CAPÍTULO 44

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Olheiras escuras demais para cobrir.

Rosto encovado demais para não ser notado.

Uma visão de derrota imagino, mas ser uma vencedora nunca fez o meu tipo.

O quarto está vazio demais para minha mente barulhenta, pequeno demais para um coração cheio de medo.

Medo.

De perder.

De fracassar.

De não ser boa o suficiente, forte o suficiente para sequer se manter de pé.

Me sinto como se estivesse em um navio, no meio de uma tempestade balançando de um lado para o outro com a certeza de que serei engolida pelas ondas gigantes.

Mas desejo que o navio naufrague. Quero que ele afunde na imensidão das águas... quero o silêncio que vem com a incapacidade de sugar o ar.

Quero silenciar os pensamentos incessantes. Para sempre.

Sempre.

Sempre.

Desvios os olhos do espelho, e caminho em direção a banheira fumegante. Quando a água toca meus pés ainda está quente demais para entrar, mas mesmo assim continuo até que ela cubra todo meu corpo, e então afundo completamente.
É uma dor pequena que se espalha enquanto minha pele parece queimar mas ainda assim ela alívia o que sinto lá dentro, incurável e forte demais.  Quando tudo queima... quando não encontro o ar, a tempestade que carrego dentro de mim parece se acalmar.

É como estar na arena de novo, as mão grandes esmagando meu pescoço, os pulmões ardendo... a paz.

Volto a superfície, tossindo e sugando todo ar que consigo. Levo a mão ao pescoço inchado, sei que se olhar meu reflexo encontrarei manchas rochas espalhadas, mas essas são apenas marcas externas de uma dor, que está muito pior por dentro.

Me levanto e agarro a toalha pendurada na lateral para cobrir meu corpo e protegê-lo da brisa fria que chacoalha as cortinas e invade o quarto. Pelas janelas consigo ver o céu nublado, as nuvens carregadas com a promessa de explodir em uma tempestade, - como sempre acontecia quando o inverno se aproximava - o céu cinza e o vento gelado balançando as folhas das árvores.

O céu prestes a desabar sobre a cabeça de todos.

É o clima perfeito para uma final.

Uma última prova.

Uma decisão.

E dois destinos selados para sempre.

Duas vidas.

Duas irmãs.

E apenas uma coroa. A vida provavelmente me odeia.

Coloco cada parte da armadura com dificuldade, as mãos machucadas não colaboram em nada e ardem como o inferno cada vez que toca o metal frio. Pego as tiras brancas estendidas ao meu lado na cama, e enrolo a palma da mão nelas, uma por uma, volta por volta, até que as feridas fiquem protegidas sob o toque suave do tecido. Prendo o cabelo molhado com delicadas fitas azuis, os fios úmidos deslizam entre meus dedos enquanto os retorço ligando-os um ao outro, até que uma trança desajeitada e folgada se forme.

Ando a passos largos pelos corredores até chegar aos portões de entrada, onde quatro guardas me esperam com cavalos para me escoltar até o local onde a última prova acontecerá. Subo com facilidade no cavalo, e balanço a rédea para seguir em frente rumo a qualquer que seja o local para qual estou sendo levada.

Mas o que começou em um completo mistério, se revela muito antes de chegarmos lá.

Conheço o caminho que estamos seguindo como a palma de minha mão.

Lívia (COMPLETA)Where stories live. Discover now