pulseira de pedrinhas, com um anel combinando. Os brincos que arranjo são pequenas pedras e combinam bem. As sandálias que compro são delicadas, do mesmo rosa do vestido. Fica tudo muito bonito. Liam concorda, me olhando com orgulho. Por mais que sejam roupas de festa, não são tão caras, e uso o cartão do meu pai, que ele deixou para mim quando morreu.
     "Agora só falta a roupa da apresentação", Liam me lembra, caminhando pela rua. Eu checo a conta, fazendo os cálculos, para ver se está tudo correto, quando meu melhor amigo me agarra pelo braço, me parando.
Eu olho para ele, confusa, mas ele está observando fascinado um letreiro bem acima de nós. A loja à nossa frente se chama Delicate.
     "Ella do Céu", ele diz, me apertando "Você sabe que loja é essa?", pergunta. Eu balanço a cabeça. Só sabia que o nome parecia um título de livro de romance. "Essa é a loja de vestidos mais renomada do mundo. Só tem coisas lindas aqui."
     "É...?", é minha resposta.
     "Sim", ele se vira e finalmente me olha "Precisamos entrar"
     Ele começa a me arrastar para dentro da loja, mas eu o paro. "Liam, não posso comprar nada aqui", digo. "Deve ser incrível, mas simplesmente não posso. Desculpa"
     "Por favor, Ella!", ele pede "Vai ser incrível! Além disso, só aí vai ter um vestido para sua apresentação." Continuo em dúvida, mas Liam insiste tanto que eu entro na loja.
     Uma mulher bem maquiada vem nos atender. Liam se senta numa dos puffs grandes e luxuosos, com a revista da loja nas mãos. A moça que nos atendeu me mostra alguns modelos, todos muito bonitos e bem-feitos, mas nada me toca especialmente. Há vestidos de todas as cores, com bordados e peles transparentes, cada um com um decote diferente, e detalhes lindos e delicados Estou prestes a desistir quando Liam dá um gritinho de emoção. Viro para trás e vejo ele segurando a revista com força. Ele levanta o mostruário e expõe uma foto de um vestido.
     "É esse", diz "É esse que você tem que usar".

     Com uma saia de tule brilhante e enorme, o vestido é tudo o que uma menina poderia sonhar para um casamento incrível. O busto é liso, de um tecido mais duro, coberto de cristais cintilantes. Há um cinto azul-bebê, com laço extravagante com pedrinhas, se destacando no vestido todo branco. É lindo. A modelo ainda usa muitas joias, coisa que eu não acho necessária, pois o vestido já é muito chamativo.
     Mas meu olhar voa para o preço, fazendo meus olhos saltarem. É muito caro. Talvez o mais caro da loja. Dou um sorriso e caminho até Liam, puxando-o para longe da vendedora, que entende e se afasta.
     "Liam, esse vestido é extremamente caro", falo eu, com a voz em um tom baixo "Eu concordo que é lindo, mas não posso pagar por algo assim. Não posso. Desculpa"
     Mas Liam me pega pelos braços e me encara "Ella, você pode. Você sempre pôde. Você é a Condessa de Vanfield, um dos condados mais ricos do nosso pequeno país, dona de uma cadeira no parlamento é uma fortuna enorme, pronta para cair em suas mãos em alguns meses, quando fizer dezoito", carinhoso, ele pega meu rosto nas mãos, me obrigando a olhar para ele "Você é a pessoa que mais pode no mundo. Vivian, que tem apenas uma parte pequena da herança, está sempre gastando", ele sorri "Você não somente pode, como merece"
     Eu o abraço. Não consigo me conter. "Obrigado, Liam", sussurro. Ele envolve os braços no meu corpo "É sempre um prazer"
     Quando digo a vendedora que quero esse vestido, ela quase pula de alegria. Imagino que vender algo tão caro não seja rotina. Ela corre até o estoque, pegando um tamanho P para mim. Ele serve perfeitamente. Liam me elogia, assim como a vendedora. Eu também adoro o jeito como ele simplesmente se molda ao meu corpo. A moça que nos atende se apressa para trazer um sapato azul-claro da cor do cinto, de couro, o salto de12 centímetros, a parte da frente fechada. Há uma borboleta de cristais na ponta. Fica perfeito. Liam nem me consulta: já solta um "vamos levar". A mulher ainda consegue nos vender uma pulseira de brilhantes que vira anel e brincos pequenos combinando, além de um anel com uma pedra azul-bebê. Liam diz que vou arrasar. E eu concordo. Está tudo muito lindo para eu não ficar bonita. Além disso, meu melhor amigo se prontifica a me maquiar e a fazer meu cabelo, e ele é incrível nessas artes.
     Ia ser perfeito.
     Só faltava uma coisa.
     "Liam", chamei, enquanto pagava as roupas com o cartão "está faltando as máscaras"
     A moça do balcão nos ouviu e levantou os olhos. Ela deu um sorrisinho para nós. "Vão no baile de máscaras oferecido pela família real?" perguntou "É para isso que está comprado o vestido? Pensei que estivessem noivos ou algo assim."
     "Ah, não!" ri da ideia "Somos amigos. Nós dois temos o mesmo tipo"
     Ela entendeu e disse "Ah". Depois de um segundo de silêncio, ela nos olhos de novo "No fim da rua, tem uma loja de produtos... para serem usados na cama, se é que vocês me entendem", ele dá um sorriso malicioso "Mas, entre as algemas e... enfim", ela se corrige quando olhamos para ela quase rindo "tem máscaras. É uma mais bonita que a outra. Vale a pena vocês irem lá"
     Eu e Liam concordamos. Depois de pagar, caminhamos até o final da rua. Por fora, a loja não é muito chamativa, e passamos por ela uma vez antes de vê-la. Por dentro, porém, é a coisa mais louca da vida. Cheia de "brinquedinhos", uns que eu nem sabia que existia, enfeitavam as paredes, junto com lingeries, confesso, muito bonitas. Há também algumas roupas temáticas, que fazem-nos rir.
     Uma moça nos atende, que não deve ser mais velha que eu. Pedimos para ver algumas máscaras, e ela nos mostra. Para o vestido rosado, escolho uma máscara prateada, simples, de amarrar. Para a da apresentação, consigo achar uma perfeita: com forma de borboleta, é azul clara, também de amarrar. É lisa, mas Liam diz que poderia encontrar uns brilhantes para colar na máscara. Eu concordo. Meu amigo também compra uma, branca, no estilo de Fantasma da Ópera. Admito que não ficou ruim nele. Pagamos todas (que não deu mais de 25 libras esterlinas) e saímos da loja.
     No carro, Liam diz que foi uma tarde revigorante. Eu rio do adjetivo que ele usa, mas ele só balança os cabelos, se achando o máximo. Ligando o som na nossa radio favorita, ele acelera o veículo até a Mansão Hawkwood. Pego o vestido rosa-claro e os acessórios que o acompanham. Liam diz que vai se encarregar de dar a roupa da apresentação para Lucy. Aceno com a avença e me despeço.
     Quando entro em casa, ouço os gritos das Gralhas vindo do último andar. Para evitar que vejam meu vestido, vou até a cozinha e peço a Bernadete que o guarda até o dia do baile, escrevendo um bilhete. Ela concorda, feliz. Assim, subo até meu quarto, sonhando com a noite que fica apenas a duas semanas do dia de hoje.
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