Não é verdade que uma vez vivi urna juventude amável, heróica,fabulosa, digna de gravar-se em páginas de ouro? Incomparávelventura! Por que crime, por que erro, vim a ser castigado com afraqueza de hoje? Vós que pretendeis que os animais solucem dedor, que os doentes desesperem, que os próprios mortos soframpesadelos, procurai aclarar os motivos da minha queda e do meusonho. Quanto a mim, não posso melhor explicar-me do que ummendigo com seus monótonos Pater e Ave Maria. Eu não sei maisfalar.
Todavia, agora, creio ter encerrado o relato de meu inferno. Era, nãohá negar, o inferno; o antigo, aquele cujas portas o filho do homem descerrou. Do mesmo deserto, na mesma noite, meus olhos semprecansados se voltam para a estrela de prata, sempre, sem que os Reisda vida, se comovam, os três magos, o coração, a alma, o espírito.Quando iremos enfim, para além das praias e das montanhas, saudaro nascimento do trabalho novo, da sabedoria nova, a fuga dostiranos e dos demônios, o desaparecimento da superstição; quandoiremos adorar - os primeiros! - a Natividade sobre a terra?
O canto dos céus, a marcha dos povos! Escravos, não amaldiçoemosa vida.
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Uma temporada no inferno - Arthur Rimbaund
RandomEmbora tenha parado de escrever aos 21 anos, Arthur Rimbaud (1854-1891) foi uma das vozes poéticas mais talentosas já vistas, e sua pequena obra influenciou os maiores escritores dos séculos XIX e XX. Uma temporada no inferno, de 1873, é o visceral...