Helena

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         Eu estou olhando para uma postagem no Instagram. Ela sorri na foto, abraçada com outra pessoa. Uma pessoa que não sou eu. Talvez eu tenha deixado minhas expectativas altas demais. É claro que eles iriam voltar. A Letícia só havia ficado comigo por estar se sentindo solitária. Mas ela pode ficar com tantas outras pessoas se era só pra se sentir melhor. Ela sabe que eu gosto dela, sempre soube. 

        Não que eu esteja surpresa. Não tem razão para alguém gostar de mim mesmo. 

       Deixo o celular de lado. Meu gato reclama por não estar recebendo carinho enquanto eu volto a olhar para o meu trabalho de faculdade. Óbvio que eu estava fazendo tudo sozinha. Era pra fazer um roteiro de filme e eu estava praticamente enlouquecendo.

      As palavras se embaralham todas na minha mente e eu bato a cabeça na mesa, considerando uma desistência. Afago as orelhinhas do meu gato, que estava deitado no meu colo. Ele me olha sem entender porque eu já parecia cansada às nove da manhã. Já havia decidido faltar as aulas hoje. Não tenha nenhuma energia para ir até Niterói a noite. Se bem que eu não me lembro da última vez que tive energia para fazer algo é mesmo assim era raro que eu faltasse.

     Minha mãe entra como um furacão no quarto, arrumando as coisas, abrindo as cortinas. Faz tempo que eu não vejo a luz do sol. Ela me olha e coloca as mãos na cintura. Ah, não.

     -Helena, se você não está fazendo nada importante, vem me ajudar a arrumar a casa. Seu irmão está impossível e sua irmã não larga aquela droga daquele namorado.-ela diz, batendo com a vassoura no chão.

     -Eu não sei o que escrever nesse roteiro.-eu digo olhando para ela, totalmente desanimada.

     -Quem sabe você encontra alguma coisa enquanto me ajuda? Deixa sua mente espairecer um pouco, meu amor.-ela diz, com um suspiro. 

     Tento não demonstrar a minha má vontade enquanto levanto. Somos nós quatro, apenas. Meus pais são separados e eu prefiro assim. Quando estavam juntos era insuportável ficar em casa. Minha irmã não gosta de estudar e vive com seu namorado pra lá e pra cá. Meu irmão mais novo tem traços de autismo e hiperatividade e tem apenas cinco anos.

     Eu sento com Gustavo na sala. Ele está vendo um desenho qualquer. Nós ficamos assistindo à televisão e ele não para pular no sofá. Nem me dou o trabalho de pedir para que ele pare, só impeço que ele caia e bata a cabeça. 

     Alguém me manda mensagem. É Letícia. 

    "Já terminou o trabalho?"

    Ah. Nossa. Agora faz sentido ela ter ficado comigo. Eu odeio seres humanos. 

    Eu escrevo que não e ela me pergunta o porquê. Eu pergunto porque ela não podia me ajudar. Ela diz que está ocupada ajudando uma amiga que tem transtorno alimenta a ir ao médico. 

      Será que ela não lembra que eu a sigo nas redes sociais e posso ver as fotos dela na praia há dois minutos atrás? Eu pareço tão idiota assim?

     "Tá bom, Letícia. Eu vou terminar e depois a gente se fala." Eu escrevo. Eu me odeio também. 

     Meu irmão havia se acalmado um pouco. Aproveito para voltar para o meu quarto e escrever aquele roteiro. Eu odeio cada palavra, está péssimo. É um romance histórico. Ideia de uma integrante do meu grupo que está fora do país há um mês. Eu nem me acho boa escrevendo. Não sei porque eu achei que seria uma boa ideia virar cineasta, eu não sou boa em nada disso. 

     Na hora do almoço, minha mãe me pergunta porque eu estou fazendo o trabalho todo sozinha. Eu dou de ombros, não querendo admitir que não tenha coragem de dizer não.

A Mulher PerfeitaWhere stories live. Discover now