Capítulo 3

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27 de agosto de 2017
Harlem - New York - EUA 14h45min
Podia escutar o barulho dos carros passando pela rua e sentir uma claridade invadir o quarto, fazendo eu me amaldiçoar por ter esquecido a janela aberta na noite anterior, quando entrei perdida em pensamentos. Com certa dificuldade abri os olhos devagar e procurei o aparelho celular com uma das mãos. Assim que encontrei pela cama, olhei as horas e me levantei em um pulo. Tinha perdido o meu avião que partiria para Londres no horário da manhã. A única coisa que não tinha esquecido era do final de semana que tive e da Emma. Liguei para companhia aérea, fazendo uma nova reserva pra parte da tarde enquanto me despia para entrar no chuveiro. Depois de tomar um banho rápido e me arrumar, peguei a minha mala e entrei no elevador rapidamente. Ainda me sentia um pouco sonolenta e ao chegar no térreo caminhei até a portaria, me lembrando que tinha esquecido de pedir um táxi. Bati a mão na testa resmungando baixinho para que o porteiro não escutasse. Como sempre ele estava entretido olhando para pequena TV sobre o balcão. Era um homem sério e simpático com todos. Ao me notar ali, ele balançou a cabeça com um sorriso no rosto.
- Boa tarde, Senhorita Williams!
- Boa tarde, Clark.
- Chegou umas cartas para você. - Disse estendendo as cartas para que eu pudesse alcançar.
Caminhei apressadamente até ele e peguei as cartas. Agradeci saindo do prédio logo em seguida, ainda com as cartas em mãos, fui olhando uma por uma, vendo que a maioria era conta para pagar e colocando debaixo do braço. Ao olhar a última carta com o nome da minha irmã parei de andar de imediato. Desviei meu olhar para rua, olhando em volta para ver se tinha algum táxi livre. Parecia que hoje tudo estava dando errado para mim. Assim que avistei um táxi dei sinal para parar, mas já era tarde demais, outra pessoa já tinha dado um sinal para o carro que parou rapidamente.
- Mais que merda!
Voltei minha atenção para carta da minha irmã e abri com certa dificuldade. Antes que eu pudesse ler o que estava escrito, escutei o celular tocando e ao pegar vi que era Verónica me ligando. Coloquei a carta embaixo do braço para poder pegar o celular do bolso atrás da calça.
- Fala.
- Até quem fim atendeu né? Já está no aeroporto? - Perguntou Verônica enquanto olhava algumas papeladas em seu escritório.
- Eu perdi o horário e agora estou tentando pegar um táxi pra pegar o próximo voo. - Respondi olhando em volta, na esperança de achar um táxi livre.
- Ninguém mandou sair tarde do clube, falando nisso, você saiu sem se despedir da gente.
- Mil desculpas, quando vi o horário eu saí apressada pra fazer as malas.
- Tudo bem, eu te perdoo se você me contar o que foi aquilo ontem, branquela. - Soltou Verônica.
- Aquilo o que? - Perguntei confusa.
- Você e a latina, dançando agarradinhas, como um casalzinho lésbico. Todo mundo percebeu que vocês duas estavam em um clima quente, até você sair do nada.
Sabia que Verônica estava revirando os olhos ao terminar aquela frase. Conhecia muito bem a minha amiga e nem precisava estar na frente dela para saber qual expressão estava usando ao falar.
- Não fale besteira Verônica, só gostei de conhecer ela. Emma é uma mulher simpática e gostaria de ter conhecido ela melhor, antes de ir para Londr...
Um barulho de buzina me fez parar de falar e olhar para o lado em que vinha o som. Senti meu corpo todo congelar ao ver uma caminhonete invadir a calçada, vindo em minha direção rapidamente. Ao escutar o barulho do pneu derrapar sobre o asfalto, fechei meus olhos com força esperando pelo impacto, pois era tarde demais para ter qualquer tipo de reação.

(...)

