Capítulo 01.

12.5K 1.4K 183
                                    

Capítulo sem revisão.

Capítulo 01.

Hope Moore.

Oito anos depois...

Puxo o casaco mais perto em meu corpo. O vento frio corta minha pele quando passa sussurrante. Isso era São Francisco no inverno.

A fila anda mais um pouco, e minhas esperanças de conseguir um lugar para dormir e um pouco de comida quente, aumentam. Não era sempre que o abrigo de sem tetos da cidade tinha um lugar para oferecer, e eu seria uma sortuda, caso conseguisse uma vaga hoje.

A fila caminha um pouco mais e eu me permito até sorrir, fazia uma semana desde que eu tinha conseguido uma vaga no abrigo, e minha barriga roncava por uma comida um pouco descente.

Mas meu sorriso morre quando a voluntária vem com seu rosto em expressão pesarosa dizer que não tinha mais camas, o abrigo estava lotado para a noite de hoje.

As pessoas reclamam, mas seguem em frente e vão embora, assim como eu. Uma lágrima solitária escorre por meu rosto ao imaginar que esse seria somente mais um dia na minha vida, que amanhã eu estaria novamente nessa fila, novamente a espera de um milagre.

Caminho pela calçada, sem rumo, imaginando o que faria a seguir. Eu poderia somente sentar em um lugar na calçada e pedir esmolas, mas o vento cortante me fazia andar. Estava frio demais para que eu ficasse parada.

Eu só tinha um cobertor grosso em minha mochila surrada, e ele não era o suficiente para aplacar o frio, então eu caminharia até onde pudesse, para esquentar meu corpo.

Passo por uma vitrine de uma dessas lojas de departamento chique, e congelo no lugar. Não são as roupas que nunca poderei comprar que me chamam a atenção, e sim o meu reflexo no espelho.

Minha pele, antes de cor pálida, estava encardida, meus cabelos estavam oleosos, e o coque que fiz no topo não disfarçava os nós, resultados de meses sem lavá-los e penteá-los adequadamente. Minha roupa estava suja, e até rasgada em alguns pontos.

Suspirando eu volta a andar depressa, tentando deixar para trás a imagem que vi, mas ela tem passos rápidos e logo me alcança.

Eu me perguntava até quando permaneceria nessa situação, não era como se eu estivesse à espera de um milagre, o que eu achava, a essa altura, que seria a única coisa que me tiraria das ruas, mas eu tentei arrumar um emprego, alugar algum lugar para mim, mas ninguém alugava nada sem alguma garantia, e eu não tinha nenhuma, nem o mês adiantado que eles pediam eu poderia pagar.

Andando um pouco mais eu passo por um parque onde muitas crianças brincavam na grama verde, sendo assistidas por suas mães que sentavam nos bancos ao redor.

Eu as invejava.

Por todo o tempo que me lembre, sempre sonhei em um dia ter uma família. Um marido e filhos, além de uma casa para cuidar. Meus sonhos não eram tão difíceis, mas eram impossíveis para mim. Quer dizer, olhe para mim, eu era uma sem teto, uma moradora de rua.

Uma bola acerta minha canela e eu abaixo para pegá-la. Um menino de cabelos loiros, que não poderia ter mais que seis anos vem correndo até mim, e eu entrego a bola para ele com um sorriso.

Ele para me encarando, e eu arqueio uma sobrancelha para ele.

– Porque você está tão suja? – Ele pergunta inocente. – Sua mãe não vai brigar? Minha mãe não gosta quando eu me sujo.

– Eu... Hmm... Eu não tenho mãe. – Respondo, apesar de surpresa com suas perguntas.

– E onde você mora? – Ele questiona.

– Aqui.

– No parque? – Ele pergunta surpreso.

– Na rua.

Eu poderia mentir, poderia somente seguir em frente e não responder, mas essa era a primeira conversa que eu tinha depois de muito tempo. E eu não sabia o quanto sentia falta disso, até agora.

E por mais que eu estivesse conversando com uma criança, era bom o suficiente para mim, pois não havia julgamentos em seus olhos.

– Que maneiro! – Diz animado.

Eu sorrio de sua empolgação. Se ele soubesse.

– Não tão maneiro assim.

– Travor! – Uma mulher grita de longe, e eu suponho que seja a mãe do garoto simpático. – Venha aqui agora!

– Tchau. – Ele diz antes de correr até sua mãe.

Ela o pega pelo braço e o leva para longe, e então eu vejo como outras mães fazem o mesmo, todas elas olhando para mim como se eu fosse algum serial killer ou pedófilo.

Abaixando a cabeça eu volto a caminhar. Eu não as culpo por defender seus filhos, mas isso ainda me machucava. Porra se não machucava.

Eu caminho por quase meia hora até encontrar uma pizzaria de bairro. Do lado outro lado da rua, de frente para a pizzaria, havia alguns becos escuros, e eu me escondo lá para esperar até que ela feche.

Eu tinha aprendido da pior forma que as pessoas não gostam que mecha em seu lixo, mesmo que seja isso, lixo.

Eu realmente não entendia o sentido disso. Você não irá mais utilizá-los, você os descartou, qual o problema disso servir para alguém? De alguém utilizar suas sobras?

Mas por todos esses meses que vivi na rua, eu aprendi sobre o outro lado, sobre o lado que a sociedade fingia não enxergar. Eu percebi então, como as pessoas eram egoístas.

E por esse motivo eu ficaria escondia até todos os funcionários irem embora, e eu pudesse pegar meu jantar do lixo sem problemas.

Problemas era algo que se arrumava nas ruas somente por respirar. E depois de fugir de muitos, agora eu os evitava ao máximo.

Eu era uma mulher, e mesmo suja e maltrapilha, os homens me queriam. Por diversas vezes eu tive sorte, consegui fugir, ou fui amparada por um policial, que em seguida me mandou sumir de sua frente.

Eu gostava de pensar que tinha sorte, que minha mãe olhava por mim lá do céu, e era nisso que eu me agarrava a cada noite que tinha que dormir em becos e ruelas.

Horas se passam até que todos vão embora e meu caminho está livre para que eu possa vasculhar as lixeiras. Eu sabia que conseguiria algumas fatias, pois o último funcionário tinha colocado grandes sacolas de lixo fresco dentro do latão.

Eu corro para a lata de lixo e a vasculho, ficando feliz quando encontro duas fatias não muito tempo depois, devorando-as em duas mordidas. Eu lembro como se fosse hoje, quando finalmente cedi à fome e comi do lixo. Eu não sabia as manhas das ruas, eu não conseguia um lugar no abrigo, então por quase uma semana eu não tinha comido. Isso foi logo que sai do orfanato.

Eu estava muito orgulhosa, e não aceitava que aquela era minha situação atual, minha vida dali em diante. Mas quando a fome apertou e várias se passou sem que eu conseguisse alimento, eu cedi ao lixo.

Percebo que o lugar ao lado da lixeira era um ótimo esconderijo, então eu pego mais algumas fatias que encontro e sento no chão frio, puxando meu cobertor da bolsa, e alguns papelões para aplacar o vento frio.

Eu encosto-me a parede quando como, pensando que estava tudo muito bem para aquela noite, e que amanhã eu chegaria mais cedo à fila do abrigo, mas por hoje eu somente agradeceria por aquelas fatias de pizza.

:)

Insta: autoravictoriatorres.

BLAKE (ÚNICO/DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now