Pretty Paper - Parte I

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25 de novembro de 2020 – Rafaella

Esses chás de ervas que os patrocinadores mandam deveriam funcionar para o sono. Eles me fazem jurar que funcionam quando faço as propagandas. Mas talvez para mim seja diferente. Não durmo bem quando minha cabeça está lotada de pensamentos, o que é quase todas as noites há muito tempo. Isso significa que nem um milhão de litros de chá iriam me fazer desacelerar.

Meu remédio é outro. Bom, talvez não seja um remédio eficiente porque continuo não dormindo muito. Sempre me levanto da cama no meio da madrugada, pego meu velho e inseparável caderno e me tranco no banheiro por horas. É isso que me relaxa.

Eu não faço a menor ideia de que horas seriam agora, mas sei que estou aqui há muito tempo, sentada no chão, com o caderno apoiado na tampa da privada. É a última página e tento aproveitar ao máximo porque não quero me desapegar desse caderno para começar um novo. Esse conhece todos os meus mais profundos pensamentos, os mais intensos sentimentos de felicidade, tristeza, angústia, solidão. Principalmente solidão.

Quem vê de fora acha que eu tenho um império. Amigos, fãs e um relacionamento estável com Daniel Caon, um cara que demonstra a cada story, tweet e entrevista que está perdidamente apaixonado por mim. Bom, quer saber a verdade? Meu relacionamento é marketing, meus amigos quase sempre estão ocupados demais e meus fãs, por mais carinhosos que sejam, nem sempre conseguem me entender.

Acho que ninguém notou a minha falta ainda, todos devem estar dormindo. Isso é bom. Eu acho. Eu meio que me acostumei a solidão. O vazio se tornou meu amigo desde que eu parei de reclamar dele pra mim mesma.

Deixe-me explicar: não sou infeliz. Eu gosto da minha vida, gosto do que tenho atingido com a minha carreira, eu sempre sonhei com a fama. E também gosto dessas pessoas que estão à minha volta. Mas não posso deixar de evitar o sentimento de vazio. Não que eu esteja mais reclamando.

Notaram a minha falta. Ouvi os toques na porta e a voz de Flavina me chamar.

– Rafa? Há quanto tempo você está aí? Sabe, já é de manhã. Tem muito trabalho e... bom, você foi indicada para o Prêmios Contigo Especial de Natal... em duas categorias.

– Legal Fla, depois eu dou uma olhada.

– Rafa, eu acho que você vai querer dar uma olhada nisso agora – ela enfatizou a última palavra, o que me gerou certa curiosidade.

Me levantei e destranquei a porta. Ela estava parada do outro lado segurando o celular na mão e me olhando como se temesse alguma reação minha. Sem dizer nada, tirei o aparelho de suas mãos para olhar a tela.

– Ok, melhor Instagram. Eu já esperava.

– Continua rolando a página – sua voz parecia tensa e, por isso, olhei desconfiada para ela por um segundo antes de acatar a ordem.

– Melhor amizade... com a Manu. Tá, qual o... – perdi a fala quando vi a minha segunda indicação naquela mesma categoria. Precisei ler duas vezes para ter certeza de que eu não estava delirando. Sim, realmente estava escrito lá.

Bianca Andrade e Rafa Kalimann - Rabia

– Tem... tem alguma coisa errada aqui. Fla, escuta, hoje eu não tô muito pra brincadeira – eu não queria acreditar no que a voz da fundo da minha mente dizia. Não tem como ela estar brincando. Mas eu queria que estivesse.

Ela confirmou o meu temor.

– Não é brincadeira, pode olhar, é o site oficial.

Esfreguei a mão no cabelo e me sentei bufando na cama, largando o celular de lado. Flavina respeitou meu tempo de processar e só depois de alguns segundos é que questionou.

Um Beijo Sob O Visco - Contos de NatalWhere stories live. Discover now