Capítulo 14 - A vida mais simples

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1997

O dia caminhou bem mais leve. Consegui comer um pouco na hora do almoço, nada que eu realmente achasse fazer diferença, no entanto o suficiente para fazer papai sorrir, mesmo tendo que levar a comida até minha boca.

Eu tentei comer sozinha, mas passei um bom tempo em frente ao prato apenas revirando o cozido. Papai puxou sua cadeira para perto da minha assumindo o talher e eu consegui comer algumas colheradas.

Depois do almoço voltei para o quarto e dessa vez foi Tonks quem não quis me deixar sozinha enquanto papai e Andrômeda lavavam e guardavam a louça.

Ela tentava brincar com meu cabelo como tinha costume de fazer, mas as madeixas estavam muito grudadas umas nas outras. Virei na cama e olhei para ela. Senti vontade de rir, contudo não consegui.

- Eu podia lavar seus cabelos! Você quer? - Tonks ofereceu.

A verdade era que eu estava precisando de um banho completo. Concordei com um aceno de cabeça.

- Então vem - ela segurou minha mão e me ajudou a ficar de pé. Andamos devagar até o banheiro.

Tonks fechou a porta e me ajudou a tirar a roupa antes de eu sentar na banheira que ela já enchera de água morna e espuma. Senti minhas costas arderem no momento em que o líquido tocou os ferimentos.

- Quer que eu esvazie um pouco?

- Não - respondi com um gemido acompanhado de uma careta. Eu sabia que a água e o sabão ajudariam a limpá-los e era exatamente isso que estavam precisando.

Tonks me entregou uma barra de sabão e pegou o xampu. Enquanto eu me ensaboava ela massageava meu couro cabeludo. Uma fragrância agradável tomou conta do banheiro.

- Olha isso - ela apontou a varinha para a superfície da água e muitas bolhas se projetaram para fora. Achei aquilo lindo e acabei com um sorriso no rosto sem perceber. Foi meu reflexo em uma das bolhas que revelou minha expressão.

Quando Dora esfregou minhas costas da maneira mais suave que conseguiu, tive que me controlar para não gritar.

Segurei as bordas da banheira de louça com tanta força que os nós dos meus dedos ficaram brancos. Sabia que a maior culpada do ferimento ter chegado àquele ponto era eu, mas isso não diminuía a dor. Talvez até aumentasse por saber que poderia ter sido evitado.

- Prefiro colocar as bandagens de volta com você no quarto - disse ela depois de jogar do último balde de água limpa sobre meu corpo terminando de tirar todo o sabão.

Fiquei em pé e a deixei me enrolar em uma toalha. Depois de seca, coloquei quase toda a roupa, deixando apenas a blusa para depois que os curativos estivessem no lugar.

Com a toalha sobre o tronco nu saí do banheiro e voltei para o quarto. Papai estava lá terminando de trocar minha roupa de cama. Arrisquei um sorriso pequeno que ele retribuiu de maneira generosa.

- Precisa de ajuda? - ele perguntou para Tonks. - Posso chamar sua mãe - completou quando involuntariamente apertei a toalha em volta do corpo, envergonhada com a possibilidade de ficar sem roupa na frente dele.

- Tudo bem, eu consigo dar conta - ela respondeu.

Papai tocou os lábios de Tonks com os dele antes de sair e fechar a porta para nos dar privacidade.

Eu estava enganada em pensar que o machucado havia doído com a água morna. Seja lá o que Tonks passava era muito mais doloroso.

Permaneci deitada de bruços enquanto as minhas companheiras úmidas escorriam pelo meu rosto.

Foi tão agonizante que o tempo parecia não querer passar e precisei ser muito forte para não gritar.

- Pode respirar Lana. Já acabei - disse Tonks depois de prender o último esparadrapo nas minhas costas.

Levantei e deixei que ela me ajudasse a vestir a blusa.

- Doeu bastante não é?

Concordei acenando com a cabeça.

- Posso entrar? - ouvimos a pergunta depois de duas batidas na porta.

- Claro que sim Remus, nós já terminamos.

- Hum, que cheiro bom - comentou papai quando entrou no quarto. - Obrigado Dora.

- Não precisa agradecer. Tenho Lana como minha filha também - ela sentou do meu lado e me puxou para um abraço.

Papai ficou sem saber se abraçava a mim ou a esposa. Tonks acabou com a dúvida dele esticando o braço e o fazendo sentar ao lado dela. Papai então abraçou as duas. Três na verdade.

Eu não conseguia mais ficar perto da Dora sem pensar no meu irmão ou irmã que crescia em seu ventre. Ainda mais agora que sua barriga estava começando a ficar saliente.

Sem nem me lembrar de pedir permissão, minha mão escorregou até lá. Era muito estranho pensar que havia uma pessoa ali dentro, mesmo que muito pequena.

- Você vai ver quando começar a se mexer - papai parecia estar lendo meus pensamentos.

Fiquei um pouco envergonhada quando notei os dois olhando o que eu estava fazendo e recolhi a mão.

- Tudo bem Lana - Tonks pegou minha mão e colocou de volta sobre sua barriga.

Olhei para ela e depois para papai. Os dois sorriam para mim. Senti-me um pouco mal por não conseguir retribuir o gesto e a lágrimas começaram a descer pelo meu rosto.

- Vem cá - papai me puxou para o colo dele. Sem dizer mais nada, ele me abraçou e acalentou como já fizeram tantas vezes. As lágrimas se tornaram choro que logo foi acompanhando por soluços.

Meu medo era que eu ficasse daquele jeito para o resto da vida. Seria um tormento não só para mim, mas para as pessoas que me amavam e queriam me ver bem.

De repente uma bolinha luminosa passou na frente da minha visão embaçada. Esfreguei os olhos e percebi que o quarto estava cheio delas. Era a coisa mais linda que eu já tinha visto. Todas aquelas luzes coloridas dançando como se fossem pequenas estrelas passeando pelo céu.

Quando olhei para o lado vi Tonks com a varinha empunhada controlando a dança. Lágrimas ainda escorregavam pelo meu rosto, mas o deslumbre com a magia fez os soluços pararem.

Dessa vez consegui sorrir quando ela sorriu pra mim. Amei o jeito com que Tonks estava me distraindo. Já era a segunda vez e novamente estava dando certo.

Tentei pegar uma das luzinhas, mas ela fugiu. Fiquei de pé para tentar pegar as outras, mas Tonks as fazia correr ainda mais rápido passando bem perto de mim e se lançando para o alto.

Passei então a tentar acompanha-las na dança. Lembrei meus tempos como bailarina na infância e senti saudade da forma que as coisas eram bem mais simples e menos dolorosas naquela época.

***
Ter a Tonks na vida é uma bênção. Nunca conheci pessoa mais iluminada do que ela. Sempre consegue dar um jeito pra deixar tudo mais leve. O mundo precisa de mais pessoas assim, não acham? Comentem! E não se esqueçam de votar no capítulo.

Livro 5 - O Último InimigoWhere stories live. Discover now