Capítulo 1

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            A viagem de Carolina não tinha como não ser de outra maneira: forte, impulsiva como ela mesma. Aquele final de semana seria decisivo. Carolina estava inquieta sentada na primeira fila do ônibus interestadual que cruzava os estados do sul do país. Seria uma longa viagem. Ela trazia na bagagem um misto de desejos que forçavam sua mente em busca de uma solução.

Fabrício estava estranho ao telefone, quase irreconhecível. Diferente de alguns meses atrás, quando o amor estava apenas começando.

- Carolina, eu estou trabalhando agora, não posso conversar.

- Entendo seu mau humor. Você bateu o carro e está nervoso. – ele havia se envolvido em um acidente sem feridos, no entanto seu Fiat Uno ficaria no mecânico por um mês. - Mas fala comigo, amor!

- Carolina, por favor. As ligações da telefônica estão custando uma fortuna. Você sabe que ainda não tenho linha de telefone disponível aqui nesse fim de mundo para usar em meu apartamento. Diga logo o que você quer. – disse Fabrício com a irritação cada vez mais aparente.

- Você está estranho. Tem alguma coisa acontecendo. – algo soou dentro dela.

- Não tem nada acontecendo. Não invente situações agora, Carolina. Namoramos à distância e confesso que essa situação está cansativa. – falou de rompante e de maneira abafada.

Carolina ficou em silêncio assimilando o que Fabrício deixava passar pela ligação telefônica. Ela negociara com as colegas da República para usar o telefone da casa em que moravam com maior privacidade. Tinha o tempo a seu favor, mas Fabrício não colaborava.

Pelo tom frio de sua voz ela tinha certeza de que ele nem desconfiava que ela precisava ouvir sua voz. Todo o romance guardado para o momento da ligação parecia não mais fazer sentido. Ele não deu importância para o que ela sentia. Era isso. Ter essa certeza quebrou seu coração.

- Carolina? Você está aí?

Engolindo em seco, ela pigarreou e disse finalmente com a voz mais firme do que estava:

- Sexta-feira eu vou para Santana do Livramento e, então, conversaremos.

Ele apenas assentiu e logo desligou.

Carolina ficou sentada no chão no escuro da sala de estar olhando para o fio do telefone ainda enrolado em sua mão. Ela fazia isso desde criança, especialmente quando ficava nervosa ou ansiosa. Era isso e roer unhas. No entanto, desde que começara a namorar Fabrício deixara suas unhas intactas, porque ele dizia, em uma fala arrastada, mas precisa:

- Como uma moça tão linda tem unhas tão feias?

Fabrício era bom em dar lições, e, Carolina era uma boa aluna.

No entanto, suas belas e compridas unhas com esmalte escuro e sóbrio, não pareciam fazer diferença. Ela riu da ironia, nervosamente. Dentro dela uma força sufocante queria gritar em alto e bom som, como ele havia magoado Carolina. Mas como era de costume ela calou para todas as suas dores.

O jantar foi reduzido a uma fruta da estação - pokan sempre foi sua fruta favorita. Suas amigas vindas de São Paulo a conheciam como tangerina. Seu forte odor quando era descascada trazia muito da infância de Carolina quando visitava os tios em Livramento.

Mais tarde, antes de dormir, ligou para a tia avisando de seu retorno repentino sem entrar em maiores detalhes. A tia não apreciava Fabrício. Para Carolina era uma implicância qualquer. Talvez não.

Teria que avisar a escola em que estagiava dentro da Universidade, que era o Núcleo de Desenvolvimento Infantil de que iria se ausentar mais uma vez. Ela estava a um passo de ser demitida por conta das viagens para ver Fabrício.

Ele trabalhava em uma companhia de seguros em Livramento, era vendedor nato. Mas aparentemente nunca poderia visita-la em Florianópolis. Carolina sabia que ele poderia ir, se assim quisesse. Ele nunca fora. E ela odiava isso por dentro, afastando de sua verbalização o que mais a magoava. O que ela nunca falaria em voz alta.

Sua vasta cabeleira vermelha encaracolada do início dos fios até a sua ponta estavam arrepiados quando acordara de madrugada, às 5 da manhã para assistir aulas na universidade. Atravessar a ponte era uma aventura diária e chegar às 7h30min para as primeiras aulas, uma obrigação.

Aquele seria um dia diferente; pediu dinheiro emprestado com sua amiga paulista para comprar a passagem na rodoviária. Despediu-se de todas enquanto tomavam o café da manhã na cozinha barulhenta.

             O novo dia aflorou mais do que esperança em seu coração

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O novo dia aflorou mais do que esperança em seu coração. Faria de tudo para olhar dentro dos olhos de Fabrício. Só ali estaria segura, novamente.

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Esta é  apenas uma história de amor.

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