Capitulo XVI - Sophia

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Mais um dia trancafiada dentro daquele quarto de hospital, olhando para o nada e não dando utilidade nenhuma para os meus dias. 


A cidade lá fora estava em constante movimento durante essas três semanas em que fiquei me recuperando sob os vigilantes olhos das enfermeiras – que agora eram minhas amigas íntimas, porém não imunes ao poder de persuasão de Caíque que as mandava me controlar o tempo todo –, do amor da minha vida – que podia ser bem chato quando queria –, de Catarina, minha melhor amiga insuportavelmente atenta e cuidadosa, de Guilherme – que me rendia boas gargalhadas, mas era só eu rir um pouco mais alto e exigir demais do meu corpo debilitado, que já assumia uma carranca séria e me mandava ficar quieta –, de Josh – meu salvador e único que entendia que eu estava vivendo um regime militar, mas que também não movia um dedo para me ajudar a fugir – e minha mãe, que mandou meu pai para o raio que o parta, dando fim ao seu casamento e vindo cuidar de mim, sua única filha. 


Eu seguia com o olhar as pessoas que andavam pelas ruas atribuladas do Rio de Janeiro, tocando a sua vida em frente, seguindo rumos diferentes todos os dias até chegarem ao seu destino final. Algumas delas eu já reconhecia por sempre tomarem o mesmo caminho, e outras eu ia conhecendo a cada dia que se passava e elas apareciam por todos os lados. 


Minha mente vagou com aquelas imagens, focando em apenas uma à sete dias atrás. 


Minha mãe em um dos seus vestidos marrom longos que mostravam pouco suas curvas bem definidas para uma mulher de quarenta e cinco anos, segurando firmemente sua bolsa preta, grande demais para carregar apenas alguns pertences, caminhando timidamente para a portaria do hospital. Lembro bem como meu coração começou a bater descompassado e minha respiração ficou automaticamente ofegante. As possibilidades de que ela poderia estar ali para me ver, para cuidar de mim e assumir, finalmente, o seu lugar de mãe na minha nova vida esmagavam o meu cérebro e libertavam sentimentos que eu já desconhecia existir dentro de mim. 


Caíque estava ali, sentado na minha cama, lendo alguma coisa no seu iPad e xingando audivelmente quando percebeu que eu estava tendo um ataque: 


- O que foi anjo? – perguntou preocupado, largando tudo que estava segurando na minha cama e correndo até a mim. – Está sentindo alguma dor? 


Eu não conseguia responder, a emoção de minha mãe estar tão perto de mim, apenas alguns andares abaixo estava me tomando com a voracidade de uma tsunami devorando uma cidade. Meu Deus, ela veio por mim? Será?


- Porra Sophia, você está me assustando! – pude sentir as mãos de Caíque coçarem para me chacoalhar até que eu voltasse à mim. – Sophia! 


E então uma batida hesitante ecoou pelo meu quarto e coração. Era ela?


- Entre! – a voz de Caíque foi firme, assim como seus olhos que me analisavam desesperados, procurando uma solução para o meu choque repentino. 


Me senti culpada por estar deixando-o tão preocupado comigo, mas meus olhos não focavam em mais nada além da porta que estava sendo aberta lentamente. Só depois que os cabelos loiros, enrolados em um coque, junto com a mulher que eu mais esperava durante todo esse tempo, apareceram no meu campo de visão, eu pude soltar o ar que estava prendendo desde o momento em que há vi caminhando pela calçada. 

Romeu e JulietaDonde viven las historias. Descúbrelo ahora