Em casa, no jantar, eu mais dava atenção ao meu celular do que para a comida, e isso pareceu irritar minha mãe gradativamente. Nas duas vezes em que dei uma conferida rápida nos meus pais — tempo suficiente para esperar outra resposta de Max no WhatsApp —, recebi um olhar torto dela. Na terceira vez, ela não se conteve.
— Filho, é hora do jantar.
Acho que ela não estava com o humor tão positivo assim — percebi isso pela manhã —, mas não imaginei que fosse culpa minha, afinal, o que eu havia feito? O máximo que poderia acontecer era eu dar trabalho justamente por eu não dar trabalho. Talvez ela quisesse um motivo para brigar comigo.
— Só um minuto — pedi.
Não foi apenas um minuto, claro. De qualquer forma, não era minha intenção irritá-la. Ao contrário dela, meu humor estava muito bom — foi ficando cada vez mais acentuado durante minha conversa com Max.
Quando muito tempo além "só um minuto" se passou, minha mãe intrometeu-se de novo:
— Tales...
— O quê? — Olhei para seu cenho com o celular ainda na mão e com um sorriso aberto (mais uma vez, não tinha nenhuma relação com ela).
Seu olhar desceu do meu aparelho para meu prato, lançando-me o recado só com o rosto.
— Deixe ele, Karla — retrucou meu pai, balançando a cabeça.
— Não, não é nada educado comer enquanto mexe no celular — resmungou minha mãe, tentando aparentar estar mais brava do que realmente queria.
Eu suspirei, mas estava decidido que não queria ter que dizer adeus a Max — a conversa sobre gostos pessoais me interessava muito, ainda que eu tivesse absoluta certeza de que eu estaria interessado no bate-papo mesmo se estivéssemos falando sobre coisas que não tinham sentido.
— Eu só vou me despedir dele — menti, digitando mais um texto.
Trinta segundos depois de perceber que eu havia mentido, ela exclamou meu nome:
— Tales!
Olhei de cara feia para minha mãe.
— O que é?!
— O celular!
Meu Deus!
— Eu nunca mando mensagens enquanto como! — lembrei-a, absorvendo parte de sua ira. — Por que não me deixa fazer isso ao menos uma vez?
— Por que é falta de educação!
— Não seria se eu estivesse falando com uma garota, não é mesmo?!
— Filho... — Meu pai tentou me acalmar, e era notável a diferença no seu tom amoroso.
Suspirei com força.
— Pai, eu não entendo! Ela vive falando que eu preciso de ajuda porque eu sou triste, mas faz questão de tirar minha alegria quando estou feliz! — Encarei minha mãe. — Vovó jamais faria isso.
Ela arregalou os olhos. Saiu sem querer, mas coisas saíam sem querer quando eu estava chateado.
— Talvez devesse morar com ela, então.
— Karla! — Meu pai soltou os talheres, chocado.
— Talvez eu devesse — concordei, a voz baixa. — Ela entendia minha depressão. A senhora, não.
Fiz nascer uma chama de fúria em seus olhos. Acho que essa era a primeira vez que eu discutia com minha mãe. Normalmente eu a ignorava quando percebia que queria começar uma briga, e tive suspeita de que só alimentei nossa atual discussão porque eu estava conversando com Max. Eu não gostava do fato de ter que ser obrigado a parar de falar com ele. Já era ruim demais quando isso ocorria de forma natural.
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CONTE-ME MAIS UMA VEZ
RomanceMais surreal do que ter um namorado imaginário é descobrir que ele, na verdade, existe. Após passar por essa situação, Tales Johnson precisa descobrir como reconquistar a pessoa que um dia já amou - Max - e que agora nem sabe quem ele é. Por medo de...