Dîner D'intérêt

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Aquela era a terceira taça de vinho que Thierry tomava aquela noite. Ele, senhor Laforet, suas irmãs, os Bovary e Émile Edmond, noivo de Violeta, estavam apenas esperando a chegada de Marlon e de seu pai para iniciarem o jantar.


- Como se não bastasse meterem-se em um jantar de família, eles ainda ousam atrasar? - resmungou Émile. - Tinha mesmo que convidá-los, Nicole?


- Não culpe a mim. Culpe ao meu irmão e sua falta de bons modos. - defendeu-se Nicole.


Thierry segurou-se para não berrar para que irmã não o metesse em seus planos românticos com um ninguém com quem ela esbarrara na rua.


- Ao que parece, meu caro Laforet, Violeta é realmente a mais sensata de seus filhos. - disse Émile com um sorriso para a noiva e ela lutou para evitar demonstrar o seu constrangimento com o elogio.


- Ainda lhe restava alguma dúvida, Émile? - riu senhor Laforet. Thierry também teve que ignorar o pai antes que a raiva armazenada dentro dele desde o dia anterior vazasse pela sua boca em forma de insultos.


Finalmente Marlon e seu pai, Raul, entraram seguindo uma das criadas para não se perderem pela casa. Após um jantar constrangedoramente silencioso para ambos, senhor Laforet decidiu puxar conversa sobre um assunto qualquer com eles apenas para que o senhor Bovary não o achasse um mau anfitrião.


- Nos mudamos recentemente para uma propriedade não muito longe daqui. - respondeu Raul quando senhor Laforet o perguntou sobre onde morava. - Recebemos como herança do meu falecido irmão que, muito diferente de mim, prosperou na vida, mas não tinha filhos ou esposa.


- De que propriedade estamos falando mesmo? - perguntou Émile, mostrando interesse na conversa pela primeira vez.


- Aquela próxima ao lago, ao leste. - respondeu Marlon. Os olhos de Émile brilharam em interesse.


- Uma bela mansão, se me permitem dizer. - o senhor Bovary entrou na conversa. -Mas, se não for muito grosseiro de minha parte perguntar, por que o senhor ainda trabalha na feira vendendo carnes?


- A fortuna era do meu irmão e não minha. Vou continuar trabalhando para mostrar ao meu filho o valor do dinheiro e do esforço. - discursou Raul. - Deixarei tudo para Marlon sem mexer em uma única moeda, mas quero que ele saiba a importância de cada centavo. Se tudo ocorrer como planejei, Marlon herdará tudo do tio sem tirar nem por.


Ao ouvir aquelas palavras, os olhos do senhor Bovary e do senhor Laforet faiscaram de ganância. Ambos estavam diante de um pretendente que proporcionaria um casamento vantajoso para suas filhas e não deixariam a chance passar tão facilmente.


Foi senhor Laforet quem primeiro tomou coragem para fazer a tão esperada pergunta:


- E seu filho, Raul, está noivo?


- Não está. - respondeu Raul, inocentemente. Ele parecia avulso à trama que se orquestrava ao seu redor. - Acredito que não existam muitas damas dispostas a se casarem com um rapaz que mal sabe escrever o próprio nome.


- O senhor Marlon não sabe escrever? - perguntou Thierry com um sorriso verdadeiro no rosto por estar diante de uma cena triste na visão de muitos, mas satisfatória aos seus olhos. Então o tão sonhado pretendente sequer saberia escrever uma carta de amor para Nicole? Deplorável.


- E nunca saberá se depender dos valores exorbitantes que os professores que encontro cobram para ensiná-lo. Pensam que, só porque possuo dinheiro, podem pedir o quanto quiserem. - reclamou Raul. - Passei minha vida toda sem ler uma única palavra e estou vivo, não estou? Marlon também sobreviverá. Principalmente se não for obrigado a jogar seu dinheiro na boca daqueles sanguessugas.


- Ora, meu amigo, por que se preocupar com coisa deste tipo quando sempre se tem vizinhos a quem pedir socorro? - perguntou o pai de Thierry.


- O senhor sabe de algum professor que cobre um preço justo?


- Melhor, meu caro. Tenho certeza de que meu filho ficará bastante satisfeito em ensinar uma coisa ou outra ao seu.


Thierry olhou incrédulo para o pai. Seria tudo aquilo um terrível pesadelo ou o senhor Laforet o estava usando a fim de criar uma ligação entre as duas famílias?


- Eu seria e-eternamente grato ao senhor, p-porém não pretendo incomodar seu f-fi-filho. - Raul olhou com receio para Thierry. Mesmo de longe era quase possível escutar o queixo do senhor tremendo.


- Certamente o seu filho tem coisas mais importantes para fazer. - falou um contrariado senhor Bovary.


- Isto quem nos dirá será ele.


- Está com a razão, Émile. E então, meu filho? O que nos diz?


Thierry estava muito tentado em responder não. Ajudar os outros sem sequer pedir algo em troca não fazia muito seu estilo. Entretanto, ver a expressão assustada de Raul e o quanto Marlon estava esforçando-se para fingir que a ideia era de seu agrado o divertiu tanto que foi praticamente impossível dar outra resposta.


- Nada me daria mais prazer.


E, realmente, nada o daria.


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