Capítulo 1

56 2 1
                                    

                              ⚠️
    Algumas partes ainda precisam ser revisadas , estaremos resolvendo esse problema o mais rápido possível .
                       Desde já grata , autora
                                  ⚠️

O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer.

Albert Einstein



    Meu apartamento é meu refúgio, minha zona segura. Poderia passar o dia todo sem perceber o mundo caótico que existe lá fora. É o meu lugar favorito no mundo, pois reflete muito quem eu sou, adoro reutilizar e restaurar objetos para dar vida ao lugar e deixar tudo do meu jeitinho.
E é o que faço nesse exato momento, estou pintando latas com tinta spray para colocar no teto e fazer uma espécie de lustre. Vou pinta-las em três cores: azul, roxo e verde. Sempre algo diferente e colorido, sempre buscando coisas esquecidas e estranhas para dar vida.
Infelizmente não moro em um apartamento sossegado, ele é pequeno com um quarto, banheiro, cozinha e sala, e as paredes são terrivelmente finas, então tudo o que os vizinhos fazem eu consigo escutar de qualquer cômodo. Como o Willy meu vizinho da direita, que insiste em assistir suas corridas de carro no último volume; o da esquerda que toda semana está transando com uma garota diferente - e faz questão de gritar o nome dela bem alto para todos saberem; e a minha vizinha da frente, a adorável Amber, cantando alguma música do Bruno Mars extremamente desafinada.
Enquanto espero as tintas secarem vou adiantado a janta, que é uma pizza requentada - um belo de um jantar, não? Por um momento raro, o lugar está em silêncio, mas ele é logo quebrado com a chegada de Vivian, mãe de Amber. Como eu sei que é ela? Simples, ela tem uma voz única de taquara rachada. Mas, pelo jeito, algo está errado, parece que ela está discutindo com alguém.
Não consigo resistir e corro até a porta para olhar pelo olho mágico - não sou uma fofoqueira por isso, né? A culpa não é minha que as paredes são tão finas. Logo vejo que pobre pessoa que está ouvindo ela gritar é Amber.
— Você é imprestável garota, eu chego do trabalho e você até agora não fez nada para comer!
— Você que deveria fazer isso! A adulta aqui é você! - disse Amber apontando o indicador para ela.
Isso não era tão verdade, Vivian não chegava nem de perto de ser uma adulta, já que deixava Amber em casa, uma menina de 11 anos, para fazer tudo sozinha.
— Saia da minha frente sua imprestável, agora vou ter que ir no Pub da esquina com as meninas para comer e beber algo, quando eu voltar quero a casa toda arrumada!
— E o que eu vou comer? - Era nítido decepção nos olhos dela.
Amber é bem miúda para sua idade mas já tinha força e ousadia. Sempre que esbarrava com ela nos corredores conversávamos bastante. Ela era uma criança que, para sobreviver, já tinha que pensar como adulta, isso fazia eu lembrar de mim mesma quando tive que sobreviver por anos em um orfanato.
Vivian agarrou Amber pelo braço direito e a empurrou para dentro do apartamento, fechando a porta com força enquanto a discussão continuava, agora lá dentro. Algo naquele gesto bruto mexeu comigo, fez alguma coisa que estava adormecido despertar. Algo que eu temia e escondia de mim mesma: uma escuridão, uma raiva, uma fúria arraigada em minha alma. Isso sussurrava para mim, pedindo para se libertar.
Sentia minha cabeça latejar, as pontas dos meu dedos formigarem. Fechei os olhos com força, bloqueando a imagem de uma menina indefesa e sua mãe idiota e irresponsável e contei até dez repetidas vezes, até minha respiração normalizar e o que quer que havia em mim voltar a ser trancafiado nas profundezas de onde morava.
Fiquei um bom tempo pensando nisso e sei que não deveria me meter. Não era problema meu. Mas depois de um tempo me revirando no sofá aquilo falou mais alto. Sai do meu apartamento e bati na porta de Amber, não podia deixar uma garotinha com fome.
Ela abriu a porta furiosa, com certeza esperava que fosse a mãe, mas depois de perceber seu erro, seu olhar se suavizou, ficando gentil e triste.
— Ah... Oi. Minha mãe não está em casa - ela já ia fechando a porta sem me dar a chance de falar.
— Não, espera! Eu não vim falar com sua mãe. Seu nome é Amber, né? - ela confirmou com um aceno sútil de cabeça - Então, eu tenho um problema. Tem muita pizza requentada, de ontem, só para mim. Topa ir lá em casa comer comigo?
— Sirena, certo? - confirmo com um aceno e abro um sorriso convidativo para ajudar a convencê-la a vim.
