Capítulo 7: O Corvo e a Gigante

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Campos de neve branca cobriam a paisagem até onde a vista podia alcançar. Pinheiros, carvalhos e árvores tão antigas quanto o próprio mundo traziam um pouco de cor e vida, servindo como esconderijo para coelhos e aves de penas escuras com olhos observadores.

Havia uma única fera naquelas pastagens. Um verdadeiro monstro, grande como um homem e de pelagem negra como carvão. Essa fera tinha um nome.

Ayla.

Corria com as quatro patas criando um rastro na neve fofa, percorrendo distâncias absurdas em pouquíssimo tempo. Era uma máquina de matar projetada pela mãe natureza, uma caçadora exemplar dotada das mais ferozes presas e das mais afiadas garras.

Era uma loba.

De repente, viu uma mulher diante de si, obrigando-a a parar. Era alta e esbelta, de traços fortes e marcantes. Apesar do rosto borrado por uma forte luz, era possível notar a pele escura e o cabelo afro de grande volume. Usava uma roupa branca como a neve abaixo de seus pés descalços e tinha preso ao pescoço um pingente em forma de meia lua.

A mulher aproximou-se. Ayla sentou, não sabendo como reagir, deixando que ela lhe afagasse o pelo escuro.

–Você é o nosso legado. –Disse a mulher, retirando o pingente de seu pescoço. –Agora, deve cumprir seu destino.

O pingente brilhou com uma luz azulada, trazendo o lobo gigante novamente para a forma de menina. A mulher agora era mais alta do que Ayla e lhe acariciava a face com gentileza e calor.

–Qual é o meu destino? –Perguntou, segurando a mão da estranha mulher. –O que devo fazer?

–Saberá quando a hora chegar, assim como eu também soube. Confie em seu coração e ele lhe dirá para onde seguir. –A mulher beijou-lhe a testa e Ayla foi capaz de notar um sorriso em meio ao rosto inexistente. –Adeus, minha cria. Que os ventos do Norte guiem suas caçadas.

O sonho se desfez em uma explosão de luzes e formas como um arco-íris, devolvendo Ayla ao abraço frio da inconsciência.

* * *

Sentiu cheiro de café e chocolate quente. Ovos e leite. Pessoas conversavam ao seu redor.

–Völva? –Ouviu umas delas perguntar. Parecia já conhecer aquela voz.

–Esse é meu melhor palpite no momento. –Disse uma voz masculina, bebendo algo em seguida e comendo uma fatia de pão torrado. Só agora sentia o aroma da manteiga queimada no ar. –A questão toda é o quanto você possui aptidão para...

–Galera, ela acordou. –Informou uma terceira, parecendo bem próxima à cama onde Ayla estava deitada.

Ouviu o som característico da cadeira de rodas de Violeta, sentindo um alivio ao abrir os olhos e ver que a amiga estava bem. Mas onde estavam? Aquele não parecia ser um dos quartos do Convento de Santa Alice e muito menos um leito de hospital. As memórias então lhe atingiram como um soco no rosto e ela recordou do ataque do demônio.

–Meu Deus, Sandra! –Gritou, ficando sentada na cama. –Precisamos ajudá-la! Ela precisa de um médico antes que...!

Violeta segurou a mão da amiga com as suas, pedindo que se acalmasse. Tinha a expressão triste e segurava algo dentro de si para dizer.

–Ayla, preciso que escute isso com muita atenção. É importante. –Violeta estava mais séria do que de costume, o que fez com que Ayla se acalmasse.

Violeta tratou de lhe contar os acontecimentos. Contou que o demônio que as atacara no Convento era um troll de fogo, parente dos gigantes, enviado por alguém ainda desconhecido com o objetivo de capturá-la por causa de sua linhagem de sangue. Uma linhagem que remetia aos antigos mitos e lendas nórdicas. Era visível o desconforto da amiga ao contar aquilo, mas Ayla sentia verdade nas palavras dela.

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