Capítulo 4 - Os croquis

6 2 0
                                    

Apesar de amar muito Kike, nesse momento Amara gostaria de fazer a egípcia e falar que não o conhece. 

Estavam os dois sentados na sorveteria mais próxima do ateliê de Amara, nas mesas externas, e Kike não parava de fazer gracinha. As pessoas passavam e riam do jogador enquanto a amiga tentava abrir um buraco no chão com seus sapatos para poder enfiar o rosto ali.

— Se você colocar essa colher no nariz de novo, eu vou te deixar aqui sozinho para pagar a conta. — Ameaçou Amara.

 — Ai Amara, finge ter um pouco de senso de humor. — Responde Kike, voltando a comer o sorvete normalmente. — Sabe de uma coisa? Você anda muito... qual o gênero de hoje?

— Neutro, pode me tratar no feminino. — Amara responde com um leve sorriso. Kike, mesmo depois de um tempo separados, ainda se preocupava com ela a ponto de não errar o pronome. Kike sabia o quão importante eram para ela os pronomes, já que também namorou uma pessoa trans não-binária como Amara, então fazia o seu melhor para não pisar na bola.

Okay, você anda muito estressada ultimamente cara. Eu sei, eu sei, é o seu trabalho, ele é a sua vida, o ar que você respira e o sangue que corre nas suas veias, mas cara... Você nem sorri direito. Você tem ido ao psicólogo? Tem se cuidado? Qual foi a última vez que você se permitiu ter um momento desses, de descontração, sem que eu tivesse que te ligar tanto até você decidir ir pra me fazer ficar quieto? — Kike metralha ela de perguntas. Apesar de estar preocupado, o cuidado extremo deixa Amara levemente estressada. Não estava acostumada a ter alguém cuidando dela assim, de forma tão intensa. Nem dando tanta atenção. Era algo irônico já que ela era uma pessoa pública e famosa.

— Tenho, Kike. Tenho feito isso tudo, mas, como você mesmo disse, meu trabalho é estressante. Eu tenho de fazer essa desgraça de vestido pra um dos casamentos mais importantes do país! E falta menos de um ano! Eu ainda não sei se uso renda ou seda, se faço saia longa, se faço ele simples, se faço trabalhado. E ainda tenho que procurar o material, fazer os moldes, costurar os exemplares... — Amara desatou a falar, ficando cada vez mais nervosa. Kike, percebendo onde isso ia parar, a interrompeu:

— Ei, ei, ei. Respira Amara. Profundamente. Vamos, faz comigo. — Começou a respirar fundo junto com ela, até perceber que a amiga estava calma. — Pronto. Você ainda tem tempo, meu anjo. Você tem todo tempo do mundo. Aliás, esse tipo de preocupação que você citou não era trabalho dos seus assistentes? 

— São, sim. Mas sabe como é. Eu não consigo confiar tanto a ponto de deixar totalmente na mão de outra pessoa. Gostaria muito de conseguir, eles são incríveis. Mas ainda é muito difícil pra mim. — Ela confessou, meio triste. — Apesar de tudo, tenho sim ainda alguns meses antes de precisar apresentar tudo, e tenho já um desenho em mente. Eu ainda não gosto totalmente, mas é algo importante. A cliente é uma amiga antiga minha, apesar de não tão próxima. Gosto muito dela e ela me escolheu especificamente para o trabalho, nem tentou procurar de outros designers... Sem contar também uma coleção que estou pensando em fazer. O inverno tá chegando, e eu queria inovar. A ideia de "menos é mais" não sai da minha cabeça.

— Olha Amara, queria te falar não, mas ontem mesmo eu estava falando disso com os caras lá do time. Não era exatamente sobre isso né, mas era sobre como a gente precisava de roupas melhores para o time, já que treinamos muito do lado de fora e gostamos muito da mobilidade das roupas de verão de academia, mas elas nos deixam muito vulneráveis a pegar uma doença. Não sei se você consegue tirar algo disso, mas seria bom se alguém fizesse uma linha de roupas assim... Não to querendo insinuar nada, só dizendo que deixaria o time muito feliz e de quebra teria uma visibilidade enorme né, não é todo mundo que veste um time famoso da Liga Nacional de Basquete. 

entre(nós)Where stories live. Discover now