Acordando no hospital (parte 22)

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(...) Parecia que eu estava entrando em um túnel imenso, escuro. Ali eu permaneceria por um bom tempo, isso era certo. O último som que me recordava, e que me preocupou, foi um choro, forte, intenso. Tentei ficar concentrado pra saber de quem era, mas não deu. Apaguei!

Foram 6 longos dias, dezenas de exames e muitas orações, segundo as pessoas próximas.  Eu não tinha noção do que estava acontecendo, era como um sono profundo, repleto de vozes, vindo de um túnel que sempre se fazia presente nos sonhos.

No sétimo dia, aproximadamente 02h30 da madrugada, abri os olhos, ainda com uma dor de cabeça absurda. Senti alguém deitado sobre minha mão direita, olhei pro lado e fiquei surpreso, era Camila, sentada com a cabeça amparada na minha cama, segurando um terço em uma das mãos, e a outra mão segurando a minha. No canto do quarto, minha mãe sentada, com os olhos bem abertos, feito 2 jaboticabas maduras. Quando me viu mexendo, ela saltou da cadeira e gritou.

__ Ele acordou! Abriu os olhos. Esbravejou minha mãe.

Camila acordou assustada, sem entender muito bem o que estava acontecendo, mas foi afastada pela equipe médica, que chegou rapidamente, colocando um monte de luzes nos meus olhos, me virando e revirando na cama. Em poucos minutos, me fizeram 390 perguntas, que eu respondi calmamente e ainda com dificuldades, visto que minha boca estava cortada e ainda, com pontos.

Enquanto me examinavam e debatiam meu quadro clínico, tentava entender porque Camila estaria ali. Eu ainda não sabia há quantos dias estava ali, deitado, e a memória ainda falhava quando tentava me recordar dos motivos pelo qual estaria ali, apesar de lembrar das pancadas e dos rostos daqueles que me agrediram. Por que a Camila?! O que havia acontecido com a Juh? Cadê a Fer?

Apesar de confuso, fiquei feliz em ver ela ali, e pelo visto, ela estava muito feliz em me ver ali também, acordado, olhando pra ela. O olhar dela, falava que ela ficou ali por um bom tempo, acordada. As olheiras imensas também entregavam que ela chorou muito. Aquilo me perturbava, pois Camila sempre foi desapegada de tudo, e quando namoravamos, tampouco fazia questão de saber como eu estava.

Ainda me lembro de uma certa vez, que fiz uma pequena cirurgia eu precisei ficar 2 dias em observação no hospital, e naquela época, mesmo namorando, ela sequer apareceu por lá. Ela sempre justificou que odiava hospital e eu estava bem, por isso não precisaria dela. Eu ainda não sabia a gravidade das coisas, então permaneci ali, olhando profundamente pra ela, enquanto era examinado. Minha mãe já saiu pra fora pra informar o resto do mudo que eu havia acordado, então, era de se esperar que em pouco tempo apareceria até aqueles parentes de 15 anos atrás, pra me ver.

Os médicos concluíram os exames, eu estava bem! Me deixaram ali, sob observação, e saíram, ficando somente eu eu Camila no quarto. Ela se aproximou, e sem falar absolutamente nada, me abraçou, encostou a cabeça no meu peito e permaneceu. Era possível ouvir e sentir o choro. Fiquei sem entender, quando sua cabeça levantou suavemente e ela me disse:

__ Você assustou todo mundo. Não faça mais isso. Disse Camila.

__ Não me lembro muito bem... Respondi baixinho, com a voz trêmula.

__ Eu achei que ia te perder! Sussurrou Camila próximo ao meu ouvido, acariciando meus cabelos.

__ Vaso ruim não quebra fácil Camila. Disse, rindo.

__ Bobo! Eu te amo. Respondeu Camila, encostando novamente a cabeça sobre meu peito.

Aquele "Eu te amo" travou meu cérebro. Que diabos estava acontecendo ali?! Camila, a mulher seca, desapegada, que sequer falava "eu te adoro", agora estava me amando?! Ela se aproximou novamente, e começou a falar:

__ Sabe, eu nunca imaginei você longe. Confesso que eu sempre esperava você, mesmo após as cagadas que eu fazia, porque eu sabia que você voltaria. Você sempre esteve ali, e eu, de certa forma, acostumei com isso. Quando a pessoa se dedica tanto a nós, parece que uma cortina impede que enxergamos isso. Você sempre foi a melhor pessoa pra mim, e eu nunca dei valor nisso. Eu te tratei mal, menti, fui baixa, mesmo sabendo que você gostava tanto de mim. Eu errei, errei muito! Mas desde o momento que te vi com a Juh naquela balada, me deu um nó na garganta. Depois você cuidou de mim após o acidente como ninguém nunca fez, e eu nem merecia tanto. Agora, por último, eu fui capaz de perceber o tamanho do espaço que você ocupava na minha vida.

Ela fez um breve silêncio, entre algumas lágrimas e continuou (...)

__ Eu sei que eu não mereço você, também sei que você deu outro rumo na sua vida, mas eu precisava te falar isso. Eu só descobri o quanto te amava, quando te vi entrando nesse hospital, todo machucado, e ouvi de algum dos médicos que talvez você não sairia dessa vivo. Eu chorei, te chamei, mas eles entraram na sala. Dizem que as pessoas só aprendem a dar valor quando estão próximas de perder, e eu precisei disso pra enxergar o homem que eu sempre tive ao lado eu não soube valorizar. Eu te amo.

Novo silêncio, não só no ambiente, como na minha cabeça, e na minha alma. Ouvir aquilo, daquela que já foi a minha melhor metade, por muito tempo, me fez um bem danado. Ao mesmo tempo que me assustou, parece que serviu de consolo pra algo que eu nunca consegui explicar. Eu me adaptei a miudeza dos sentimentos da Camila por muito tempo, porque eu gostava dela, e nunca havia recebido nada em troca. Ela se fez especial novamente. Mas eu estava cheio de dúvidas, e não tinha outra pessoa pra quem perguntar, então aguardei uns minutos e soltei:

__ Camila, o que aconteceu?! Cadê todo mundo? A Fer veio? A Juh? Cadê minha mãe? Como você ficou sabendo?! Questionei ela.

Minha cabeça estava a mil, mas eu precisava saber sobre essas pessoas, uma vez que minha família, sem sombra de dúvidas, pertenceu ali também, por todo o tempo. Mas Camila me surpreendeu nas respostas.

__ Juh não apareceu por aqui, nenhum dia. Mandei mensagens e ela não respondeu. Apenas a mãe dela veio, conversou com a sua e depois não mais voltou. Confesso que também não entendi. Disse Camila.

__ Fernanda veio todos os dias, discutiu comigo como sempre. Ela não gosta de mim, e você sabe disso. Continuou Camila, em tom irônico, se referindo a Fer.

Enquanto ela falava dos outros que foram me ver, eu travei na informação da Juh. O que de fato teria acontecido?! Óbvio que ninguém ali, pelo visto, sabia que eu havia sido agredido pelo ex dela. Pelo que entendi, eles achavam que eu havia sido roubado, e preferi que continuassem achando isso por enquanto, mas eu precisava falar com a Juh. Também dei uma risada diabólica quando Camila contou da Fer, porque eu conseguia imaginar ela dando os pitis dela.

(...)

Se apega, sim!Where stories live. Discover now