O Corvo Pt2

24 3 6
                                    


                     Não me orgulho das coisas que fiz neste dia terrível... a dor de sentir meus ossos findando ainda é tão real... o sentimento de ver a perda da inocência enquanto eu lutava sem dar a miníma importância ainda toma meu corpo, tinha parado de escrever. Não aguentei quando lembrei daquela cena, cai em lágrimas, pude me ver nos olhos daquela criança, ele sentia tanta dor quanto eu e me fazia lembrar da perda de minha própria infância. Que foi arrancada de mim por pessoas terríveis... enfim eu cai em lágrimas e dormi por mais meia hora antes de voltar a escrever. Vou retomar meu raciocínio. 

                    Arranquei a espada do peito do garoto e o deitei suavemente no chão enquanto eu guardei a nova e pesada espada na bainha em minhas costas. A dor da batalha era terrível e se misturava a dor da febre, eu tossi sangue por dois segundos e andei até a menina que estava violada no chão, ainda estava viva...porém horrorizada com o que havia visto. Arranquei a capa puída dos meus ombros e joguei por cima do corpo nu da mesma.

-Me...me perdoe por isso..- Eu estava realmente triste ao ver aquela cena, a garota abismada com tudo aquilo começou a chorar e se agarrou ao meu pescoço com um abraço apertado, eu podia ouvir o choro baixinho dela e então a agarrei e a levantei. Para enfim sair dali.

                    Eu a segurava no colo, contra meu peito e então saia andando dali. Na verdade estava preocupado com volta dos sujeitos que haviam fugido, porém, estava cansado demais para me importar e por sorte não os encontrei. Agora sei que vai haver uma vingança, meu rosto estava a mostra e esses últimos com certeza se lembrarão dele. Eu segui pelo mesmo caminho, minha visão estava embaçando dentro da caverna, a umidade no ar pesado me fazia quase desmaiar e com sutileza carregava a menina que sofreu. Ao sair, me deparei com uma tremenda cena horrível. No que antes era um pequeno espaço aberto por entre os bosques, agora estava enfestado de corvos. Enormes massas deles, eles estavam voando de um lado a outro e mal dava pra enxergar,porém, no centro do amontoado eu vi... um espantalho, um ser horrível de madeira. Só que parecia vivo... não tem como explicar, só me parecia vivo. Portando uma foice o espantalho, com o corpo forrado por feno, andava de um lado a outro. Os corpos de meus antigos inimigos que haviam fugido estavam no chão e sem olhos, com um movimento rápido e um giro da foice do espantalho, os corpos sem vida e sem olhos se levantaram e começaram a caminhar em nossa direção. 

         Segurei firme a menina e parti correndo o máximo que pude em direção a Dawenwood, minhas pernas doíam e me impediam de pensar estrategicamente. Os cadáveres sem olhos começaram a se enfurecer e vieram correndo em nossa direção, com uma velocidade sobre-humana e ferocidade animalesca. Por trás de cada um deles eu pude escutar uma risada assombrosa, algo que realmente me fez tremer e eu só pensava naquilo como sendo meu mísero fim. Porém eu corri até não aguentar mais e assim as criaturas me alcançaram, coloquei a menina no chão e fiquei espantado com os corpos sem olhos nos cercando, puxei minha espada mesmo sabendo que esse era meu fim e pra minha surpresa, eles não haviam me atacado ainda. 

                     Pude apenas escutar um estranho ranger, passos apressados e o som destes passos era como o de madeira martelando o chão, os cadáveres abriram espaço para que o estranho espantalho surgisse, um ser realmente estranho, um amontoado de gravetos e fenos. Roupas rasgadas, um sorriso feito de forma doentia em seu rosto, uma luz avermelhada e forte que saia de seus olhos e boca me faziam perder a visão por um momento. Ele jogou a foice por cima do ombro e apoio enquanto seus olhos me fitavam com perversidade e seu sorriso doentio ficava mais largo. Um corvo pousou na ponta da foice e assim o espantalho sussurrou algo para este um e então saiu voando.

Espantalho- Você é bem mais que um simples maculado, não é?-A voz parecia um grito arranhando a garganta enquanto ele continuava a sorrir, o gramado a sua volta aos poucos morria e as madeiras das árvores no arredores da subida apodreciam, a terra ficou úmida e eu não pude falar.-O mestre vai gostar de saber que existe alguém como você...Dez oponentes hahahahieahi! Isso é bem mais que um humano comum pode dar conta! Espero que não me entenda mal, mas eu não posso simplesmente deixa-lo ir...-Ergueu a foice e eu preparei a espada, minhas mãos estavam dormentes e eu não conseguiria receber o golpe daquela arma, foi quando anoiteceu realmente e junto com o sol, a foice desceu contra o meu peito. Uma luz, tranquilizante tomou conta do local, me segando por um instante, achei ter visto um anjo e quando minha visão retornou já não haviam mais mortos vivos... Gwenhwyvar estava parada em minha frente, olhando-me com um sorriso no rosto, acho que havia percebido a garoa atrás de mim, da qual salvei das mãos dos bandoleiros.

  Gwenhwyvar - Está tudo bem agora Vougan. Mas eu não vou poder te salvar de novo.- Foi nesse momento em que eu desmaiei. 

                  Quando finalmente acordei, estava faminto e no meu quarto, Adair estava do lado da minha cama com um prato de comida que me entregará. Eu vi meu corpo completamente cheio de bandagens e ataduras, mas não sentia nenhuma dor, por isso peguei a comida e comecei a devora-la.

Adair-Você tem sorte. E força. Daqui para frente será mais complicado garoto, conversei com a dama da lua... aquela coisa que viu na floresta ainda está viva.- Ele me olhou sério e parecia analisar algo e então voltou a falar, era estranho como aquele idoso conseguia ser tão gentil para com as pessoas.-  Gwenhwyvar gostou mesmo de você, ela é uma boa moça e os aldeões estão impressionados com seu ato de coragem, mesmo assim abismados com o que a garota relatou. Achamos ser fruto da imaginação dela, lutou mesmo contra dez oponentes?- Com a boca cheia eu não disse nada, apenas balancei minha cabeça confirmando o que havia dito e então pude ver um sorriso no rosto do velho homem. Ele enfim me deixou sozinho e eu pude ir comer, vi pela janela uma ave de rapina voando em direção ao sul, era uma coruja e por isso achei ser um sinal de boa sorte.  Por isso me levantei e fui para o salão principal, Adair nem ninguém estava na taberna e foi ai que eu sai. 

                      As ruas da pequena vila não estavam pacatas, homens bem armados e portando armaduras pesadas e polidas estavam cercando os aldeões e os cobrando impostos, muitos choravam, pois nesses tempos ninguém possui dinheiro para tais coisas e eu vi Adair, com um sombreiro sobre a cabeça enquanto repousava encostado na parede de sua taberna. Os homens andaram até ele então acordando-o.

Soldado- Velho, hora de pagar tributos ao lorde e ande logo. Vamos por abaixo esta sua taberna que não paga nada a meses.-Adair sorriu para os quatro u cinco soldados que estavam ali tirou o chapéu  e o apoiou sobre a barriga.

Adair-Não irei pagar.- Todos pararam para ver a cena, até mesmo o vento se calou naquele momento e eu fiquei boquiaberto, Adair com certeza iria apanhar para aqueles homens e eu não poderia fazer nada, apenas me perguntar o que estava passando na sua cabeça.-Vocês atrapalharam meu cochilo, é melhor irem embora.- Os homens enfurecidos levantaram a mão para o taberneiro e então Adair se pôs numa postura mais imponente e menos relaxada, eu pude ver o que pretendia atacar quase paralisar. Olhei para Adair novamente, ele não parecia falar nada. Apenas encarava os sujeitos, eu nunca havia visto aquilo, aquelas figuras de soldados se desfizeram e só faltaram horar, eles saíram correndo e, eu... estava mais que abismado, Adair o taberneiro quase idoso, espantou cinco soldados muito bem armados apenas com um olhar. 

               Aos poucos veio andando até mim e me disse claramente: "vê o que essas pessoas passam, você é mais que uma esperança para esse lugar." Então entrou no bar e eu o segui rapidamente. 

-O quê está havendo aqui e como fez aquilo?-Perguntei espantado, ele olhou para mim e respondeu rispidamente. 

Adair- Vivemos em feudo podre, soldados corruptos e muito mais... Estamos quebrados. Todos estamos e o lorde Lavein abusa de se poder, após conversar com  Gwenhwyvar e ver seu talento eu decidi. Vou treina-lo, você aceita lutar por estas pessoas? Mesmo que tenha sido odiado a vida inteira.-Eu vi um lado daquele homem que não havia visto ainda, agora já não me parecia tão velho e eu apenas concordei.

              Agora estou no meu quarto e é noite, fui avisado que seriam quatorze dias de treino a partir de amanhã e, que me focaria nas estratégias, não enfrentarei simples bandoleiros e sim soldados... Além disso... Aquele espantalho parece ser uma grande ameaça. Vou parar de escrever por aqui e guardar energias para amanhã.

Sangue e FerrugemWhere stories live. Discover now