Capítulo 02 - Parte 1

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Devia ter telefonado pedindo as compras, pensou Anahi, enchendo o carrinho e tentando ignorar as pessoas que a observavam, os jovens, muito mais jovens do que os que pensaria em namorar, fitando-a intensamente. Ela sorriu docemente, um típico sorriso de passarela, admitiu, rindo baixinho. Alguns homens eram pescadores, e ainda usavam as botas de borracha da pescaria.
Checando a lista, Anahi dirigiu-se ao caixa. Vai começar, pensou, vendo que as pessoas aproximavam-se de onde estava, como felinos. Um adolescente que varria o chão chegou mais perto. A vendedora parecia não ter pressa, fitando-a demoradamente, apesar da fila. Os clientes não tiravam os olhos dela. Não era de admirar que Herrera não saísse de casa. O que teria acontecido com a hospitalidade do sul?

- Você é nova aqui? - perguntou a vendedora, uma morena que usava argolas enormes nas orelhas e mastigava chiclete.

- Sim. É uma linda ilha - disse Anahi. Era melhor deixá-los orgulhosos da terra onde viviam.

- Está no castelo, não é?

- Sou a babá que o sr. Herrera contratou.

- Babá?! - exclamaram várias pessoas ao mesmo tempo. Anahi olhou ao redor, fitando um a um, todos que estavam próximos.

- O sr. Herrera está esperando a filha chegar, e estou aqui para cuidar dela.

- Pobre criança - disse uma velha senhora, num tom sombrio.

- Por quê? - perguntou Anahi, embora soubesse a resposta.

- Imagine ter um homem tão horrível como pai.

- Conhece o sr. Herrera? - perguntou Anahi.

- Não exatamente.

Esperando que sua expressão fosse da mais pura inocência, indagou:
- Então, como pode saber como ele é?

- Ele nunca sai daquele lugar - disse a vendedora. - Não mostra o rosto há quatro anos. Nem mesmo Dewey, que mora lá, conseguiu vê-lo de perto. Dewey, Anahi imaginou, devia ser o caseiro, que ainda não conhecera.

- Ele está desfigurado - gaguejou o jovem que embalava suas compras.

- Se nunca o viu, como pode saber disso?
O garoto deu de ombros, como se fosse de conhecimento geral. Embora ninguém tivesse visto Herrera.

- Não acho que a aparência seja importante - respondeu ela, tentando controlar-se, e detestando que as pessoas dessem tanta importância às aparências. Ela sabia, por experiência própria, como isso era injusto e preconceituoso, embora por motivos opostos. As mulheres recusavam-se a ser suas amigas, acreditando que se imaginava melhor do que elas. Os homens quase pisoteavam uns nos outros para aproximar-se, todos tentando levá-la para a cama, ou convidá-la para um acontecimento social, onde pudessem exibi-la como um troféu. Ninguém, nem mesmo o ex-noivo, conseguira ver além do rosto lindo que Deus lhe dera. E, aparentemente, ninguém queria ver além das cicatrizes de Herrera.
Tudo isso fazia Anahi sentir um estranho impulso de defender um homem que nem conhecia. Era difícil manter o controle diante de tantos preconceitos.

- Coloque na conta dele, e mande entregar por volta das três - pediu, saindo depressa e sentindo que todos os olhares a acompanhavam.

Em vez de pegar um táxi para casa, resolveu acalmar-se, caminhando pela pitoresca cidadezinha. Mas as lembranças continuavam a atormentá-la. A mãe, arrastando-a para comerciais de tevê, desde bem pequena, os concursos, tudo que sempre detestara. E quando crescera, escolhia participar apenas dos que lhe interessavam, porque queria ir para a faculdade, e precisava do dinheiro.

A Bela e a Fera -AyA-Adaptada  - FinalizadaWhere stories live. Discover now