Amy Winehouse, desenhos e esquisitices (@sonhos_da_narniana)

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Conforme os gritos intensificam, eu aumento o volume dos fones; mas nem mesmo Amy Winehouse é capaz de abafar a discussão dos meus pais. Pego minha mochila e praticamente voo do nosso apartamento. Por sorte, o elevador está vazio; não preciso encarar a pena dos fofoqueiros de plantão. Pego o caminho mais longo para o ponto de ônibus, pulo alguns pontos e ando quase um quilômetro apenas para não ter que ouvir Isabela falar sobre como o relacionamento dos meus pais está a um triz do fracasso completo e absoluto. Não preciso dos discursos dela. Eu moro na mesma casa que eles e vou me sentir aliviada quando finalmente decidirem que realmente não dá para continuarem e cada um seguir com a própria vida. Refletindo sobre o péssimo casamento dos meus pais é quando eu o vejo e perco o fôlego. Rael com certeza diria que é apenas mais um menino da escola, mas não, esse é diferente. Ele tem uma áurea enigmática, e por meio segundo penso que está sorrindo para mim. Então vejo a garota loira parando ao meu lado, fico ainda mais impressionada. Nunca achei que alguém pudesse ser bonita sem maquiagem às seis e meia da manhã.

Eu só percebo que estou a encarando quando ele olha diretamente para mim e franze o cenho, e então a coisa mais bizarra do mundo acontece, o moreno com cara de sem vergonha (leia sou gostoso e sei disso) desaparece como fumaça bem na frente dos meus olhos e mais ninguém parece notar, nem mesmo a loira com ares de poucos amigos, que fica ainda mais carrancuda quando ainda procurando o moreno — que pode ou não ter sido fruto da minha imaginação fértil — tropeço na bizarra bota dela.

— Desculpa — murmuro levantando o queixo para encará-la nos olhos muito azuis.

— Não foi nada — resmunga de volta apertando o caderno amarelo que folheava, por precaução deu um passo para o lado, ou apenas para tirar o caderno da minha vista, porque os desenhos impressionantes gritaram aos meus olhos castanhos e curiosos.

— Caramba! Você desenha muito bem! — falo tirando um dos fones do ouvido. — Faz aula há quanto tempo?

— Eu não faço aula — diz baixinho. Pergunto-me se ela tem medo de abrir a boca, porque se não fosse meus ouvidos aguçados nunca teria ouvido a sua resposta sussurrada, que me impressionou muito mais que a falta de maquiagem. Nem mesmo um batom rosinha ela passou nos lábios pálidos.

— Uau. Inacreditável! — exclamo muito perplexa, o pouco que pude ver do rosto do homem que ela desenhou era impressionante e parecia traço de profissional. — Isso sim é um verdadeiro talento! Eu também faço uns rabiscos, mas nada como isso — conto tentando não voltar a encarar seu coturno, mas meus olhos brigam para me trair.

— Legal.

— Eu sou a Marcela.

— Legal...

— Que nome mais bizarro. Legal. Superou até mesmo Tasmânia, sim tem uma Tasmânia na minha classe — ela fechou o caderno e me encarou. Pronto, Marcela, é por isso que você não tem amigos. Você não tem timing, porque claramente essa menina não está para papo. Grita meu inconsciente, e pelo expressão aborrecida dela ele está certo. Aperto nervosamente as alças da minha mochila e suspiro pronta para pedir desculpa, mas ela é mais rápida que eu.

— Ana. Ana Santos — sussurra.

— Uau. Seus pais foram muito criativos, nunca vi um nome tão criativo — brinco, imediatamente brigando com minha boca grande que parece funcionar antes do meu cérebro. Ela franze o cenho, eu até penso em dizer que é brincadeira, mas antes que eu possa abrir a boca novamente, noto o quase imperceptível sorriso no cantinho dos seus lábios bem desenhados. Loira, olhos azuis e tem bocão, esse mundo é mesmo injusto.

— Você não imagina o quanto — suspira abrindo o caderno de novo, olha a página que faz questão de me esconder e me encara e repete o movimento logo em seguida. — Você estava no cinema semana passada?

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⏰ Last updated: Apr 17, 2019 ⏰

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