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A jornada para Europa

"Atenção, atenção, Repórter Esso: O governo brasileiro acaba de declarar guerra às nações do eixo!"

Dia 22 de agosto de 1942, com o som estridente do nosso aparelho de rádio, desperto de uma leve soneca na sala dos pilotos após um cansativo voo procedente de Araxá. Uma simples missão de correio aéreo que foi dificultada pelo mal tempo e me deixou exausto.

-Paulo, levanta companheiro! Não ouviu o rádio? O comandante disse ter um anuncio a fazer para todos os pilotos. Exclama Tavares com empolgação explicita.

O hangar está lotado. Pilotos, mecânicos, soldados, todos com atenção voltada ao comandante Hélio que em seu longo pronunciamento faz questão de salientar que todos de alguma forma atuarão na guerra, diretamente ou indiretamente. Penso que por ser piloto novo do CAN dificilmente verei alguma ação. Mas tão repentinamente quanto o pronunciamento do rádio, mais uma vez sou surpreendido, desta vez, com a informação de que serão selecionados alguns dos melhores pilotos dos esquadrões, estes irão completar duas unidades que a FAB enviará para o teatro de operações, uma unidade de combate e outra de ligação e observação, que atuará com a artilharia da Força Expedicionária Brasileira- FEB. Mas minha verdadeira surpresa se dá no instante em que ouço meu nome e o nome de meus companheiros Tavares e Santos como os escolhidos para a unidade de combate.

Mais tarde na sala de reuniões dos oficiais superiores, o Comandante Hélio nos apresenta ao Tenente Aviador Miranda Corrêa, que nos escolheu para completar seu quadro de pilotos. Miranda Corrêa é um dos 16 oficiais escolhidos pelo Major Nero Moura, agora comandante da unidade de combate. Nero Moura confiou a seus 16 oficiais e 16 sargentos a missão de ir aos Estados Unidos aprender o como funciona uma unidade tática de combate e repassarem aos demais pilotos.

-Ouçam rapazes, com exceção dos 32 "Homens-chave" de Nero Moura, todos os pilotos que integrarão a unidade de combate são voluntários mais antigos, os senhores são novos na casa, mas demonstraram uma habilidade surpreendente em suas avaliações de voo. Vamos lapidar os senhores ainda mais. Diz com serenidade e firmeza Miranda Corrêa.

O dia é de sol quente e enquanto alguns companheiros se despedem de seus familiares, sinto o abraço e carinho expresso por meus pais na carta que levo em minhas mãos. A viagem é longa e antes de chegar à terra dos americanos, faremos uma parada no Panamá para encontrar com os demais integrantes da FAB que também serão treinados nos Estados Unidos.

Aguadulce, nem tem água e nem é "dulce" nas palavras de Miranda Corrêa. Essa é a cidade que desembarcamos no Panamá. Aqui damos início ao treinamento com os americanos, sob uma extrema e necessária exigência do coronel que não admite erros, sempre nos lembra de que nos preparamos para o combate. Conhecemos em fim os outros 43 pilotos brasileiros, que muito bem aceitaram a mim, Tavares e Santos. Dada a péssima adaptação à comida americana e os quepes brancos, logo surgiu a nós brasileiros que somos como avestruzes, cabeça branca e comendo qualquer coisa.

Seguimos do Panamá para Suffolk em West Hampton Beach, Long Island NY nos Estados Unidos, aqui nosso primeiro Grupo de Caça brasileiro, tem enfim contato com a aeronave que empregaremos no teatro de operações, o caça bombardeiro P-47 Thunderbolt, aeronave robusta e imponente com quatro metralhadoras e grande capacidade de armamento. Aqui treinamos combates aéreos e principalmente bombardeiros picados, tática na qual mergulhamos a aeronave para o ataque e após soltar as bombas, recuperamos com uma brutal subida. Sabemos enfim que vamos para a Itália, local onde realizaremos missões de ataque bombardeiro a posições estratégicas dos alemães.

Já é setembro de 44 e embarcamos no United States Army Trasnport chamado USAT Colombie, e ao som de uma banda marcial militar americana, deixamos o porto de Nova York. Não se passam muitas milhas até que surja o som do cavaco e do pandeiro em meio aos ruídos de conversa em inglês, um contraste muito interessante que de imediato chama a atenção e cativa os olhares daqueles que pela primeira vez escutam a música brasileira. Com um grito um dos nossos pilotos, Rui Moreira Lima exclama:

– Pare a música um instante! Os três novatos precisam saber de uma coisa, o Fortunato acabou de desenhar nosso símbolo. O avestruz sobre a nuvem significa o piloto brasileiro, o escudo leva nosso Cruzeiro do sul, o céu vermelho ao fundo se refere à guerra e por fim a arma diz respeito ao poder de fogo dos nossos aviões P-47. Junto a isso, nossa expressão Senta a Púa! Agora, bebam esse whisky rapazes.

A música voltou, e nós agora já estamos de fato integrados ao 1º GAvCa – Primeiro Grupo de Aviação de Caça. Seguimos navegando em um comboio de 13 navios, comboiados por cinco destróieres americanos, que ora ou outra entra em alerta com os submarinos alemães na região. A música, os jogos, o cinema e os shows à noite, faz o tempo dessa longa viagem passar um pouco mais rápido e em alguns momentos acabo esquecendo que estamos indo para a guerra.