CAPÍTULO 45

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Não há canto de pássaros como de costume, nem o vento suave chacoalhando as folhas das árvores como se dançassem a música mais bonita.

Não há nada de belo. O vento cortante ameaça levar tudo á sua frente, não há delicadeza em sua melodia violenta, nem suavidade nos passos frenéticos das folhas que são arrancadas e levadas para longe pela corrente furiosa de ar.

O céu cinzento e trovejante, faz com que a floresta recaia sobre terríveis sombras, barulhos escapam dos arbustos fazendo meu coração disparar a todo segundo com o que quer que possa saltar dali.

Mas ainda assim sigo em frente. Meus olhos vagueiam em direções contrárias e lembro de cada atalho que eu poderia pegar para não ter que caminhar o dobro, nem enfrentar o que quer que o conselho e meu pai panejou para hoje. Mas o pensamento desaparece tão rápido quanto veio, apenas em imaginar os homens escondidos sob cada canto da floresta preparados para disparar uma flecha em minha cabeça assim que eu tentasse cortar o caminho.

Uma gota gelada cai em minha bochecha, logo seguida de mais uma, e mais uma, até que o céu todo desabe em uma chuva de início lenta, mas a cada passo meu, vai se tornando mais grossa.

Apresso meus passos para uma quase corrida antes que a tempestade fique forte demais e atrapalhe minha visão. Mas não vou muito longe antes de avistar uma pequena cabana de madeira no meio do caminho, ao seu redor vejo os troncos das árvores pela metade, derrubadas para abrir espaço no local, interceptando a trajetória em linha reta que só poderia ser feita naquela direção.

Sem ter outra escolha, avanço com cuidado em direção à casa, prestando atenção no chão em busca de qualquer armadilha. A porta estala quando a empurro, a madeira é nova, mas a construção toda é tão mal feita que parece que vai ser arrastada pela menor ventania.

Dou um único passo á frente para adentrar a casa e sinto no mesmo instante o fio se romper acionando a armadilha, a flecha passa zunindo por pouco não levando meu nariz junto, antes de se cravar na madeira do outro lado.

O interior da cabana está escuro, mas ainda vejo a outra porta do outro lado, oferecendo uma saída para o restante do caminho. Meus olhos são atraídos para o canto onde uma pequena mesa está, uma garrafa solitária esta ali junto com uma única vela tentando afastar as sombras da casa, mas o que realmente me chama atenção é o homem amordaçado e preso em uma cadeira. Ele não veste uma camiseta, e seu corpo cheio de cicatrizes de batalhas ganhou mais algumas.

Em seu peito, gravado à faca está escrito RodWell, sangue escorre das letras deformadas e formam uma poça ao seus pés. Não vai demorar para que ele parta para sempre.

Me aproximo dele com cautela, a chuva castiga as paredes frágeis da cabana com violência assim como as batidas de meu coração. As palavras gravadas em seu peito ecoam em minha cabeça, junto da lembrança dos gritos e da flecha em minha direção, uma puxada para trás... cabelos ruivos brilhando à luz do sol enquanto Oliver se colocava na frente... e depois ... depois tinha tanto sangue... tanto.

Por culpa deles.

Engulo em seco tentando desfazer o nó que se forma em minha garganta, não posso fraquejar em frente aquele monstro. Estou prestes a desferir um soco em seu rosto quando vejo de relance um papel embaixo da garrafa sob a mesa. A contra gosto abaixo a mão e o pego.

" Os pecadores devem queimar. "

Releio a frase três vezes antes de finalmente entendê-la. Tiro a rolha da garrafa e a levo até o nariz... o cheiro é de álcool.

Não precisa ter medo, repito para mim mesma, não deve ser tão diferente fazer aquilo em alguém vivo, não pode ser tão diferente de queimar o corpo de Anne na floresta... a única coisa que os distingue é que o coração dele ainda bate.

Lívia (COMPLETA)Where stories live. Discover now