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LUCAS 

Cinquenta por hora; era o que indicava o ponteiro trêmulo do velocímetro. Todas as tentativas de fazê-la mudar de ideia tinham sido falhas, eu queria ir caminhando para a escola e havia discutido com ela naquela manhã. Minha mãe estava tentando continuar com a tradição, e a tradição era que meu pai me levava sempre para a escola, sempre escutávamos a rádio local no trajeto e às vezes conversávamos. Minha mãe se esforçava para que tudo parecesse normal, mas na maior parte do tempo ela não conseguia fingir para si mesma.

Terminei de tomar meu café da manhã no carro, risquei mentalmente isso da minha lista. Eu sentia algo estranho. A maioria dos meus sentimentos são estranhos, mas aquele era diferente; meu coração batia forte, e eu ainda não sabia decifrar se isso era bom ou não. Por volta das 7h15, viramos a direita em uma rua que termina na escola. Tamborilei com os dedos até encontrar o botão, o vidro desce, o vento entra. Lá fora os carros correm contra o vento, vultos de cores diferentes pintados como em um quadro, ao fundo os morros verdes iguais a pirâmides de árvores. A mesma rádio está tocando, as mesmas musicas antigas "meio rock", mas além disso, nada está como antes. Até mesmo o trajeto para escola. Acontece que naquele ano eu não iria estudar no Rosário, a San Valencio era uma ótima escola, está em um alto patamar no ranking de melhores escolas do estado, segundo lugar para ser específico. Tudo bem se você não sabia que existia um ranking de melhores escolas, eu só descobri isso depois de uma pesquisa no Google.

Olho para meu reflexo no vidro-retrovisor enquanto minha mãe me pergunta se eu estou animado. Eu não respondo, na verdade nem penso muito. Deixo o vento acariciar meu rosto, inflar minha camisa e agitar meu cabelo ainda molhado, gosto dessa sensação. Sei que minha mãe não gosta que eu faça aquilo, sempre conta historias com finais trágicos de "pessoas desavisadas que acabaram sem o membro por botarem a mão para fora da janela".

— E se eles não gostarem de mim? — eu pergunto.

Ela espera um tempo, acaricia meus cabelos e responde:

— Tudo bem, muitas pessoas precisam aprender a amar a si mesmo. Você precisa provar ao contrario disse.

— É.

Voltei a olhar para as nuvens, naquela manhã o céu estava mais azul e as nuvens se moviam com a velocidade dos carros. Algum tempo depois comecei ver o prédio da escola começar a nascer do asfalto. O prédio era realmente grande, alunos sentavam nas escadarias e outros no gramado visto por trás das grades, na fachada da escola estava escrito: "E.E.B. San Valencio", e ao lado uma bandeira que tremulava sobre mastro no maior estilo patriota. Era bonito e ao mesmo tempo assustador. Desatei meus cintos e falei para minha mãe em um grito:

— Quero descer! — falei.

— Mas... — começou a minha mãe.

Ela parecia confusa. Eu falei:

— Muito obrigado pela carona. — Falei quando ela diminuiu a velocidade e levou o carro até perto do meio-fio.

Levei meu braço para abrir a porta.

— Te amo filho, agora vai.

Eu demorei a aprender a falar, nunca gostei de falar. Demorei a ir para escola, também nunca gostei de ir. Odeio os barulhos da escola, quando eu era pequeno algumas pessoas diziam para minha mãe que eu era mimado, mas eu não sou mimado. Acontece que na escola tudo acontece muito rápido, ouço cada som, cada fala e tudo isso começa a me sobrecarregar. Antes de eu ir para o primeiro ano minha mãe me colocou em pé na sala e falou para mim: "se alguém gritar com você, ou você começar a se sentir ruim. Respire fundo, pense em quanto você está se sentindo mal... em uma escala de zero a dez. Depois respire o mesmo tanto de vezes", — ela fazia isso soltando o ar e me fez repetir. Quando desci do carro senti um "sete", era como se estivesse caminhando para o pior lugar do mundo, eu sentia isso porque pessoas são más, muitos iriam rir e eu sabia disso, por isso estava nervoso. Respirei sete vezes e sai do carro.

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⏰ Last updated: Apr 14, 2020 ⏰

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