Fevereiro III

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A primeira semana de aula foi tão exaustiva que era como se estivéssemos no meio de uma maratona de provas, sem ter tirado férias há meses, e não como se tivéssemos acabado de voltar delas.

Não houve preliminares: os professores jogaram toneladas de matéria nas nossas costas sem piedade. Não podíamos mais andar no mesmo ritmo dos outros anos do ensino médio porque, bem, era o nosso último e ele era decisivo — a ênfase diária nessas palavras me deixava com náuseas.

A parte boa, se é que posso chamar assim, era que minha estadia em casa diminuía cada vez mais. Chegava do colégio sempre à noite, cansado, não conseguia manter nem os olhos abertos durante o jantar, então a "hora de dormir" imposta pelo meu pai acabou sendo mais que bem-vinda nesse começo. Não que eu não quisesse, mas ficar acordado depois das dez da noite estava sendo uma tortura.

Para cada parte boa, porém, existiam outras dezenas ruins, como sempre.

Gustavo foi transferido de colégio — ele anunciou no grupo do time de futebol, sem qualquer cerimônia mesmo. Vi que o pessoal ainda tentou marcar de encontrar para se despedir e sei lá o quê, mas ele não respondeu as mensagens, pelo menos não no grupo. Individualmente eu já não sei, porque eu mesmo não o procurei.

Felipe estava recebendo um gelo esquisito do resto do colégio inteiro. Até os professores pareciam trata-lo diferente — não estávamos na mesma sala, mas o Renan confirmava minhas suspeitas com alguns comentários. Acho que estavam culpando-o por causa do coma do Joel e, mais, pela perda dos outros alunos... Já que o Gustavo não estava por perto mais, o peso recaía todinho sobre as costas dele. O Caíque e o Carlos se safavam de tudo porque... sabe-se lá porque. E aparentemente não estavam dispostos a levantar a barra junto com o dito "amigo".

Aliás, o Joel nos enviou uma mensagem particular também, pra contar algumas novas. Como o fato de que ele teria de repetir o segundo ano inteiro por causa das faltas causadas pelo seu tempo no hospital. É óbvio que achávamos isso tremendamente injusto, mas ele não reclamou tanto, dizendo que preferia voltar toda a matéria a se matar de estudar pra fazer uma prova de proficiência, algo do tipo, e ser apto a cursar o terceiro ano.

Se ele estava mais ou menos tranquilo com a situação, só nos restava apoiá-lo, né?

Por causa da confusão das mudanças de turma na nossa escola, e também de alguns atritos que eu não entendia muito bem, chegar na sala todo dia era uma surpresa: eu nunca sabia exatamente onde me sentaria. O mapa de assentos fora completamente ignorado e ora o Carlos estava na primeira carteira, ora na última. As meninas, Natália e Isadora, acompanhavam as mudanças. Por causa delas, o grupinho do Luiz e da Maria também se mantinha itinerante para ficar o mais longe possível fisicamente do meu primo e companhia.... E ainda tinha a Camila, cujo namorado, Diego, tinha sido separado dos amigos, o Pablo e o Marcos, que agora estavam na sala B. Camila e Diego se misturavam ao Luiz Eduardo & Cia, mas também mantinham o terreno neutro com o resto da sala, inclusive comigo, que não tinha um lugar definido para ficar...

A ansiedade de saber onde eu me sentaria diariamente me gerava dores de cabeça constantes. Subir as escadas era uma tortura porque eu nunca tinha certeza do que encontraria no final. Essa insegurança me matava por dentro.

Até que, na sexta-feira, finalmente um dos professores ouviu minhas preces internas e organizou de novo o mapa da turma, "para acabar com a bagunça e a conversa de uma vez". Só que não saiu exatamente do jeito que eu estava esperando...

— Espera, como é que é? — Renan levantou as sobrancelhas.

Dez minutos antes do intervalo do almoço, as turmas do terceiro ano foram chamadas no auditório para um comunicado da diretoria. Cochichávamos enquanto procurávamos uma cadeira no alto, longe da algazarra principal.

Aprendendo a Gostar de Você {Aprendendo III}Onde as histórias ganham vida. Descobre agora