Capítulo I

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Cá estou eu. Vestida de branco, buquê em mãos. Cabelos presos em tranças delicadas e complicadas. Meu rosto está meticulosamente pintado a fim de explorar minha beleza in natura, como disse a maquiadora. Mas dos meus olhos escorrem lágrimas como as cachoeiras de minha infância, deformando a linda pintura antes presente em minha face.

Ainda pode-se ver o branco quase inexistente do meu vestido se forçar só um pouco. O resto é lama, grama, um pouco de tinta, terra, café e qualquer outra coisa que eu tenha me esbarrado em minha fuga e não percebi ainda. Hoje seria o dia do meu casamento, o dia mais feliz da minha vida.

E realmente seria o dia mais feliz, por que, a partir dali, eu nunca mais esboçaria um sorriso sincero.

Papai sabia disso. Todos sabiam disso. Mas, mesmo assim, inventaram uma viagem de última hora para o país que sempre sonhei em visitar com a desculpa de ser meu presente de aniversário. No fundo eu sabia que tinha algo de errado acontecendo. Mas, também, eu sabia que se me opusesse, eu estaria aqui de qualquer forma.

Como eu escapei dos seguranças que Papai tinha contratado, eu não sei. Mas o fiz e cá estou eu, vestida de noiva (mais parecendo a Noiva Cadáver, para ser sincera), meu lindo e delicado vestido mais sujo que o Tâmisa e meus cabelos parecendo um ninho de pássaros dentro de uma scoona à caminho de um país mais desconhecido que a verdadeira identidade de Jack, O Estripador.

Panem.

Não estava nos meus planos ir para esse país, mas ao ler a placa dos destinos disponíveis para viajem naquela hora, eu tinha certeza de que era ali que deveria ir. Era um sentimento estranho, mas poderoso e só o segui porque precisava escapar na Grécia e das garras do meu pai o mais rápido possível.

Olhares de toda a embarcação me encaram como se fosse a coisa mais assustadora que já viram na vida. Tento ignorar, mas não posso dizer que estou a minha melhor versão hoje. Não durmo há quase 24 horas e tenho quase certeza que devo cheirar a algo um pouco menos pior que lixo orgânico há dias se decompondo sob o sol escaldante do verão.

Minha sorte foi ter feito aquela minha primeira conta bancária pessoal que nunca falei para ninguém de sua existência. Se tivesse utilizado qualquer outra conta, Papai já teria me achado e trancafiado em algum quarto de hotel até que eu pudesse sair para ser forçada a assinar papeis de casamento com o cafajeste do Gale Hawthorne.

Mamãe se casou bem nova com o meu pai e me teve não muito tempo depois. Papai era o herdeiro da Snow's Enterprises e a vida deles mudou de água para o vinho quando meu avô morreu subitamente quando eu tinha 4 anos de idade. Papai já era muito rico antes de tomar poder total da empresa de moda mais poderosa em ascensão dos EUA e depois disso foram anos de luxo. Até que as ações caíram e se voltaram para a Hawthorne's. Papai nunca foi de ir para guerra quando poderia haver um diálogo e essa sempre foi uma das coisas que mais admirava nele.

Corioalnus Snow não perdeu tempo e arrumou uma bateria de reuniões com os diretores da Hawthorne's e resolveram o que seriam anos de briga de empresas em um simples casamento entre eu e o filho de um dos diretores. O problema era que o filho em questão era Gale Hawthorne, meu antigo melhor amigo agora cafajeste-nojento-que-desprezo. O acordo foi assinado quando eu tinha 10 anos e Gale tinha 13. Nenhum de nós sabia da existência do mesmo, mas sempre houve tentativas e mais tentativas de ambas as famílias em nos tornar um casal.

Por muito tempo da minha vida, eu pensava que era assim que seria. Que me casaria com Gale e nossos futuros filhos herdariam duas enormes empresas. Entretanto, quando Gale fez 18, eu comecei a enxerga-lo de outra forma quando o peguei na cama com a minha melhor amiga não mais que duas semanas depois dele ter me pedido em namoro. Nossa relação nunca mais foi a mesma desde então.

Entre Mentiras e Amor (EVERLARK)Where stories live. Discover now