Nem precisei insistir muito, Amber já estava na minha porta esperando eu entrar. Quando entramos vi seus olhinhos curiosos percorrer minha pequena sala que continha um sofá amarelo sol - como gosto de chamar - que fica de frente para uma tevê de tamanho médio, em cada lado dela tem uma estante, o coração da casa, a minha parte favorita. A estante da direita era dedicada aos livros de terror, suspense e Thriller, variando de King à Tudor; na da esquerda passa por maravilhosos exemplares da Sarah J. Maas, chegando na coleção de Julia Quinn e variados livros de romance. Em volta dessas estantes coloquei pisca-piscas brancos, e, espalhado pela sala, tem algumas coisas que restaurei, como a máquina de escrever velha - que agora está toda pintada de vermelho.
Em um canto fica uma planta que, com dificuldade, ainda sobrevive. Próximo a estante da esquerda fica a mesa de jantar/trabalho, onde, atualmente, está cheia de livros e folhas. A sala fica de frente pra cozinha que tem armários em tom de azul bebê, onde se encontra uma pequena ilha no meio com a pizza em cima nos aguardando.
— Seu apartamento é igual a Você. - Me espantei com seu comentário, foi uma observação curiosa de se fazer. Não que eu tenha me ofendido, pelo contrário, amo cada pedacinho desse lugar e é o melhor elogio que eu poderia receber.
— Por que acha isso?
— Ele é diferente... um diferente bom. Igual a você, diferente e bonito.
Eu não me considero uma beldade, tenho um corpo médio, nada de mais e nem de menos. Meu cabelo é curto e preto, estilo long bob, que não passam muito dos ombros. Tenho um pouco de sardas nas bochechas que não são muito forte, só dá para enxergar se repararem bem. Os meus olhos são os que mais chamam a atenção em mim, alguns amam e outros se assustam, eu tenho heterocromia, o direito é azul e o esquerdo é verde. Já sofri muito por ter essa anomalidade, muitas pessoas me atacavam por isso, me odiava por tê-los, mas agora temos uma relação de paz e tranquilidade.
— A pizza está na bancada, pode ficar a vontade enquanto arrumo a mesa de jantar.
Ela me seguia pela casa e ficou ao meu lado calada enquanto eu arrumava meu pequeno caos de papéis e livros.
— Porque tem tantos livros?
— Os da estante são por que gosto de ler, já esses são para estudo. Estou tentando entrar para a polícia.
— Quer fazer o que na polícia?
— Perita criminal.
— Vai investigar gente morta? - ela me olhou incrédula.
— Tipo isso nina .
- Meio mórbido, mas legal.
Ela passou pro outro lado da mesa me ajudando a colocar os livros em um canto qualquer. De vez em quando ela arriscava ler um título de algum livro e fazia careta, enquanto eu tentava controlar a risada. Fui para a cozinha pegar a pizza e voltei com os pedaços - ainda quentes - e uma coca-cola. Sentamos uma de frente para a outra e enquanto ela mordiscava pedaços ia fazendo mais perguntas, acho que nunca fui indagada como hoje.
— Mora sozinha?
— Sim
— Porque?
— Não tenho uma família, fui criada no Orfanato da Misericórdia a única coisa que eu sei sobre minha mãe verdadeira era que ela era espanhola aprendi a falar no orfanato com ajuda de outras crianças e eu nunca fui adotada, então quando completei 18 anos sai de lá.
— Ah... - percebi, por um momento, que ela sentiu pena de mim, não gostei disso - tem amigos?
Não classificaria Lucy como minha amiga, assim que me mudei fiz amizade com ela - que mora no prédio ao lado - mas depois de dois messes fui deixada de lado, trocada pela garçonete da cafeteria, a garota mais badalada e atualizada do Instagram.
— Não mas não me incomodo com isso. Eu tenho livros, nunca estou sozinha. - dei um piscadela e ela esboçou um sorriso como se compreendesse e mudou de assunto.
— As tintas em spray é para a decoração de Halloween de amanhã?
— Não, a decoração para amanhã está naquela caixa - apontei para um caixa fechada ao lado do vaso de planta.
— Por que ainda não decorou?
— Não sei - dei de ombros. Um gesto que amo fazer porque sempre resume meu estado de espírito - quer me ajudar?
— Sim! - disse animada - você não gosta do Halloween?
— Gosto, mas... não sei. É meio estranho para mim pois faço aniversário no dia.
— Sério? Que irado, deve ser muito legal.
— É um pouco. - disse indiferente
— Quantos anos vai fazer?
— 19 anos - fiz uma careta - agora chega de me interrogar e coma a pizza.
Depois de comermos a pizza recolhemos a louça e fomos pegar a caixa para decorar a entrada do meu apartamento. Não era grande coisa, algumas aranhas, abóboras, bruxas e um caldeirão. Aproveitamos os que sobraram e colocamos na estante, tudo em um silêncio confortável, com apenas alguns intervalos de cantoria de Amber.
No final já era tarde, então levei Amber até a porta de seu apartamento. Ela me agradeceu com um sorriso enorme estampado em sua face e desejou boa noite. Me senti bem por ter feito ela se sentir bem.
Voltei para o meu apartamento cansada, amanhã seria um grande dia! Iria ao cinema assistir um filme de terror, como manda a tradição de todos os anos do meu aniversário - a vantagem de fazer aniversário no Halloween é que tem sempre filme de terror em cartaz.
Desliguei as luzes do apartamento e logo estava de baixo das cobertas caindo no sono, mas não foi uma noite de sono tranquila, longe disso.

