Epílogo

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Percepção da escritora gaúcha Lya Luft:

Ela (a morte) é (...) o olho que nos contempla sem dormir, a voz que nos convoca e não queremos ouvir, mas pode nos revelar muitos segredos.
O maior deles há de ser: a morte torna a vida tão importante!
Porque vamos morrer, precisamos poder dizer hoje que amamos, fazer hoje o que desejamos tanto, abraçar hoje o filho ou o amigo. Temos de ser decentes hoje, generosos hoje ... devíamos tentar ser felizes hoje.
A morte não nos persegue: apenas espera, pois nós é que corremos para o colo dela. O modo como vamos chegar lá é coisa que podemos decidir em todos os anos de nosso tempo.
O melhor de tudo é que ela nos lembra de nossa transcendência.
Somos mais que um corpo e ansiedade: somos mistério, o que nos torna maiores do que pensamos ser - maiores do que os nossos medos.
(...) Se acreditarmos que viver é só comer, trabalhar, comprar e pagar contas, a morte da pessoa amada será desespero sem remissão. Não nos conformamos, não acreditamos em mais nada.
Mas se tivermos alguma visão positiva do todo do qual faz parte a indesejada, insondável mas inevitável transformação na morte, depois de algum tempo o amado acomoda-se de outro jeito em nós: continua parte de nossa realidade.
Está transfigurado, porém ainda existe.
"Com o passar dos anos dói menos", disse-me um amigo que há trinta anos perdera uma filha ainda criança.
Conheço um pouco a Senhora Morte. Duas vezes a Bela Dona me pegou duro, (...) me jogou no chão. Foi-se a cada vez um pedaço importante de mim. Mas como em certos animais, as partes perdidas se refizeram, diferentes - não me sinto mutilada, embora a cada dia sinta em mim aqueles espaços vazios que não voltarão a ser ocupados.
Aprendi que a melhor homenagem que posso fazer a quem se foi é viver como ele gostaria que eu vivesse: bem, integralmente, saudavelmente, com alegrias possíveis e projetos até impossíveis.

Inquietude [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora