A entrevista

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Na manhã seguinte eu acordei extremamente disposta, tão disposta que fiquei horas arrumando meu cabelo e me maquiando. Eu estava impecável. Fiquei alguns minutos tentando escolher uma roupa ideal, mas eu não tinha muitas opções já que não dava pra carregar o meu antigo guarda roupa na mala. Eu escolhi então uma roupa do meu dia a dia, não o dia a dia dessa nova vida mesquinha, mas sim o dia a dia da Emma rica e bem de vida, da verdadeira Emma.

Saí do quarto e não demorou muito eu já estava na cozinha. Eu na minha outra casa tinha que descer um andar e dar longos e demorados passos até a minha cozinha. Aqui eu piscava e já estava em um cômodo diferente, coisa que eu nunca iria me acostumar. Abri a geladeira e me deparei com um breu ali, o que havia eram sobras de comidas de restaurante que eu pedia sempre pra levar pra casa porque se não eu teria fome tarde da noite e o restaurante não estaria aberto. Vocês têm noção do nível? Pois é.

Abaixei a cabeça e vi no fundo da geladeira um resto de suco, coloquei no copo e abri o armário. Ali também quase não tinha nada, eram muitos pacotes de miojo e tinha o único e último pacote de batata. Peguei então a batata e tomei com o suco. Se isso não me der uma dor de barriga eu saio no lucro.

Eram 8:30 da manhã e como eu não tinha carro, eu precisava correr até o metrô e depois pegar um ônibus pra chegar até a casa da família que precisava de babá. Pelo visto eles não moravam junto com os pobres, eles tinham uma vida muito melhor. Então eu joguei fora as coisas do café e peguei a minha bolsa, saindo de casa em seguida. O ar era totalmente poluído e eu sinceramente não sei como estou aguentando quase três semanas nisso aqui.

[...]

Assim que desci do ônibus, eu tive que sentar um pouco em um banquinho que tinha ali no ponto. Eu fui o trajeto inteiro em pé no metrô e em pé no ônibus. Eu estava de salto, então os meus pés estavam me matando, além do fato de estar totalmente constrangida por todos do transporte me olharem de cima a baixo com desdém. Chequei o meu celular e eram 9:30, eu chegaria a tempo na casa da família e isso me causou um alívio. Acho que nunca eu quis tanto uma coisa como eu queria e precisava desse emprego. Na verdade, eu já quis sim, uma vez no ensino médio eu quis surrar a nova nerd da minha sala que competia comigo pro título de melhor aluna que eu tanto almejava. No fim eu ganhei, não porque bati nela, mas sim porque eu era a melhor.

Andei por mais uns dez minutos e olhei o meu celular pra ter certeza que ali era o endereço certo, e era. Analisei um pouco a casa do outro lado da rua. Não era uma mansão, mas também não era uma casinha humilde, era algo como classe média alta, tinha um pequeno jardim esbelto do lado de fora e alguns brinquedos propícios para crianças. A casa tinha dois andares e era branca com cinza. No caminho da porta o chão era de madeira com luzes o iluminando e era lindo, no final tinha uma porta enorme branca.

Precisei recuperar um pouco do fôlego após notar a casa por inteiro do lado de fora e ter a dolorosa lembrança de como era a minha. Respirei fundo e atravessei a rua, hesitei um pouco na hora de passar pelo chão — que mais parecia uma passarela de madeira — pensando que iria cair, mas tentei ignorar e consegui. Ali estava eu, parada em frente à porta gigantesca branca e apaixonada por ela. Minha vida estava tão ruim que eu tinha me apaixonado por uma porta chique.

Toquei a campainha e como se já tivesse esperando por mim, a porta se abre rapidamente. A princípio não vejo ninguém, mas recebo uma cutucada e olho pra baixo, notando a criança ali. Seus olhos castanhos expressavam empolgação e surpresa, parecia um misto de sensações. Seus cabelos loiros estavam alinhados por um arco de flor e ela usava um lindo vestido rosa. Ela parecia literalmente uma boneca.

Ficamos nos encarando por uns segundos até ela abrir um enorme sorriso e gritar:

— Papai, a moça chegou! — ela me puxa pela mão e empurra a porta com seus bracinhos pequenos. A ajudei e passei a chave, a entregando.

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⏰ Last updated: Sep 23, 2020 ⏰

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