Capítulo 29

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Só você sentiu por mim, o que nem eu sentiria

Você foi o meu escudo, e eu a própria covardia

Foi tanta força que eu fiz por nada,

Pra tanta gente eu me dei de graça

Só pra você eu me poupei

- Dublê de Corpo - Heróis da Resistência


— Eu disse que ninguém ia morrer, mané.

O Eduardo tirou a chave da ignição com um movimento exagerado. Não era a primeira vez que ele dirigia, mas era a primeira vez que ele dirigia sem o pai ou o avô e o melhor de tudo, seu próprio carro!

— Cara, eu não tô acreditando que você tá motorizado antes de mim. O resultado do vestibular saiu hoje! — O Renato soltou as mãos do banco, e o Eduardo checou discretamente se as marcas fundas dos dedos não estragaram o estofado.

— Fazer o quê, se o meu avô confia mais no meu taco que o seu pai no seu? — Ele abriu a porta e desceu, embora fosse capaz de passar a noite dentro do seu carro com cheirinho de novo. Estranho. Como eles faziam carro de segunda mão ter cheiro de novo?

— O seu Helói é demais! — O Renato o encontrou na calçada e eles andaram lado a lado até a entrada do bar.

A galera do colégio já devia estar toda lá. Era uma noite de comemoração para os aprovados no vestibular e um motivo para os que não tiveram a mesma sorte encherem a cara. Se o Eduardo pensou que seria fácil avistar o grupo grande da porta, dançou. O bar estava lotado de mesas juntadas e grupos grandes que tiveram a mesma ideia que eles.

— Lá no fundo. — O Renato apontou e saiu andando na frente.

Aquela risada.

O mundo em volta do Eduardo parou, porque só existia uma pessoa com o riso que parecia um feitiço, e seus olhos foram imediatamente atraídos por ele.

Ela estava sentada de costas, mas o Eduardo a reconheceria de qualquer jeito, em qualquer lugar. Quase dois anos não foi suficiente para apagar nenhum detalhe da memória. Quase dois anos, e apesar de morarem perto um do outro, era a primeira vez que eles se topavam. Normal, considerando que eles não eram do mesmo círculo.

— A gente pode ir pra outro lugar. — A mão do Renato no seu ombro o fez dar um pulo, e o mundo voltou a girar.

— Nada a ver. — O Eduardo retomou o caminho da mesa dos amigos.

— Você não vai lá falar com ela?

— Falar o quê? Ela deixou claro que não tem nada pra falar comigo. — Ainda doía ter sido colocado de lado como se tudo entre eles não tivesse significado nada.

Ele fez questão de se sentar de costas também. Assim era mais fácil evitar que o olhar traiçoeiro pulasse para ela toda hora, mas era como se ele não estivesse lá, ou como se ele fosse um ator numa peça. O Eduardo brindou, riu e fez todas as piadinhas esperadas, mas todos os sentidos estavam conectados a algum lugar atrás dele, como cordões de uma marionete nas mãos do mestre.

Não! Ela tinha perdido o direito de ter poder sobre ele. Não era possível que depois de meses e meses de contato zero, a mão dele tremesse no copo de chope por causa dela.

O garçom voltou para anotar mais pedidos. O Eduardo resistiu à tentação de pedir outra bebida alcoólica e aguentou as risadinhas dos colegas por causa do suco de laranja. A lição tinha sido dura, e ele tentava não ultrapassar os limites, ainda mais agora que ele estava dirigindo. E ele tinha prometido a mãe ficar só num chope.

Eduardo e MônicaOnde histórias criam vida. Descubra agora