Antes que pudesse chegar ao hospital, Emma parou em uma pequena cafeteria ao lado do seu trabalho e pediu um café duplo. Dana não parava de falar como tinha sido bom a noite anterior e o quanto tinha curtido Normani. Por mais que a latina estivesse quieta, não poderia discordar disso.
- Pegou o número da cara pálida?
- Que cara pálida? - Perguntou Emma confusa.
- Da Lucy, Emma. Pegou!?
- Não. Depois que a gente dançou ela saiu apressada. - Respondeu com pesar.
- Eu sei que nunca ficou com mulher e nem sei se ficaria, mas venhamos e convenhamos, qualquer mulher ficaria com uma deusa grega como aquela, Emma! Qualquer mulher.
- Lucy era uma mulher elegante e bonita demais para uma pessoa como eu, Dana.
- Então você está admitindo que gostou dela?
Emma concorda com a cabeça dando uma risada, colocando as mãos ao rosto na tentativa de esconder sua vergonha ao admitir aquilo para amiga. Dana por sua vez levantou os braços alegremente.
- Não acredito que a minha amiga é do vale porraaaa! Quanto tempo eu esperei por isso, mas falando sério agora, você é tão linda quanto ela, sua idiota. - Disse Dana dando um tapa na cabeça da amiga.
Ao receber o café, Emma saiu do estabelecimento em passos largos ao lado da amiga.
- Não acredito que perdeu essa oportunidade, Emma. Desse jeito você vai virar uma freira! - Protestou Dana.
- Você escutou o que ela disse né? Ela iria para outro país. E do jeito que você está falando parece que eu tenho alguma experiência com mulheres.
- Não me venha com essa, amiga. Aquela mulher mexeu com você e o jeito como falou dela, deixou isso bem explícito. - Soltou Dana depois de dar um gole em seu café.
- Você não tinha que ir trabalhar?
- Já passou da hora de você arrumar alguém Emma, não importa se vai ser homem ou mulher, você precisa tirar a teia de aranha ai de baixo amiga.
- Eu vou trabalhar, beijos. - Disse a latina se afastando da amiga, caminhando em direção ao hospital em que trabalhava.
- Se você vira freira pode esquecer que eu existo! - Gritou Dana.
Emma deixou uma risada escapar ao escutar aquilo e sentiu os olhares de quem passava perto se virarem para ela. Ela estava sempre querendo que a latina ficasse com alguém na noitada. O clima não estava ruim e Emma respirou fundo ao sentir seu corpo se arrepiar, seguido de um aperto no coração, sem motivo algum. A mulher olhou em volta estranhando aquilo e continuou seu caminho calmamente.
Ao adentrar viu Sarah sorrir para ela e logo tratou de retribuir ao se aproximar da mulher. Sarah trabalhava a anos no hospital e estava sempre de bom humor e sorrindo para todos. Emma se perguntava qual era o segredo para estar assim todos os dias.
- Tomando café a essa hora, senhorita? - Perguntou Sarah com a voz divertida.
- É sempre bom, não importa o horário. Como está o movimento hoje? - Perguntou querendo saber como estavam as coisas no hospital.
- A única coisa que chegou hoje foi uma vítima de acidente de carro, em estado gravíssimo. - Respondeu olhando para a prancheta que estava em suas mãos.
- Triste isso. Mas mudando de assunto, como foi seu final de semana?
- Passei na casa da minha família, em Boston. E você? Dana falou que você finalmente saiu com ela.
- Fomos em um clube perto de casa. Conhecemos pessoas novas, foi divertido e eu pude me distrair um pouco porque só Deus sabe o quanto estava precisando disso depois de passar a semana inteira de plantão aqui.
- Ela deve ter adorado, Dana adora sair na noitada e contar altas histórias depois. - Disse ao se sentar na cadeira.
- Como sempre! Bom, eu vou indo que o dia está só começando pra mim.
- Bom trabalho. - Disse Sarah se despedindo.
Emma caminhou sem presa até Sophia, que estava com a prancheta em mãos dando ordens para alguns enfermeiros. Assim que notou a presença da latina ali, ergueu uma das sobrancelhas e permaneceu com a cara fechada. Sophia era uma mulher de 43 anos, mandona e ranzinza como uma velha medica passando as tarefas para seus residentes, mas tinha um bom coração.
- O que tem pra mim hoje? - Emma perguntou ao se aproximar da mulher.
- Caleb está na emergência hoje. Você pode ficar com ele ou ir para sala de cirurgia ajudar o doutor Martinez.
- Eu te amo. - Disse depositando um beijo em sua bochecha.
- Depois disso você vai pra emergência, querida. Fica de olho nos novatos a residente! - Gritou para que eu pôde-se escutar sua ordem. Corri rapidamente para o banheiro ao lado da sala de cirurgia, onde o senhor Martinez estava se arrumando para dar início a cirurgia. Depois de fazer o processo de higiene, a latina rapidamente caminhou até a sala de cirurgia. O dia de trabalho iria ser longa pra mim. Ao adentrar a sala onde o paciente estava, a latina travou. Uma onda de imagens invadiu sua mente, fazendo ela se lembrar de cada segundo que passou ao lado daquela pessoa. Seu rosto estava tomado por hematomas e machucado. Sua boca estava entre aberto, dando a visão do pequeno corte ali. O som dos aparelhos fez o coração da latina se partir em pedaços ao perceber que aquilo não era um sonho.
- Todos os equipamentos então a postos? - Perguntou o Sr.Martinez ao se aproximar. - Emma? Não me ouviu? - Perguntou novamente.
- Eu...não posso te ajudar. - Falou deixando as lágrimas caírem logo em seguida, indo com as mãos sobre a boca.
- Conhece a paciente?
A imagem daquela mulher a sua frente não permitiu que Emma conseguisse pronunciar nenhuma palavra se quer. Estava paralisada e trêmula.
- Tirem a Emma daqui rápido! Tratem de trazer um cirurgião auxiliar para me ajudar, imediatamente. - Disse Martinez com a voz alterada.
Emma saiu do transe quando conduziram ela para fora da sala de cirurgia. Ainda incapaz de tomar alguma atitude, a latina se sentou em uma cadeira ao lado. Em sua cabeça ela não conseguia entender o que aquela mulher estava fazendo em New York naquele horário. Ao se dar conta sentiu as lágrimas descerem de imediato. A voz de Sarah veio em sua mente ao se lembrar dela falando que o estado em que a paciente se encontrava era gravíssimo. Ao pegar o celular do bolso, Emma procurou o contato da primeira pessoa que deveria saber da notícia. Ainda trêmula, a latina achou o contato, colocando o celular ao ouvido logo em seguida.
- Alô?
- É a Emma...

Um segundo (DREAME)Where stories live. Discover now