Soberba da vida

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Como numa retrospectiva, memorei os momentos que eu me encontrava fixo em jogatinas baratas e apostas com aqueles que se diziam meus amigos. Bem verdade que ganhava todas e, como recompensa, uma mulher para completar minha noite regada daquilo que eu chamava de diversão. Deveria ser entendido que "o companheiro de prostituta desperdiça os bens"¹.

Entretanto, no cantar do galo eu sentia um peso em minha consciência sobre o que eu estava a fazer, mas ainda sim eu buscava por mais; muito mais. Sorria por pensar no que faria no dia seguinte: Nada além do que o mesmo de sempre. Apenas um viciado em jogos e sexo enquanto tinha que escutar minha mãe bradando no telefone que eu era um presente que Deus tinha dado a ela. Por ser tão entregue a mim mesmo, eu somente a envergonhava ainda que ela não soubesse dos meus maus feitos.

Eu me sentia o pior dos presentes e me entristecia ter que ouvir suas verbalizações. Porém, ela sempre proferia as mesmas palavras.

Esquecia do provérbio que diz: "Filho meu, guarda o mandamento de teu pai, e não deixes a lei de tua mãe"². As palavras que ela dizia eram a fim de me abençoar, mas eu estava exposto a maldição que eu próprio atraí.

— Quem é você?  — perguntou o homem que Catarina havia me advertido ser o malandro apropriador de bens de outros.

— Sou o esposo de Catarina e você, quem é? — menti.

— Esposo?  — zombou  — Cadê a  aliança? — E eu arqueei a sobrancelha, apreensivo. Tinha que pensar rápido.

— Preciso de uma aliança para isso, por acaso? Somos recém-casados e ainda temos uma linda menina para criar. O que acha? — desafiei e ele permaneceu incrédulo, pedindo que Catarina viesse até onde estávamos.

— Isso é verdade?

— Sim — afirmou, Catarina, segurando em meu braço.

— Não perdeu tempo em atrelar-se a um homem apenas para ficar com este lugar. E quanto a menina, sei que você foi mãe solteira — disse, receoso.

— Sim, eu fui, mas agora ela tem alguém para chamar de pai — refutou.

— Agora você tem um rosto mui familiar — disse, olhando para mim, e eu engoli em seco tentando manter a compostura.

— Pois é a primeira vez que o vejo — respondi, arqueando a sobrancelha — E, a propósito, não vamos ficar de balela. Tenho conhecimento em advocacia e se achas que conseguirá burlar a lei para tomar este lugar está muito enganado. Ela pertence a Catarina e apenas a ela e seus descendentes — acrescentei em tom ameaçador.

— Pois como um homem inteligente deveria saber que ninguém me intimida facilmente e sai ileso. — Escutei sua ameaça com um certo frio na espinha.

— E certamente achas que sairia ileso de qualquer intento que pensares em fazer? — indaguei com sarcasmo. — Essa conversa que estamos tendo está sendo gravada, e tenho certeza que para chegar até a polícia seria como num estralar de dedos — gesticulei, irônico. — Ou quem sabe deixar com a mídia... Eu tenho certeza que acontecendo qualquer coisa a um de nós, você será o principal mandante — acrescentei e vi seu semblante mudar de cor. De fato, estava irado pelas minhas palavras. No fundo, não eram verdadeiras, não cem por cento.

O que eu não sabia era que a minha menininha estava filmando toda a nossa conversa a pedido da mãe e, quando soube disso, fiquei estarrecido pela esperteza. E isso, só chegou ao meu conhecimento quando o velho saiu do estabelecimento soltando fogo pelas ventas.

E eu gargalhei. Não apenas eu, mas Catarina também. Contudo, ao encararmos novamente a realidade, o nosso sorriso desapareceu e deu lugar a um tremendo desconforto.

A mentira do Diabo (Conto) Where stories live. Discover now