Como uma Teia

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Uma pessoa morta não era nada tão assustador. Estranho, que minha reação foi espontânea, inesperada. Digo isso, pois eu já havia visto alguns corpos. O meu pai foi o pior, claro, mas não só por ser meu pai e sim pelo como ele ficou. Você deve estar pensando: uma criança viu o corpo do pai? Coisa horrível! Mas eu vi, porque escapei dos braços do bombeiro e corri para ver. Até hoje eu me arrependo. Era quase irreconhecível. Não gosto de me lembrar. Mas aquela menina, era certamente uma aluna. Os cortes iam dos pulsos até a altura do cotovelo e no pescoço o corte era ainda mais profundo, dava uma meia volta na parte da frente. Na sala, alguns armários velhos, instrumentos musicais ou parte deles, caídos empoeirados. Ao lado do corpo um estilete ensanguentado.

Eu olhei por alguns instantes até me dar conta do que devia fazer, me acalmar e descer para chamar o diretor da escola. As mãos trêmulas e o nervosismo em alta, eram reflexos do que se passava na minha mente. "Eu acabei de chegar", "é meu primeiro dia", "eu não devia ter subido aqui". Eu estava com muito medo, não mais dos fantasmas, mas da possibilidade de ser demitido, ou talvez até responsabilizado. Realmente só havia chegado há pouco mais de um dia e já sou testemunha disso.

Ao avisar ao senhor Hausen, ele foi desesperado, pediu que eu ficasse em sua sala, dizendo que ele resolveria aquilo. Obedeci a ordem, esperei quase uma hora ali, inquieto. Diversas vezes tive vontade de sair dali e ir ver o que eu estava acontecendo, pareceu não ter muito alarde.

Quando ele voltou, pareceu mais calmo, sentou-se em sua cadeira, coçou a cabeça. Merda! Pareceu mesmo que eu estava encrencado.

— Clássico caso de suicídio. — disse ele, parecendo estar exausto, chateado. — Porém, já comunicamos à polícia, à família e agora, devemos esperar. — Eu fiquei em silêncio, apesar de achar estranho, parecia que ele já estava acostumado a ver casos de suicídio. — Não é a primeira vez que ouço falar disso, mas em nossa escola... Estou exausto. — Disse ele, debruçando-se sobre a mesa. O senhor Hausen tinha o corpo clássico de um homem com sua idade, ele beirava os sessenta anos. Sua barba perfeitamente uniforme e sutilmente grisalha — como que se estivesse pintado há um tempo — chegava à altura do tórax, porém o que tinha de barba lhe faltava de cabelo, sua careca chegava a brilhar. (Sei, comentar isso nesse parágrafo parece inadequado, voltemos.)

— O que... O que acontece agora? — perguntei.

— Esperarei a polícia chegar, enquanto isso, peço que aguarde aqui. — Disse ele, outra vez, se levantando e encaminhando-se até a porta.

— Sr. Hausen, eu poderia ao menos lavar as mãos? — perguntei mostrando a mão ensanguentada. Ele consentiu, sacudindo a cabeça e saindo da sala.

Ao entrar no banheiro, senti o peso de tudo aquilo cair nas minhas costas. Não sei o porquê, mas eu pensava que poderia ser demitido, por burlar a regra e subir sem autorização, ou talvez poderiam me responsabilizar de alguma forma, eu estava em choque também, era nítido.

— Ei! — Chegava empurrando a porta a srta. Hausen. — O que aconteceu? Por que meu pai está tão tenso e tem polícia na escola?

— Eu... Eu não sei bem o que está acontecendo... — eu tentei começar a explicar.

— E por que eles estão indo para o sétimo andar? Eu tenho certeza que você sabe. — ela começou a se alterar e se aproximar de mim.

— Você sabe que esse é o banheiro para homens? — perguntei.

— Você está de brincadeira. — ela bateu na pia.

— Encontrei um corpo. De uma garota, ao que tudo indica, uma aluna. Assim que você saiu. — confessei, olhando para o espelho.

O Fantasma da NorthighOnde histórias criam vida. Descubra agora