Capítulo 2 - A justiça da rainha

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Era a primeira vez que Jon colocava os pés na Capital, e nas muitas vezes em que imaginara esse momento, nenhuma delas havia sido nessas circunstâncias - com um exército atrás de si e um dragão no céu que destruía tudo à sua frente. Não, Jon imaginara o dia em que viria encontrar com sua família, o dia em que o seu pai o receberia e o sentaria à mesa ao seu lado, como um verdadeiro Stark. Não passava de um sonho, é claro. A honra e os costumes impediam que bastardos sentassem à mesa com Senhores. Mas Jon não era mais um bastardo, ou era? A razão lhe dizia que sim, mas Bran e Sam lhe diziam que não.

Ele era Aegon Targaryen, filho de Rhaegar Targaryen e Lyanna Stark, herdeiro do Trono de Ferro. Mas ele também era Jon Snow, filho bastardo de Eddard Stark. Jon já não sabia mais quem ele era - e a visão da Fortaleza Vermelha, encoberta pelas cinzas e parcialmente destruída pelo fogo de dragão, apenas contribuía ainda mais para a confusão mental em que se encontrava.

Ao seu lado, Sor Davos caminhava em silêncio, observando o cenário da batalha e a Fortaleza que se agigantava sobre eles. Eles pararam ao avistarem um grupo de soldados Imaculados, cercando meia dúzia de soldados Lannister - ajoelhados, rendidos, e desarmados. Enfileiraram-se detrás dos homens vencidos, lanças em mão e guardando cada um dos soldados. Verme Cinzento liderava o grupo, e estava parado diante dos soldados com a espada em mãos.

- Em nome da legítima rainha dos Sete Reinos, Daenerys Targaryen, eu os sentencio à morte. - Falou Verme Cinzento, proclamando a condenação.

- Verme Cinzento! - Jon chamou o Imaculado, atraindo a atenção para si. Caminhou até ele, seguido de perto por Sor Davos e os homens do Norte, e passando pelos soldados Lannister que, apesar de vencidos, ergueram a cabeça ao ouvirem alguém interromper a execução. - Está acabado. Estes homens são prisioneiros, e devem ser levados à rainha.

- Não está acabado até que todos os inimigos da rainha estejam derrotados. - Falou ele.

- O quão mais derrotados você quer que eles estejam? - Sor Davos intercedeu. - Eles estão de joelhos, rendidos, e sem qualquer chance de defesa.

- Eles ainda estão respirando.

- Olhe à sua volta, Verme Cinzento. - Davos insistiu, determinado a impedir que o Imaculado levasse a cabo o que pretendia. - Nós vencemos.

- Eu obedeço as ordens da minha rainha, não as suas. - Falou Verme Cinzento.

- E quais são as ordens da rainha? - Perguntou Jon, embora já soubesse da resposta que viria.

- Mate todos aqueles que são leais à Cersei Lannister. - Disse. - Estes são todos homens livres, e que escolheram lutar pela rainha Lannister. Devem ser responsabilizados por seus atos. Devem pagar com suas vidas.

Verme Cinzento desembainhou uma adaga que estava presa na lateral do peitoral, e Jon imediatamente estendeu a mão para impedi-lo. Segurou seu braço antes que o primeiro golpe pudesse ser desenhado, e no mesmo instante as lanças dos Imaculados desceram, mirando em Jon em uma clara ameaça. Não seja tolo, Jon, ele disse para si mesmo, ciente de que estava cometendo um erro. Os homens do norte desembainharam suas espadas, prontos para defender Jon.

- Baixem as espadas. - Ordenou Sor Davos. - Jon.

Jon ainda segurava o braço de Verme Cinzento, encarando o Imaculado. O rosto do soldado estava distorcido pela surpresa e pela raiva ao se ver desafiado, salpicos de sangue seco espalhados por sua pele e misturados à fuligem. Ele não era um guerreiro qualquer - desafiá-lo poderia significar a sua morte. Mas Jon não poderia permitir que os soldados Lannister fossem abatidos como cordeiros.

- Nós deveríamos ir encontrar a rainha. - Sor Davos falou mais vez, tentando dirimir o conflito.

Ele franziu as sobrancelhas, travando uma batalha interna sobre qual seria o seu próximo passo. Se mantivesse o desafio à Verme Cinzento, uma luta seria necessária para colocar um ponto final - e ele não queria lutar contra alguém que pertencia ao seu lado. Não quando tudo já estava frágil demais. Jon soltou o braço do Imaculado, recuando para perto de Sor Davos.

Bastou lhe dar as costas para ouvir o terrível som da lâmina encontrando pele, cortando através dos músculos e dilacerando a garganta dos soldados. O sangue gorgolejou pelo corte, e um a um os últimos homens que lutavam em nome da antiga rainha dos Sete Reinos morreram engasgados em seu próprio sangue. Uma execução rápida e sem piedade, muito mais do que os inimigos de Daenerys Targaryen mereciam.

- Isto não está certo. - Disse Jon à Davos, após ouvir o som do último corpo sem vida tombar no chão. - Eles estavam vencidos, e não ofereciam qualquer ameaça. Se começarmos a executar todo os homens que um dia lutaram em nome de outro rei, não sobrará viva alma nos Sete Reinos. Nem mesmo nós seríamos poupados.

Ele, que fora nomeado Rei do Norte e que lutara na Batalha dos Bastardos, havia jurado sua lealdade à bandeira de Winterfell - que buscava se tornar independente do reino de Westeros -, gesto que era considerado uma traição à Coroa. Sor Davos também havia cometido sua cota de traições ao longo da vida, e um dia havia sido juramentado à Stannis Baratheon. As antigas alianças e lideranças dos Sete Reinos não poderiam ser tão facilmente apagadas, ainda que o sopro de fogo de um dragão fosse capaz de destruir os alicerces de Westeros.

- Esta é a vitória que a rainha prometeu ao seu exército. - Falou Davos, enquanto caminhavam pelas ruas de Porto Real, desviando-se de escombros e ruínas que bloqueavam parte das vias. - Uma vitória que custou muito à ela. Os Imaculados estão se certificando de que nada será capaz de ameaçar o novo reinado de sua rainha.

Sim, a sua rainha também havia perdido muito no longo caminho que traçara até Porto Real. As mortes que estavam sobre suas costas pesavam; e Jon não tinha dúvidas de que ela era assombrada pelos rostos de Missandei e Sor Jorah, aqueles em que mais confiava e que estiveram ao seu lado desde o início de sua conquista. A perda de seus filhos, Viserion e Rhaegal, haviam sido dolorosas demais para serem suportadas. Era sensato que ela lidasse com as ameaças da forma mais eficiente possível. Mas não era exatamente o que Jon esperava de sua rainha.

- A justiça pode ser feita por outros meios. - Retrucou ele.

- Não quando o controle ainda não é estável. - Argumentou Davos. - O poder de Daenerys sobre o reino ainda é frágil demais. Quando as notícias sobre a queda de Porto Real se espalharem pelo restante do reino... Não será fácil manter a ordem, Jon. A destruição que aqui ocorreu não será bem recebida pelos Lordes, e Daenerys precisará ser ágil e firme para assegurar o seu reinado.

Jon assentiu, permanecendo em silêncio.

- Eu sei que você não está satisfeito...

- Não importa o que eu penso. - Jon o interrompeu, impedindo que o assunto evoluísse. Quem ouvisse aquela conversa poderia facilmente acreditar que Jon estava conspirando contra a rainha. - Ou o que eu faria. Daenerys é a rainha, e nós devemos cumprir a sua vontade.

O Dragão e o LoboWhere stories live. Discover now