O Segredo.

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A comida nunca foi tão boa naquele dia. Seu estômago estava completamente vazio, não tinha comido mais nada além de uma banana e alguns biscoitos guardados em um pote redondo.

Ela nunca mais queria ir para a escola, mas aí lembrou da sua mãe. Ela ainda tinha algumas lembranças dela. Estér Palacine Nevado, aquele nome belo soava com tanta dor.
Era uma mulher tão forte, segura e bonita, aqueles cabelos negros presos por uma trança; aquelas mãos suaves e brancas; aquele sorriso de mãe confortadora; e ficou tão pouco tempo em sua vida. Morrera quando a pequena Preciosa tinha apenas oito anos, rodeada por lençóis brancos e uma doença incurável onde, nem a riqueza do mundo inteiro, poderia pagar a sua saúde.

Algumas lágrimas querem cair mas a jovem se mantém forte e enquanto ela se levanta da mesa de jantar Regina chega com seus passos apressados e com uma expressão rude de sempre, dá um recado mandado por seu pai.

- Preciosa, seu pai irá chegar um pouco mais tarde hoje, então vá logo para seus aposentos e durma cedo pois como a senhorita sabe, amanhã haverá aula.

- Sim senhora.

Naquela noite não teria música, conversa ou leitura, apenas uma pequena caminhada até seus aposentos onde iria ficar até o amanhecer.

A não ser, que o destino formasse algumas trilhas diferentes ao caminho seguido para surgir algumas poucas alegrias. Regina levava Preciosa apenas até a porta do seu quarto onde era trancada pela preceptora todas as noites. O cômodo era grande e tinha de tudo, menos sua felicidade.

A moça não conseguiria sobreviver todos os dias trancada em seu quarto, a menos que existisse uma saída para que possa ao menos respirar. A porta era trancada e mesmo que a chave fosse acessível seria Impossível sair sem ser vista pelos empregados. A varanda também não era boa ideia, seu quarto ficava no quinto andar, sua descida seria perigosa e havia um guarda noturno no Jardim logo abaixo.

O que ninguém sabia era de uma saída de emergência subterrânea que sua mãe havia revelado, onde a entrada era atrás de uma estante levando a um túnel que dava a uma caverna no meio da floresta. Poderia ser arriscado mas era sua única opção.

Tudo era muito bem planejado: as caçadas noturnas feitas pelo seu pai eram feitas apenas em noites de lua e ela só saía quando tinha certeza que ele estava fora. Usava roupas escuras, levava comida e chegava o mais cedo possível para não ser descoberta.

Naquela noite deveria sair e faria o possível para recarregar suas energias para enfrentar mais um dia de aula. Calçou as botas, colocou sua capa e empurrou a estante. Já não era tão escuro como a primeira vez, havia várias velas acesas na entrada e uma tocha pronta para ser acesa. Demorou muito tempo mas agora tudo estava ficando mais fácil.

Como ficava muito tempo sozinha deixou seus livros de lado e se dedicou em criar maneiras cada vez mais confortáveis para suas fugas. Já havia arrumado muitas coisas úteis e uns objetos antigos do sótão serviram muito bem.

Enquanto caminhava por entre as passagens lembranças vinham em sua cabeça...

-Querida vai ficar tudo bem. Você não estará sozinha.

-Mas você vai me deixar!

-Nunca te deixarei minha filha, você estará sempre comigo. Fique com isso, lembrará de mim. E faça o que é certo. Sempre...

Essa lembrança nunca saía da sua mente. Foi o dia da morte de sua mãe. Ela ainda lembra de todos os detalhes: seus olhos vermelhos pelo choro, suas mãos trêmulas e suadas segurando com toda força uma chave enrolada por um lenço com um pedaço de papel. Seria a última lembrança de sua mãe e agora aquela pequena chave era o pingente de seu colar para jamais ser retirado de seu pescoço.

O túnel estava ficando menos escuro, sinal que já estava chegando no fim, ela apaga a tocha e a coloca apoiada na parede. A sua frente muitas plantas, trepadeiras e sipós, ela as afasta com as mãos e enfim respira.

A Estante de Corações Partidos. (Em Revisão... Feito Em 2017 Atualizado Em 2024)Where stories live. Discover now