Capítulo 4

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Depois de duas horas, Carolina chegou à cidade indicada pela placa do ônibus. O nome não importava essa não era a questão, a cidade em si era indiferente; qualquer uma servia para seu autoexílio.

Era domingo e a pequena cidade estava borbulhando repleta de grupos familiares, alguns rindo, outros não, mas todos se dirigiam para algum lugar que Carolina ainda desconhecia. Duas horas da tarde e ela ainda não tinha almoçado. Foi caminhando e viu alguns cartazes colocados nos postes de iluminação pública, foi quando tomou conhecimento da agitação: era o almoço beneficente em prol da restauração da Igreja Matriz, onde serviriam o famoso carreteiro gaúcho a preço popular. Sem a menor sobra de dúvidas seguiu a leva de pessoas que para lá se dirigiam.

No salão da paróquia, todos os presentes falavam ao mesmo tempo, andavam em passos pequenos com os pratos ainda vazios; o cheiro das grandes panelas de alumínio inundava o ambiente, aumentando em altos graus a vontade de matara fome. Carolina entrou na fila, chamando a atenção por onde passava. Claudio estava a sua frente; era jovem assim como ela, mas com um percurso diferente. Mesmo tendo a possibilidade de estudar em Porto Alegre e lá cursar uma universidade, Claudio preferiu se dedicar à estância da família "Coplas de Sol e de Lua" que ficava a uma hora de distância da Matriz.

Ele, ao se voltar para trás porque alguém havia lhe esbarrado, encontrou Carolina sorrindo tentando equilibrar seu prato vazio que quase se espatifa no chão.

- Desculpe-me. – Ele falou sem desgrudar dos olhos de Carolina.

- Imagina! Eu estava distraída aqui com meus próprios problemas, deveria ter ficado mais atenta à fila. – respondeu de maneira mais simpática do que soaria a minutos atrás perdida em sua nuvem insolúvel de problemas amorosos.

Claudio ficou boquiaberto com a sonoridade rouca de Carolina. Ficou assim por alguns instantes, esquecendo-se do que o rodeava inclusive a fila que já havia se adiantado dele.

Com um meio sorriso, Carolina indica com a cabeça o vácuo na fila aberto por aquele rapaz interessante, ela não deixou de notar.

Claudio mostrou toda sua desenvoltura em conversar com a jovem de cabelos vermelhos rebeldes e voz rouca. Ele estava totalmente absorvido pela presença dela.

Durante o almoço eles sentaram-se na mesma mesa e trocaram mais do que sorrisos. A conversa corria solta, e Carolina não tentou fugir. Misteriosamente sentiu-se presa sem amarras àquela agradável festa comunitária.

- Minha vó, Dona Antônia, convocou toda a família para assistir sua apresentação no coral de vozes que comemorou a restauração da Matriz.

Do outro lado da mesa, sentada perpendicularmente em relação a eles, estava D. Antônia com seus olhos afiados para seu neto favorito.

- Ela é muito ativa mesmo! Quantos anos ela tem?

- Dona Antônia não teme o tempo nem a sua passagem. Ela diz em alto e bom som que vive atualmente há 79 anos na Terra. Ela é a minha inspiração. – sorriu profundamente de maneira convincente.

Carolina suspirou alto sem perceber. Assustou-se em demonstrar seus sentimentos publicamente.

O almoço seguiu a distribuição de Graspa, um digestivo que Carolina provou, mas não se aventurou a beber todo o conteúdo.

- É muito forte!

Claudio riu das caretas de Carolina. Ela corou com a intensidade do olhar dele preso em seu rosto. Ele parecia querer decifrar todas as suas linhas de expressão. Ela então pigarreou.

- Preciso ir. – disse levantando-se do banco em que passara boa parte da tarde domingueira. – São quase 17h e nem sei aonde vou me hospedar. Tem algum hotel por aqui que seja respeitoso e com um preço camarada?

- Conheço um lugar perfeito. A Solange tem um pensionato muito bem recomendado. Sei que o preço é acessível e só hospeda moças. Venha comigo que a deixarei lá, sã e salva.

Carolina aceitou o convite do neto da matriarca da estância "Coplas de Sol de Lua". Não costumava pegar carona com desconhecidos. Mas Claudio não se parecia mais com um desconhecido depois de tê-la introduzido a toda sua família. Ela sabia mais dele do que de Fabrício durante os meses que ficaram juntos. Isso a assustou. Tamanha proximidade em tão pouco tempo a deixaria novamente em desvantagem. Aceitaria a gentileza dele e o afastaria.

Com essa resolução Carolina embarcou na caminhonete alta e empoeirada de Claudio. E partiu silenciosamente com o rosto perdido nas paisagens que via pela janela do automóvel.

 E partiu silenciosamente com o rosto perdido nas paisagens que via pela janela do automóvel

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