Furto De Uso

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Era fim de tarde em Washington, nos EUA, e meu avô cortava a lenha no quintal, pois nos próximos dias havia uma promessa de que seriam tão gélidos e tempestuosos que muitos ficariam incapacitados de sair de suas casas. Aquele período meus avós, pais de meu pai, estavam passando conosco, pois a vovó Dália havia acabado de sofrer um AVC e perdido parte de seus movimentos. Ela estava em sua cadeira de rodas, observando o vovô, que lentamente cortava aqueles pedaços de madeira. Eu tinha apenas 4 anos e corri até lá para vê-los.

— Vovô! Vovô! — eu descia correndo e gritando pelas escadas da porta dos fundos. — Eu cresci mais dois centímetros, o papai mediu.

— Ora essa! Em breve se tornará um rapagão alto e bonito. — disse ele, largando o machado e me pegando no colo.

— E forte, vovô! — gritei, fazendo-o rir, possivelmente pela última vez.

Então, eu vi um grande cachorro preto, ele estava sentado ao lado da vovó Dália. O jeito que ele olhava era assustador, por isso, eu com medo, gritei, me soltando do colo do meu avô, depois corri para dentro da casa. No mesmo instante lá estava minha avó caindo e se contorcendo no chão, meu avô desesperado, começou a gritar e chamar por meu pai. Então, você já deve imaginar o que aconteceu.

Aquela foi a primeira vez que eu vi algo parecido.

Também não sei porque uma memória de tantos anos atrás veio a minha mente, mas o fato de eu sempre fugir, sempre correr era repetitivo. Quando se acontecia, o final era o mesmo. Porém, com Chelsea eu não fugi, eu também não iria fugir e deixar Tyler ali, entregue a morte. Eu não queria ter essas experiências, eu não queria ver, ser avisado ou nada disso. Mas se eu fui uma espécie de escolhido para essa dura missão, cabe a mim proteger quem eu puder. Eu não vou mais fugir.

Sei lá se aquela imagem havia sido apenas da minha mente, pois depois de ouvir que eu posso ter piorado tudo, às vezes minha mente estava tentando me pregar uma peça. De qualquer forma, eu fiquei e protegi o aluno, como um bom professor. Ivena chegou e com ela trouxe duas enfermeiras com uma cadeira de rodas. Wendy também voltou. Mais uma vez, lá estava eu, com um aluno à beira da morte. "Vai embora, David! Vai embora antes que piore mais." Eu pensei, entretanto, eu não podia, de maneira nenhuma. Minha presença era uma ameaça, mas minha coragem ao encarar o medo, podia ser a proteção.

— O que aconteceu? — perguntou Ivena, a essa altura o menino já estava voltando ao bom estado, o lobo havia sumido e eu estava sem muita reação. — Senhor Goldberg? — gritou ela.

— Eu vi que o Tyler não estava bem, entrei com ele aqui e chamei o professor Goldberg. — disse Wendy, que estava com a cabeça no lugar.

— Você ou o professor Goldberg são enfermeiros por acaso? — indagou Ivena, um tanto revoltada, enquanto as enfermeiras ajudavam Tyler a sentar na cadeira de rodas. — O procedimento é básico, leve quem estiver mal à enfermaria. Não é possível! — dizia ela levando a mão ao rosto e sacudindo em negação, as enfermeiras levavam Tyler. Eu não sei o que estava acontecendo comigo, mas pouco eu me mexia.

— Sinto muito, professora Hausen. — disse Wendy. Ivena olhou para mim e esperou uma reação. Porém, minha mente estava em choque, todas as imagens que eu vi, as piores, voltavam desordenadamente.

— David? — Ivena me chamava, então olhei para ela, com uma lágrima descendo pelo rosto. — Você está bem? — Wendy me olhava, como que me cobrando uma reação discreta.

— Você me chamou de David? — perguntei, dando um meio sorriso e estendendo a mão para que ela me ajudasse a levantar.

— Ora, mas esse é o seu nome, ou não? — disse ela, me ajudando a levantar.

O Fantasma da NorthighOnde histórias criam vida. Descubra agora