Onde o conheci

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Conduzi o carro e quase o fiz colidir com diversas coisas no caminho por minha visão estar turva e embaçada devido às lágrimas incessantes e soluços incontroláveis.

Tia Elize se foi.

O que eu faria agora ? Para onde iria ?

As minhas perguntas foram interrompidas ao ouvir o ronco alto e estrondoso do motor soar e logo o carro gradativamente parar de se movimentar.

Droga

Desço do carro fungando e analiso às pressas tudo a minha volta, atônita, até perceber ao fim da estrada um estacionamento de uma pequena loja de conveniências, em frente à um lago.

Não havia absolutamente ninguém para me ajudar a essa hora da madrugada, então empurro o carro com dificuldade até o fim da estrada e o estaciono desajeitada e quase de imediato ao sentir o ar faltar e as minhas pernas fraquejarem.

Dias se passaram, e eu só me retirava do carro para usar o banheiro da loja de conveniências, e voltava novamente para o carro. Usei os poucos trocados que tinha para comprar comida industrializada e garrafas de água.

Fixei alguns panfletos nos vidros do carro para me privar dos olhos curiosos, o que dificultava a leitura dos livros que a tia liz me dera. Precisava desesperadamente manter-me ocupada ou a sanidade seria a primeira a me abandonar

Era insuportável e sufocante sobreviver dentro de um espaço tão minúsculo, e estava começando a exalar  um cheiro peculiar, pois, eu fitava o lago o dia todo, todos os dias, há dias cogitando a ideia de usá-lo para tomar banho. Mas me falta coragem, ou o medo excessivo.

Ao cair da noite, mordisco o polegar enquanto reúno o mínimo de coragem e me esgueiro até o lago

Meneio a cabeça de um lado a outro, e então retiro as roupas e corro atrapalhada até submergir na água.

A sensação da água gélida em contato com o meu corpo é reconfortante na mesma intensidade que me entorpece

Paro de debater os meus pés e me mantenho estática, exausta, afundando aos poucos, sendo engolida lentamente.

Ao retornar à superfície, ao longe, na penumbra, vejo duas pessoas conversando, mas não consigo compreendê-los, sinto um arrepio percorrer a minha espinha ao ver um deles impulsionar o outro pelo colarinho e fazê-lo ir de encontro ao capô do meu carro ao desferir um soco em seu rosto e o golpeá-lo diversas vezes.

Me esgueiro de volta á margem e me visto apressadamente. Ao caminhar em passos lentos á poucos metros do carro, percebo a presença de só um dos homens, debruçado sobre chão.

Percorro lentamente o mesmo trajeto feito anteriormente

Será ele que está vivo ?

Apreensiva me aproximo e comprimo o seu pulso entre os meus dedos

Nada

Não sei por que fiz isso visto que não sou nenhuma especialista, sequer encontro pulsação. Isso quer dizer que está morto ?

Não o conheço, talvez seja melhor ele estar desacordado, quem sabe o motivo de o outro senhor tê-lo golpeado ?

Me ergo às pressas e antes que eu pudesse me distanciar o suficiente, ouço um burburinho de voz, debilitado,quase inaudível.

- Socorro, preciso de ajuda - o ouço gemer em meio a um suspiro sôfrego

Vasculho o estacionamento em busca de um objeto, qualquer coisa pontiaguda para me defender, mas não encontro, então opto por retirar de um dos pés o tênis surrado.

Dou de ombros, tem que servir !

- não se mova - me aproximo receosa e com o sapato em frente ao corpo, apontando-o para o homem, como se fosse uma arma letal - qual o seu nome ? - questiono

- Michael - ele responde em um fiapo de voz

- O que aconteceu com você ? - o analiso mais de perto e em seu rosto contém um filete de sangue e alguns hematomas arroxeados

Ele é muito bonito, se parece com aqueles garotos de programa de tv adolescente, não parece oferecer qualquer perigo.

- Por favor, me ajude a levantar eu preciso sair daqui antes que ele volte - ele suplica entredentes, trêmulo pela baixa temperatura.

Olho para o homem estirado no chão e fito os vidros do meu carro, vedados por papéis que não permitem qualquer vislumbre de seu interior.

O ajudo a adentrar o veículo de modo que ninguém nos ouça

O único ruído audível dentro do carro são os meus dedos movendo desconfortavelmente as pulseiras em meu braço, nunca estive tão perto de um homem desconhecido antes

O fito com o canto dos olhos e o vejo explorar discretamente ao nosso derredor

- Você mora dentro do seu carro ? - ele questiona

- Há exatas uma semana, mas não é tão ruim - divago

- Não é o que parece - ele retruca em um meio sorriso

Nas horas seguintes converso com o Michael sobre a minha vida, sobre a sua vida, e tento distraí-lo da sua quase concussão. Ele disse que poderia me ajudar. Tínhamos algo em comum, não tínhamos família e estávamos fugindo.

Alvo Fácil (ruggarol) Onde histórias criam vida. Descubra agora