Vinte e Quatro

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Caleb ligou para Henry dezenas de vezes na manhã do dia seguinte, quase como se quisesse dar à ele a chance de evitar aquela intrusão – não só pelo irmão, sabia disso. Estava, ele próprio, receoso. Não, não era bem receoso a palavra. Ele estava mesmo era apavorado. Não sabia o que ia encontrar, e menos ainda se queria encontrar algo. Estava confortável com a ideia de nunca saber sobre a saúde mental de seu irmão, e os motivos que o levaram a mergulhar num mar de psicotrópicos.

Mal dormiu aquela noite, mas não tinha sono quando despertou. Cansado, talvez, mas um tipo de cansaço que não resolveria com uma noite de sono. Era um cansaço que vinha trazendo pela vida. Um peso que nunca deixava seus ombros, e só parecia dar alguma folga quando Caleb desenhava, ou tatuava. Pensou tê-lo sentido ceder um pouquinho também aquela noite em que vira Olivia pela última vez, enquanto caminhavam em silêncio, se esbarrando aqui e ali a caminho da casa dela. Tão bonita que ele nunca conseguiu desenhá-la. Sua arte não parecia alcança-la. Talvez ela fosse arte, por si própria.

- Bom dia. – Lars saudou logo que Caleb saltou para dentro do carro.

- Hey, bom dia... – E não sentiu-se desconfortável, embora tudo sobre aquela situação fosse estranho – Desculpa o inconveniente...

- Que isso... – Lars tirou a mão do volante para abaná-la no ar, como quem não se importa. Aproveitou para trocar a música antes de sair da vaga onde estava estacionado – E então, Cambridge, é isso?

- Sim. – Caleb aclarou a garganta e esfregou as pernas ansiosamente, olhando o bairro familiar pela janela – Cambridge.


 Caleb esperou pelo momento em que Lars perguntaria o que havia lá. Afinal, quem aceitaria atravessar 180 quilômetros de estrada com um completo estranho sem questionar suas razões? Lars aceitaria. Ao invés disso, perguntou sobre Caleb, se era originalmente de Wolverhampton, com que trabalhava, contou um pouco sobre o próprio curso e sobre a cidade Natal.

Chegaram à Cambridge por volta das nove e meia da manhã, e em silêncio seguiram as instruções do GPS até a clínica de Dr. Brunell. Caleb disse à Lars que ele poderia esperar por ali, caso preferisse, e Lars estudou por um momento a proposta antes de recusá-la.


- Ahn, oi... Com licença... – Caleb parou no balcão da recepção. Não levava muito jeito com pessoas, e talvez por isso atraísse olhares tão cansados quanto os seus.

- Bom dia.

- Bom dia... Eu... Precisava falar com o doutor Dominic Brunell... – Falou, apoiando os antebraços na bancada de mármore.

- Qual seu nome, por favor? – O secretário perguntou.

- Caleb O'Malley. – E Caleb sabia que havia algo errado quando o rapaz abriu uma das agendas sobre sua mesa – Ah... Eu não... Não tenho horário marcado. Não agendei. – Os olhos do secretário se ergueram lentamente na direção dele.

- Sinto muito, senhor, sem horário marcado infelizmente não posso te ajudar.

- Não, eu... – Caleb respirou fundo – Não é uma consulta, eu não... É sobre meu irmão, ele faz... Tratamento... com o Dr. Brunell, e eu precisava mesmo tirar algumas dúvidas. – Mas viu nos olhos do secretário que seu discurso não estava funcionando muito antes de terminar.

- Sinto muito, senhor... – Caleb soltou todo seu ar em uma golfada, depois enfiou a cabeça nas mãos e se concentrou em um plano. Mas não havia um plano.

- Tem algum horário disponível para o doutor Brunell hoje? – Ele ouviu quando Lars perguntou, parado ao seu lado.

- Não, senhor.

Segredos InabitáveisWhere stories live. Discover now