"Arms"

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Um uivo ressoou no alto.

Quase ao mesmo tempo em que as labaredas da lareira se ergueram ao alto, igual a um momento assustador de um filme silencioso onde tudo acontece quando menos se espera.

Charles não se assustou. Nem por um segundo, enquanto seus olhos dançavam ao ritmo das chamas que não só o encantaram, mas também agraciaram seu corpo molhado e frio que agradeceu com um leve tremor empolgado. Veludo logo se aproximou da lareira, sentando sobre as patas para que o pelo absorvesse o calor. No entanto seu dono se levantou, não tinha tempo para pensar na sorte que era sempre manter tudo a postos naquela cabana perdida no meio da montanha entre a floresta, e logo caminhou até a cama, agarrando-a pelas brechas entre as madeiras mal pregadas e reuniu toda força para puxá-la para mais perto do fogo.

O animal doméstico levantou as orelhas ao escutar o som da mobília que arranhava o chão velho e empoeirado. Era como se rosnasse pela casa, e então retribuiu com o próprio som entre dentes, numa ameaça clara.

— Shhhh... — ordenou, ainda preocupado com a mulher que estava quase inerte, e empurrou a cama até o mais perto possível, aproveitando para apreciá-la melhor diante da luz alaranjada do lume que a iluminou com muito mais clareza. Charles não soube identificar o que sentiu, mas o coração oscilou dentro do peito, fazendo com que tivesse certeza que era a mais bonita que tinha visto até então.

Tirou as luvas que estavam molhadas e as mãos frias estavam pálidas como um cadáver. Sua mente não o livrou da lembrança de Credence, flutuando pelo mar a dentro, mesmo assim não demorou a afastar aquela imagem incómoda, pois precisava se focar na prioridade que era despi-la daquela roupa molhada.

Primeiro tocou o pescoço, o pulsar lento e distante atravessou a ponta de seus dedos e de uma forma estranha adentrou suas veias e acelerou seu sangue que correu cheio de pressa, arrancando um palpitar mais forte em seu tórax. Normalmente, era um jovem de meio-termo, nem muito ou pouco empolgado, e gostava de passar despercebido sempre que podia. E, aquele momento único contrariava todo o tempo em que viveu em completo limbo, fazendo com que se sentisse mais do que vivo.

Veludo bocejou.

— Não sei se está me escutando... Mas vou ter que tirar sua roupa. — Konstantine não queria ser desrespeitoso, mesmo quando tinha crescido num ambiente regado ao machismo, onde as mulheres não tinham espaço para dizer que não. Em North Folk, mostrar um joelho era motivo de justificar o assédio, e sequer parecia que estavam no século XXI. Não que compreendesse muito do que acontecia lá fora, em outras cidades, mas ainda sentia uma fúria quando via como os homens se dirigiam as mulheres, principalmente pelo rosto ofendido que muitas mostravam sem poder reclamar.

A mão desceu até a gola do vestido, seria branco se não estivesse tão encardido e o casaco de pano que deveria servir para protegê-la do frio, ali não passaria de apenas mais um trapo qualquer. Abriu os botões frontais, um por um, encontrando alguns quebrados e outros fora do lugar. Lá fora a chuva batia no telhado e se açoitava contra as janelas, criando um verdadeiro espetáculo de sons aconchegantes que faria daquele cenário propício para dormir, não fosse os problemas que pairavam a cada piscar.

O Diabo Veste TernoWhere stories live. Discover now