Doida, doída e dark

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Para começar, eu preciso me apresentar que eu quase esqueci. Meu nome é Maria. Apesar de ser nome de santo e coisa e tal, lindo e adorável, um nome principal que costuma acompanhar outros nomes, eu sempre achei chato e, como todos gostavam de dizer, sofrido.

Eu me chamo Maria das Dores.

Com um nome desses e, ainda mais quando se é adolescente, te faz querer desaparecer do tanto que dói. Sim. Quando eu passava perto dos outros, fosse na escola, fosse no apartamento, havia rumores, senão gritos de : Ai! Ui ! Pra lembrar do meu nome.

Adolescentes podem ser muito bobos. E cruéis.

E eu, bem. eu era... eu mesma. Extremamente desconfortável, instável e tímida com pouca habilidade em montar conjuntos de roupa. Uma pessoa em constante transição, pelo menos, isto era o que minha terapeuta dizia enquanto os outros preferiam me rotular de perturbada.

Chocante como pode parecer, depois de descrever a emoção ao olhar o meu vestido pink perfeito, eu abominava a cor pink. Foi uma fase. Uma fase muito estranha da vida. As pessoas dizem que as vida vem em fase como as da lua, mas eu te digo que, na minha vida, era um eclipse eterno. Eu era e vivia muito dark. A única coisa que eu me lembrava.

Aliás, eu adorava essa palavra dark e tudo que tivesse relacionado a ela.

Gostava de preto e abusava de delineadores ou lápis que formavam um enorme borrão sinistro embaixo dos meus olhos. Abominava o sol, também, quase como uma vampira. Só que sempre tinha enjoo quando via sangue demais. Essa coisa de vampira não ia colar comigo.

E eu não sabia me maquiar muito bem. E nem tinha o menor senso de estilo. Gostava de me arrumar de um jeito que fosse propositalmente perturbador e tinha um certo orgulho disso.

Não era emo. Não gostava de rock e nem tinha uma banda.

Eu era dark.

Sim. Essa era o meu mundinho e nada muito colorido era permitido.

Nenhum sorrisinho da cor do arco-íris, nenhum convite ao parque no domingo sereno com golden retrievers e felicidades. Eu vivia em constantes surtoquito (surto + faniquito ).

Enquanto a meu pai recorria à ciência e buscava remédios para meu desvio de conduta porque achava que qualquer hora eu ia começar a fazer algo muito ruim contra a sociedade e fazer jus ao meu nome, minha mãe buscava algum caminho por meio da religião.

Devo dizer que quase fui, muitas vezes, alvo de práticas não tão usuais e até meio extremas para tentar alinhar, realinhar, endireitar o meu caminho... ou qualquer coisa muito esotérica que possa parecer.

O meu caminho era dark, obscuro e sinistro.

Eu era dark, obscura e sinistra.

Divertia-me (menos com os apelidos dolorosos) os rumores que eram inventados sobre mim na escola: que eu era metaleira e tinha uma banda com adultos de 40 anos, que eu tinha compartilhado um morceguinho com Ozzy Osbourne, que eu havia uma conta para vender fígados na deep web, que eu me cortava com gilete)...

A única que realmente me via como uma pessoa a não ser temida ou ''doída'' era a minha vozinha.

E foi ela que me fez mudar totalmente meu guarda-roupa. E minha vida inteira para falar a verdade.

Um vestido perfeitoWhere stories live. Discover now