Final II

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É engraçado como um simples gesto ou momento pode ressignificar uma vida inteira

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É engraçado como um simples gesto ou momento pode ressignificar uma vida inteira. Em um segundo encontro-me com o cano de uma pistola emaranhando meus cabelos, e no seguinte, sou abrasada por uma forte onda de adrenalina. Mesmo eu tendo feito uma escolha ao prometer à Akoman um espetáculo banhado a carmesim, dei-me conta de que minha ação resultou em um leque de outras opções. 

 Respiro fundo, relaxo os ombros e engulo o medo paralisante, superando-o quando destravo a arma ainda com o cano em minha têmpora. Se eu morrer esta noite, mesmo que contra a minha vontade - vontade essa que, de uma hora para outra, clama por vida - ao menos deixarei claro ao demônio de olhos azuis que não há submissão. Não ficarei a mercê de seus fetiches sanguinários, nem tolerarei novamente as investidas de Valak ou as ameaças de Andras.

 O único desejo que prevalecerá será o meu.

 – Está com medo? – o rapaz me provoca, lambendo os lábios, deliciando-se ao me ver com uma arma de fogo carregada apontada para mim. 

 – Nenhum pouco – respondo com firmeza, mesmo que haja uma parte de mim que apavora-se com as milhares de possibilidades do que pode acontecer.

 Apesar de ter esperado por esse momento, um pretexto para enfim desligar a consciência do meu corpo, agora que ele chegou algo parece ter mudado dentro de mim. Em algum lugar próximo ao meu coração, sinto uma fagulha se acendendo, e tenho certeza que se eu a alimentar com o combustível correto ela me incendiará por completo. Apesar disso, não há mais como eu voltar atrás, então o que me resta a fazer é traçar uma estratégia, uma rota de fuga. 

 O medo é quase paralisante, mas mais uma vez eu o venço, lutando contra o sabor amargo da bílis que parece subir pela minha garganta. Eu a engulo, estalo a língua e saboreio a sensação eletrizante do perigo iminente. Eu tremo. Mais e mais. Parece que quanto mais eu tento organizar meus pensamentos, mais minhas mãos seguem o fluxo desordenado de flashes que atravessam meus olhos. Mesmo quando eu os fecho.

 Eu já tomei minha decisão. Escolhi a partir do momento em que coloquei os dedos no metal frio da arma, contudo, agora que a empunho próxima a minha cabeça, meu corpo parece ter se tornado pedra, impedindo-me de concretizar meus anseios. Metade de mim discute com a minha razão, perguntando-se se isso é de fato o melhor a se fazer. Enquanto isso, minha outra metade é puro impulso e explosão.

 Meus lábios tremem e eu engulo o soluço, controlando assim minha respiração. É quase impossível descrever o que sinto quanto o cano roça contra meus cabelos, pois é como se o meu sangue congelasse em minhas veias, e consequentemente elevasse meu ritmo cardíaco e depois o cessasse. Dei-me conta de que não quero morrer assim. Não aqui. Não agora. Não desse jeito. Se algum dia eu tiver que puxar o gatilho e então estilhaçar meu crânio e espalhar meu cérebro em uma parede, eu farei essa escolha por conta própria, e não porque desejo fugir das mãos de homens que pensam que tem o direito de decidir por mim se eu vivo ou morro.

Quando soam os sinos [Concluída]Where stories live. Discover now