Quando você voltar • Nosh

Quando a culpa bater

Noah

Deito na cama tentando não pensar no dia exaustivo ou na dor que sinto nas costelas. Se Bailey tiver quebrado alguma delas de novo provavelmente vou ter um problema.

Não consigo acreditar, Josh realmente voltou. Depois de um ano no Canadá, um ano sem dar notícias, sem responder ligações ou mensagens, sem nem avisar se estava vivo. "Melhores amigos para sempre", grande besteira. A pior parte é o pouco de felicidade que sei que estou sentindo. A raiva é bem maior, com certeza, mas não consigo deixar de pensar se ele estar de volta vai pelo menos fazer eu parar de levar porrada todo dia. Josh sempre foi o rei daquele colégio, com o sorriso estupidamente perfeito e o carisma contagiante ele conquistava todo mundo, nós dois conquistávamos, até...

Que ideia estúpida você teve naquele dia, Joshua. Não sei vou te perdoar em algum momento. O pior é saber que foi só comigo, quando na verdade era para você estar tão ferrado quanto eu. Vai ver foi por isso que foi embora, fugiu com medo antes que as coisas complicassem para o seu lado também. Eu não teria contado para eles, não sou um covarde como você.

Josh

Ouço passos pesados e o som do molho de chaves girando na fechadura.

— Josh?! Que surpresa boa!

— Oi, Senhora Soares! A Any está em casa?

— Vou chamar ela, só um momento. E fico feliz que tenha voltado!

Sorrio em resposta, pelo menos alguém está contente em me ver de novo.

— Josh?! Meu deus, você voltou! — Ela pula em cima de mim quase me derrubando em um abraço apertado. Para subitamente. — Você voltou. — Agora sua expressão é seria. — QUAL O SEU PROBLEMA, GAROTO?! Tem noção de como fiquei preocupada?! De como todos nós ficamos?! Se o dono do seu imóvel não tivesse contado pra gente depois de muita insistência estaríamos sem saber nada até agora! O dono do imóvel, Josh!!! Tem noção disso?! Você é muito estúpido! Caralho! Sério, você é realmente um idiota!

— Acabou de me xingar?

— Não!

— Ok, pode terminar então.

Ela me dá o soco mais forte que consegue.

— Pronto, agora acabei.

— Posso entrar?

A casa de Any parece exatamente a mesma, exceto pelo sofá novo.

— É bom você ter vindo para explicar esse sumiço.

— Eu vou explicar, ok? Na hora certa.

— A hora certa já passou há mais de um ano, Josh!

Respiro fundo, não vim para isso, mas já devia esperar essa reação.

— Vou te dar a versão simplificada. É tudo o que posso oferecer.

Ela me olha por uns segundos considerando a oferta.

— Só fala logo.

— Ano passado recebi um convite para uma competição de dança muito importante no Canadá, e meus pais tinham acabado de conseguir uma oferta de emprego, mas teríamos que passar um ano lá. As coisas aqui estavam confusas, por isso achei melhor me desligar.

— Se desligar?! Josh você desapareceu da face da Terra! Nem seu Instagram você usava mais!

— Eu precisava ficar um pouco longe, ok? E eu avisei que ia viajar por um tempo...

— Por um tempo, não por um ano!

— Esquece, eu não devia ter vindo. — Começo a levantar, mas Any me impede.

— Já vi que não veio até aqui me explicar nada, então fala o que você precisa.

Respiro aliviado. É bom ver ela disposta a me ajudar, apesar das minhas idiotices.

— Quero saber o que aconteceu enquanto estive fora e por que o colégio está de ponta cabeça.

— Vou te dar a versão simplificada. É tudo o que posso oferecer. — Fala em tom de deboche.

— Tá.

— Bom, você lembra daquele merda toda com o Noah, né?

Lembro bem até demais.

— Sim.

— Pois é, aquilo deixou o Bailey puto. Enquanto você tava aqui ele não fez nada, mas quando você foi embora... O Bailey transformou a vida do Noah num inferno. No início era brincadeira. O grupo tava meio incomodado, mas até aí era só o Bailey sendo um idiota irritante. O problema foi quando começaram as agressões. Ele surtou, acho que ser o novo "rei do colégio" subiu a cabeça dele, sei lá. Lamar juntou-se a ele e o resto do time de futebol não demorou a aderir.

— E vocês não fizeram nada?!

— Eu já ia chegar nessa parte. O negócio foi o seguinte: a Joalin foi na onda do namorado e parecia nem notar o quão estúpida estava sendo, ela e Sofya tiveram uma discussão enorme por isso e agora não se falam mais. A Diarra e o Krys também ficaram do lado do Noah.

— E a Sina? A Heyoon?

— A Sina... Bom, a Sina deu uma surtada. Você sabe que ela gostava muito dele, há muito tempo, e quando descobriu que ele era gay não foi fácil pra ela, ela se afastou e a Heyoon acabou se afastando junto. Shivani e Hina ficaram com medo do Bailey, de ir contra ele. Todo mundo ficou na verdade, até o Krys, a Sofya e a Diarra. Eles defendiam o Noah na medida do possível, mas tinham limites. Ainda têm.

— E onde você estava nessa confusão?

— Irônico justo você me fazer essa pergunta, né, Josh? — Lança um olhar acusatório para mim. — Eu tava deprimida, por culpa sua. Passei três meses sem dar as caras no colégio e quando voltei... Bem, encontrei o mesmo cenário que você viu hoje.

— E ninguém fez nada?!

— Fez. A Sabina fez. Na verdade tentou. Ela foi até a diretoria reclamar com o Simon, afinal bater nos outros assim é crime, sem contar todo o bullying. Mas não adiantou nada. A família do Lamar banca esse colégio quase sozinha, e se Bailey fosse expulso, Lamar iria junto. Simon deu uma suspensão de 5 dias pros dois como se não fosse grande coisa. A Sabina tentou outras vezes, mas começou a receber ameaças também. Ficou assustada e os pais dela mudaram ela de colégio.

Eu tento processar tudo, é informação demais para a minha cabeça.

— E a mãe do Noah? Não fez nada? Ela sempre foi tão super protetora.

— A mãe dele... A mãe do Noah sofreu um acidente, Josh. — Paraliso. — Faz uns 8 meses que ela tá em coma no hospital...

Não consigo respirar direito. A mãe dele... Ele só tem ela.

— Onde ele tá morando?

— Acho que com a avó, mas ela já tá muito velha pra conseguir ajudar ele com esse tipo de problema. Eventualmente o Noah só aceitou tudo.

Sinto um nó na garganta, meus olhos marejam e estou tremendo. Noah... Meu melhor amigo... Esse tempo todo enquanto eu me divertia no Canadá e ele... Ele precisava de mim. Ele precisava muito de mim.

— A culpa é toda minha, Any...

— Eu até negaria, mas acho que grande parte da culpa é realmente sua. Se tivesse ficado várias coisas poderiam ter sido diferentes.

A culpa é minha. Noah está quebrado e a culpa é minha. O grupo está separado e a culpa é minha. Preciso consertar isso, preciso consertar tudo. Preciso... Preciso consertar ele.

Notas da autora:

Esse capítulo ainda tá um pouco menor do que eu queria (a meta é ter de 1800 palavras para cima), mas como ele tá trazendo muita informação nova achei suficiente.
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