      Desliguei as luzes do apartamento e logo estava de baixo das cobertas caindo no sono, mas não foi uma noite de sono tranquila, longe disso

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Levantei assustada e percebi que estava em um bosque muito escuro. Escutava no fundo um cântico, uma canção entoada que parecia ser de séculos... Algo nela fazia parecer ser um chamado, uma convocação cantada pela floresta a minha volta e por tudo o que ela abrigava lá dentro. O canto ecoava em todos os cantos. Era uma canção etérea, cantado por criaturas delicadas com vozes calmas e líricas, mas ao mesmo tempo, era também um chamado de guerra, com tambores. No início, calmo e delicado, mas conforme os segundos passavam seu chamado ficava mais urgente, mais grave, e eu sentia em mim aquela sensação de me libertar acordando cada vez mais.
Aquilo ronronava e suplicava, - cada vez mais alto - como se me pedisse para aceitar o chamado. Eu resistia, lutava comigo mesma, mas o que quer que havia em mim ficava cada vez mais forte. Coloquei as mãos em meus ouvidos a fim de parar aquele cântico, mas não funcionava e então eu desabei em lágrimas e gritei, um grito que veio do fundo da minha alma, um grito de desespero. Depois de um tempo o cântico ficou inebriante, eu quase não o escutava mas sabia que estava lá, me envolvendo em uma bruma, um topor amortecendo a chegada daquilo que estava em mim. Até que, o que havia em mim e o que eu era, não pode mais ser distinguido por mim mesma.
Eu levantei, contra a minha vontade, como se algo ou alguém estivesse me controlando. Os meus pés automaticamente me levavam para dentro da floresta, ainda mais fundo, onde a lua banhava o solo e espectros de mulheres ancestrais dançavam e cantavam no ritmo da música. Ao sentirem minha presença se curvaram em uma reverência e saíram. No canto da floresta havia um homem me chamando, como se estivesse sussurrando em minha orelha:
Sirena... Sirena... Sirena...
Não dava para enxergar seu rosto, um tipo de luz branca me impedia de vê-lo. Subiu um cheiro de hortelã e ervas, não sabia da onde vinha, mas me passava uma sensação de familiaridade e segurança.
Meus pés me levaram até um lago, ao chegar na margem vi meu reflexo nas águas calmas, meu braço tinha sangue e em minha mão direita havia uma adaga ensangüentada, pequenas gotas também manchavam minha bochecha. Minha imagem foi borrada quando um espectro, diferente dos da floresta, saiu da água, uma mulher de cabelos longos que se arrastavam pela água como um véu. Sua cor era tão pálida que as vezes tinha a sensação de que era transparente. Ela vestia um vestido longo com pequenos detalhes em formato de lua adornando sua longa saia. Seus olhos eram totalmente brancos e não possuíam íris, só o gélido branco de seus olhos, que me causou calafrios pelo corpo todo. Ela levantou seu braço esquelético e apontou, com seu dedo indicador esguio, para a adaga em minha mão trêmula. E sussurrava cada vez mais alto:
Liberte-se... Liberte-se... LIBERTE-SE.

    Acordei assustada e toda suada, olhei para o relógio em minha cabeceira e vi que era meia noite, em ponto

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Acordei assustada e toda suada, olhei para o relógio em minha cabeceira e vi que era meia noite, em ponto.
Feliz aniversário, Sirena.

Soul Hunters Where stories live. Discover now