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Anahi

Alfonso adormeceu e eu fiquei apenas o observando. Era a primeira vez em muito tempo que eu sentia um calor em meu peito. Acariciei seu rosto enquanto ele dormia, sentindo a maciez da sua pele sob a ponta dos meus dedos. Alfonso era o ser humano mais bonito que eu já havia visto.

No meio da madrugada, eu ouvi a Água me chamar. Como estava ficando frio, eu fui até o quarto, peguei um cobertor e um travesseiro e trouxe para ele. Levantei sua cabeça devagar, coloquei o travesseiro e depois o cobri.

Não que eu me importasse, só não queria ter que lidar com um cadáver gelado depois que eu voltasse.
Mergulhei no mar e me transformei.

Como vai o Alfonso? — Ela perguntou.

— Bem.

Bem? Ele acabou de ficar viúvo.

— Cada humano lida com o luto do seu próprio modo. Alfonso prefere não se entregar à tristeza.

Sendo assim, tudo bem. Não quero ter que salvá-lo de um suicídio de novo.

— Por que Você o salvou?

Não era a hora dele.

— Só isso?

Sim. Por que a curiosidade? Você não se importa.

— É, eu não me importo.

No fundo, eu quase achei que a Água havia sentido compaixão ao salvá-lo, mas será que Ela era capaz de se importar por qualquer outro ser vivo que não fossem as sereias?

Deixei esses questionamentos de lado e fui fazer o que Ela queria. Primeiro, um veleiro, depois fui direcionada até um navio cargueiro, uma lancha, um bote, outro veleiro... recebi trabalhos a noite inteira, até o dia começar a raiar.

Voltei para o iate de manhã e quando subi, peguei o vestido que usei na noite anterior, ainda jogado no chão e o vesti.

Comecei a procurar Alfonso, mas parecia que ele não estava em lugar nenhum. Gritei seu nome excessivas vezes enquanto andava pelos cômodos, mas não ouvi nenhuma resposta.

Algo em mim começou a me incomodar e esse incômodo me fazia ter vontade de encontrá-lo o mais rápido possível. Será que a Água teria feito algo com ele enquanto estive fora? Por que Ela faria isso? Já tinha a minha alma, o Alfonso não apresentaria nenhum risco.

Voltei para o lado de fora, desci as escadas do iate até perto do mar e coloquei um dos meus pés na Água.

Hum... eu tenho uma pergunta. — falei. — Você mandou alguma sereia aqui pra afogar o Alfonso?

Por que eu faria isso?

Não sei... toda alma é válida, Você disse.

Não é a hora dele.

Está mentindo pra mim? Se estiver, não precisa. Eu entendo que talvez Você ainda ache que ele é uma ameaça. Está tudo bem pra mim se tiver o afogado.

Procure-o direito e pare de duvidar de mim! — falou irritada.

Voltei para o iate e voltei a gritar o seu nome, andando por todo o lugar. Quando passei pelo banheiro, ouvi um murmúrio, como se alguém cantarolasse. Abri a porta devagar e o vi sentado no chão, com fones de ouvido no volume máximo. Certamente foi por isso que ele não me ouviu chamando-o.
Fui até ele e retirei os fones. Ele me olhou por alguns segundos, um pouco boquiaberto.

Alto Mar [Ponny Version]Onde histórias criam vida. Descubra agora