Uma mulher enigmática e indecifrável

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Os dez dias seguintes passaram de forma bastante diferente dos anteriores. Sarah sentiu essa diferença e, quando falaram no regresso à América como algo assente, não se revelou surpreendida nem incomodada com a decisão de Jonah, ainda que intimamente estivesse um tanto desiludida. Sentiu a felicidade prevista a desaparecer e, naturalmente, preparou-se para voltar à vida que outrora tivera, junto das mesmas pessoas que até então a acompanharam, junto do previsível e antigo Jonah. Tirou mais fotografias nesses dez dias que restavam, uma vez que Jonah insistia em trabalhar durante a maior parte do dia e Sarah queria regressar com muito material para trabalhar. Tinha uma edição sobre Paris já prometida para a American Photo e ia trabalhar afincadamente nela. 

Numa das noites, Jonah veio ao encontro de Sarah com a novidade de que encontrara um amigo próximo de Nova Iorque que, curiosamente, era o encenador da peça que haviam visto. Jantaram juntos numa noite e, dois dias mais tarde, encontraram-se no Le Caveau de la Huchette, para beberem um whisky. Joseph levava com ele Crystal Philips e Joel Cage, os dois protagonistas do Cat’s Pajamas. Saudaram-se, foram apresentados e sentaram-se a uma mesa redonda, num canto mais resguardado. Joel, Jonah e Joseph pediram whiskies e Crystal acompanhou-os, para grande surpresa de Jonah. Sob a luz amarelada do estabelecimento, o cabelo e os olhos dela resplandeciam. 

- Não é uma bebida muito feminina – constatou Jonah, de olhar vincado na atriz. 

- Não sou uma rapariga muito feminina, suponho.

Dos restantes elementos que estavam sentados em torno da mesa, Joseph exclamou entusiasticamente:

- Nada feminina! 

Joseph e Crystal aparentavam ter uma amizade que ia para além do relacionamento profissional que logicamente possuíam e Jonah pensou se estariam romanticamente envolvidos. Viu-se subitamente atacado por uma sensação de ciúme pelas atenções que Crystal concedia ao amigo. 

- Estás cá a viver? – perguntou Sarah a Crystal e todos acompanharam o decorrer dessa conversa atentamente. 

- Oh, não. Viemos este mês para a estreia da peça, antes disto estivemos na Itália e ainda íamos à Alemanha, mas cancelaram o espetáculo. Voltamos a 30 para a América.

- Porque cancelaram, posso perguntar?

- Sim, claro, porque me foi oferecido um papel num filme e tenho de voltar para a América, para começar preparar-me. 

- Oh! Isso é fantástico!

- Sim, é bom. Espero estar à altura do papel, penso que me falta a preparação necessária. Mais algumas aulas.

- Aulas? Tens aulas?

- Sim! Já represento desde muito cedo, mas recentemente comecei a ter aulas. É muito engraçado, porque sempre pensei que não o faria, pelo menos não nesta altura, mas, após várias considerações, concluí que tirarei benefícios disso. 

- Sim, claro, sem dúvida.

- E namora com o professor de teatro – disse Joseph.

Sarah riu-se e deitou-lhe um olhar curioso para estudar a sua reação. Era o tipo de mulher de quem se esperava namorar com alguém mais velho. Crystal sorriu e bebeu o resto do whisky.

- Oh, Joe, ninguém tem o mínimo interesse na minha vida!

- E bebes whisky mais rápido do que eu! – disse Jonah intrigadíssimo.

- Já disse, não sou muito feminina. 

- És uma esponja.

Entre risadas e observações curiosas entre o encenador e a sua atriz, Jonah e Crystal trocaram o que parecia ser um profundo entendimento do que era uma vontade que ambos partilhavam. Uma inclinação, um chamamento, um apelo discreto mas violento, do qual apenas eles se aperceberam.

O Pijama da GataWhere stories live. Discover now