Capítulo 15

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Lara?! – Jeffrey chamou assim que entrou em casa. Lara saiu do quarto, ela havia acabado de trocar de roupa.

-Sim. – respondeu.

-Meu tio Martin e tia Diane estão vindo passar a semana aqui! – ele disse, exultante.

-O quê? – Lara não acreditava em seus ouvidos.

-Isso que você ouviu.

-Mas, por quê?

Jeffrey lançou um olhar de estranheza para ela:

-Ora, porque sim! Eles querem vir me ver, eu disse que viessem, fim.

Ele finalizou, indo em direção ao quarto. Lara se manteve imóvel. Lembrou do trabalho na floricultura.

-Quando eles chegam? – ela perguntou, parada à porta do quarto.

-Amanhã de manhã. – Jeffrey respondeu, sentado na cama, tirando os sapatos.

Era recém segunda-feira. Isso significava que ela perderia praticamente uma semana de trabalho.

-Por quanto tempo eles vão ficar? – ela perguntou. Pensava rápido, buscando alguma maneira de impedir aquilo.

Jeffrey parou o que fazia para fita-la:

-Por que tantas perguntas? – ele a encarou. Lara cruzou os braços, suavizando a expressão em seu rosto:

-Bem... é só que... não temos lugar. Essa casa tem só um quarto, onde eles vão dormir? – ela questionou.

-Já pensei em tudo. – Jeffrey se colocou em pé. – Eles vão dormir na pensão da dona Rosa, que fica perto, fazem as refeições e passam o dia aqui em casa. – Ele disse com um sorriso, indo em direção ao banheiro. – Ah, titio Martin. – ela o ouviu falar lá de dentro.

Lara ainda processava a informação. Dando-se conta de que talvez não tivesse outra oportunidade, ela foi ao telefone e ligou para dona Julia.

-Dona Julia, sou eu. – ela sussurrava. – Eu sinto muito, mas ocorreu um imprevisto, eu não poderei trabalhar nos próximos dias.... Não, não é nada grave, mas eu... Não, infelizmente não sei até quando. Eu peço perdão, eu realmente não tenho o que fazer... Certo, muito, muito obrigada. Até logo, boa noite.

Ela colocou o telefone no gancho, e olhou rápido para o quarto. Jeffrey parecia não ter saído do banheiro. Ela soltou o ar. Que Deus lhe desse forçar para aguentar os dias que viriam.

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-Onde está o meu garotão?! – Martin perguntou, indo ao encontro de Jeffrey, o abraçando.

-Meu querido tio Martin! – Jeffrey falou com um sorriso que ia de orelha à orelha, dando-lhe dois tapas nas costas.

A tia de Jeffrey, Diane, foi cumprimentar Lara:

-Oh, veja só você, não mudou nada! – ela disse, e Lara se viu obrigada a sorrir.

-Fizeram boa viagem? – perguntou ela.

-Viagem é sempre ruim. Você vem sacolejando, as estradas esburacadas... – Respondeu Martin, no seu habitual mau humor.

-Tem café quente na cozinha. – falou Lara, já se dirigindo para lá.

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Sentados à mesa, todos comiam. Diane falou:

-O seu bolo está uma delícia, querida.

-Obrigada. – respondeu Lara, sem graça.

-Esse garotão aqui tirou a sorte grande! – Falou Martin na voz de trovão, dando dois tapas no ombro de Jeffrey, que deu um sorriso amarelo em resposta. Lara se limitou a abaixar a cabeça, bebendo seu café.

-Eu sempre digo – continuou Martin – lugar de mulher é em casa, fazendo as coisas do lar, cuidando de nós, que trabalhamos para sustentar a casa e os seus caprichos!

Nesse momento, Lara levantou o rosto para fitar o homem, desafiando-o com os olhos. Jeffrey emendou:

-Eu penso igual, titio. Quando a Lara veio com essa ideia de querer trabalhar, eu disse que não na hora. – Falou ele, estufando o peito, se mostrando muito macho para o tio. Lara sentiu enjoo de tudo aquilo.

-Eu não vejo problemas. – Ela se viu falando.

Silêncio total. Todos olharam em sua direção. Jeffrey parecia que ia come-la com os olhos.

-Querida, não é mais fácil assim? Nós cuidamos das coisas, e colocamos tudo em ordem. Imagine como seria se deixássemos nas mãos deles. – Diane deu uma risadinha, amenizando a tensão.

Martin tinha a expressão carregada.

-Você fez muito bem, meu sobrinho. – Martin falou para Jeffrey, mas fitava Lara o tempo inteiro. Ela, por sua vez, não desviou o olhar. – Eu não sei onde as mulheres andam com a cabeça ultimamente. Além do mais, essas feministas que perturbam a ordem não passam de vagabundinhas!

Nesse momento, o sangue subiu pelas bochechas de Lara. Ela gostaria de abrir a boca e falar que achava nobre quando as mulheres lutavam por seus direitos, que foi graças à isso que agora tinham direito ao voto. Lara gostaria de dizer que não entendia porque a mulher tinha que cuidar unicamente da casa, como se fosse incapaz de fazer outras atividades, o que não passava de mentira, uma vez que ela própria, além de cuidar da casa, trabalhava, e conseguia desempenhar todas as funções. Ela queria dizer que uma mulher é tão importante quanto um homem, e que o fato de ter nascido do sexo feminino em nada a diminuía. Ela queria falar tantas outras coisas, mas não podia. Com os olhos cheios de lágrimas, numa mistura de raiva e impotência, ela se colocou em pé, para olhar incrédulo dos dois homens e da outra mulher à mesa.

Lara foi para o quarto, de onde não saiu até que os convidados fossem para a pousada, onde passariam a noite.

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Mais tarde, ao entrar no quarto, Jeffrey esbravejou:

-Você perdeu a cabeça?!

Lara se manteve em silêncio.

-Eu estou falando com você! – ele gritou. Lara olhou para ele.

-Eu só falei o que estava pensando.

-"Eu só falei o que estava pensando" – ele a arremedou. – Você não tem que falar nada! Você ouve, e concorda. Que falta de respeito com o meu tio!

-Não. – Lara disse, e Jeffrey a desafiou com os olhos.

-Como é...? – o rosto dele ficou vermelho de fúria.

-Eu não sou obrigada a nada, Jeffrey. Você é o meu marido, você não é o meu dono. – ela repetiu em voz baixa as palavras que Katherine um dia havia dito para ela.

A expressão no rosto de Jeffrey vacilou. Vendo o olhar dela, ele sentiu medo. Sentiu que ela estava prestes a ameaçá-lo. Sentiu que ela poderia a qualquer momento contar tudo que os envolvia a Charles e Katherine, e diante do temor de ser exposto diante do tio, Jeffrey de se calou.

Resmungando qualquer coisa, apenas para ter a palavra final, ele entrou no banheiro e fechou a porta. 

Duas MulheresOnde histórias criam vida. Descubra agora