Observo o dia amanhecendo em um silêncio ilusório pela janela de vidro sujo, do canto do bar onde me encontro quase caindo do banquinho em que estou sentada com meu copo de uísque vazio em minhas mãos - não minhas - frias.
Meu olhar embaçado e deprimente não é o único. Três ou quatro mais pessoas infelizes se encontram naquele lugar de merda em seus próprios mundos alcoolizados.
É frustrante perceber que você é vazio como todas as outras pessoas vazias. Te dá uma sensação de que tudo o que você já fez até agora não valeu de nada. Insignificante. Vão. Que na verdade, não foi tanto assim. E que tudo aquilo te trouxera pra este exato momento e lugar e sentidos arrebatadores.
Meu irmão estava certo.
Eu sempre fui de lutar por nada.
Uma guerreira impostora. Charlatã.
- De merda.
Viro o rosto para o copo entre meus dedos - não meus - ao ver o barman me olhar com uma cara de quem compreende alguém que bebeu mais bebidas que é certo contar, ou dizer em voz alta conversar sozinha.
Não tente me entender quando nem eu mesma me entendo, otário.
Com as mãos - não minhas - trêmulas enfio-as no bolso de trás da saia e pego todo o dinheiro que tenho, que não é muito, e jogo em cima do balcão sujo cheio de marcas de dedos gordurosos e bebidas derramadas de um local e vidas frustradas e vou embora de todo àquele ar sufocante.
Quando fecho a porta da taberna às minhas costas e sinto o ar fresco e desanuviado da madrugada, um contraste ao cheiro de mofo, suor, cigarro e decadência de antes, enfim volto a respirar direito.
Quase como se abrindo aquela porta e entrando e saindo daquele lugar, nos dois momentos, eu me transformasse em outro ser.
Talvez tudo o que me restara: uma máscara anestesiada e uma mancha exposta ao horizonte.
Tenho que procurar lugares melhores para me aliviar.
Mas a vontade de fugir e esquecer tudo me fez entrar na primeira porta de bar de beco próxima.
Uma coisa boa, se é que seja, um alívio talvez, é que não sou a única a perambular por estes becos úmidos e sombrios sobre peitos desgarrados, mal compreendidos, dores que nunca puderam desfazer e que jazem sob vícios, salvação, êxtase, qualquer porcaria, nadas.
Um mundo de invisíveis. Inexistentes. Escórias.
O salto de minhas botas, minha respiração, as gotas de poças de água esquecidas da chuva já derramada, permanentes, passageiras caindo lentamente dos canos, o som inconstante de carros velozes em ruas afastadas, a música inexistente em minha cabeça, nas casas, as risadas despertando para um novo dia, ou de quem ainda nem conseguira repousar: uma madrugada típica, plena. Manhãs vazias, frias, tempestuosas.
Não está claro ainda, algumas sombras permanecem, mas já sinto o familiar cheiro de café e pães sendo assados prontos para serem servidos aos trabalhadores matutinos e sorrio um pouco.
Eu amo café.
Sim, mais um vício.
Sinto um arrepio enquanto caminho pelas calçadas congeladas e escorregadias. Minhas roupas finas completamente inadequadas após noites e noites de chuvas. Porém, sem aumentar um passo sequer, apenas o lento pé ante pé um na frente do outro. Apenas, aproveitando tudo o que o amanhecer ainda dormente pode me dar, sem desviar de seus pontos negativos.
Até lugar nenhum.
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M U S A
PoetryÓ brilho que repousa em meu sorriso Que a brisa mansa canta Voe para bem longe de mim E traga novas esperanças Ó querido!, hoje você saira e brilhará Sera àquele que espero sob sols e dias frios - sempre à tua espera - Lembre-se de mim Porque as v...