Dias nublados lembram você

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Do seu corpo miúdo deitado em minha cama, ocupando um espaço tão pequeno quanto à sua — a nossa — existência insignificante em meio a vastidão do universo. Do ar gélido e agressivo se chocando na janela pelo lado de fora do quarto, enquanto nós, protegidos pelo calor de nossos corpos nus, nos completávamos debaixo dos finos lençóis negros, — aqueles que você cismava em querer levar para casa, pois preto sempre fora sua cor favorita. A chuva amena caindo silenciosa me lembra o quão sútil você conseguia ser; ao choro da rosa magoada, após outro surto do cravo, que com o corpo doído implorava em vão pela tão destemida e desejada morte.

Oh! Tobio... não há um dia ensolarado que não me lembre seus olhos, que embora estes fossem mais escuros, eram tão frios quanto os anéis de Saturno. Me pergunto, quem sabe, se você é mais feliz agora. Que hipocrisia a minha! Eu que sempre tão cético, em um momento efêmero de desespero me flagro agarrado, quase virando um só, com crenças e superstições tão patéticas que me causam náuseas agudas na boca do estômago só de pensar nelas.

Tal vazio é tão grande, que prefiro pensar que você está em alguma outra galáxia sendo preenchido por corpos — tão brilhantes quanto o seu sorriso gozado de prazer —, rindo e pensando no quão ridículo eu me encontro agora.

Mas o que eu posso fazer, se tudo lembra você? Me dê uma luz, me liberte, em nome dos velhos tempos. Afinal, você ficou me devendo uma depois de eu ter lhe deixado em frente a sua porta. Porventura, não sou capaz de julgar, mas, talvez, meu erro foi pensar que aguardar você fechá-la em segurança, não passava de um ato bobo. Um ato criado pela sociedade alienada a necessidade fútil de demonstrar tudo, e a todo momento, carinho à pessoa amada.

Deixe-me te levar em casa novamente, com direito à despedida acompanhada de um beijo quente em meio à madrugada fria. Me leve até ti e diga mais uma vez que me ama. Apague minha luz e escureça meus dias, pois eu não aguento mais a lembrança do que um dia fomos, muito menos o desejo daquilo que nunca iremos ser. Entenda que não são simples martírios, e nem um pedido de socorro, talvez um arrependimento com gosto de café frio e amargo — que fora esquecido por você enquanto me esperava chegar horas mais tarde do combinado.

Lembro-me que naquela noite eu vi um cachorro uivando em dores, hoje penso se era um Sinistro me alertando que meus dias logo perderiam as cores. Nunca fui de lidar com as coisas, pouco me importava com isso, mas acabei percebendo que cinza é a cor mais fria que existe e que, talvez, só não mais fria que o azul do céu veraneio. E ambas lembram você; dos seus olhos opacos e de seu corpo frio, pálido e sem vida.

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⏰ Última atualização: Jun 29, 2019 ⏰

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