Belle de Jour

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Procuravam o conforto daquele hotel como procuravam o conforto um do outro, pois havia uma simbologia muito intensa em todos os elementos que o constituíam e que fomentavam e alimentavam associações ilusórias para cada um deles na sua relação. Crystal via aquele hotel como o típico cenário de um filme, possuía um ar antiquado, envelhecido por outros amantes ilegais que ali se tinham encontrado, mas a teatralidade existente na disposição dos elementos no quarto e na iluminação era quase tão acolhedora como a sua casa. Posicionava-se no palco das suas atuações. Curiosamente, tinha aconselhado Pierre a utilizar uma estrutura muito semelhante no set do filme em que trabalhava no qual várias sequências eram também filmadas em quartos de motéis. Sugerira a disposição dos elementos com um detalhe tão meticuloso que, ainda que alguns traços fossem distintos, aquele era o mesmo quarto em que ela trabalhava no estúdio. Para Jonah, por outro lado, representava uma impessoalidade visceral, um desapego humano, um vazio existencial. Era o local onde imaginava que se perdiam os homens como ele, onde se visualizava a si mesmo perdido. No entanto, havia uma musicalidade naquele sítio que o transportava para a essência da sua profissão. Estavam em casa. Provavelmente, seria assim a sua casa, se alguma vez a possuíssem, seria como aquele quarto.

 Sarah tinha começado a trabalhar num horário bastante diferente do usual e eram frequentes as noites que passava fora. Chegava de madrugada ou já pela manhã, exausta e não era incomum que não se encontrassem. Tinha-se criado entre eles um desapego que acontecera de forma bastante natural e nenhum dos dois expressava já grande interesse sobre o sítio onde o outro estava ou na companhia de quem o fazia. Quando comunicavam, o diálogo que mantinham era muito curto e ausente de significado, Sarah dialogava sobre alguns trabalhos, sobre projetos em que se via envolvida e perguntava-lhe sobre a sua música. Há já muito tempo que não lhe pedia para escutar o que compunha e também não revelava particular interesse em fazê-lo, eram dois estranhos que dormiam na mesma cama. O sexo tinha-se tornado escasso, quase inexistente e culpavam os horários e o cansaço, mas não a ausência de vontade. Jonah não se afligia com este vazio que se começava a criar entre eles, o receio de perdê-la parecia ter-se camuflado com aquele desapego, aquela frieza, mas sem angústia e maldade. Já não se importavam, mas estavam lá um para o outro de qualquer forma. Encontrava-se com Crystal com mais regularidade e, como lhe prometera, não pensava nas consequências que o encontro poderia ter na vida um do outro. Banira essa linha de pensamento de toda a sua consciência e, pela primeira vez nalgum tempo, aprendera a desfrutar completamente de um momento com outra pessoa. Andy e Clyde viam-no todos os dias e, uma vez que a produção artística parecia aumentar exorbitantemente, os rapazes diziam que ele parecia inspirado ou possuído por um mal benéfico.

- A miúda faz-te bem – disse-lhe Andy certa vez, o único que conhecia os encontros adúlteros deste, mas Jonah desmentia qualquer continuidade dessa relação.  

- Não vale a pena desmentires, eu sei que a continuas a vê-la, lê-se nessa cara de parvo que levas para todo o lado! A miúda deve ser explosiva nos lençóis.

As mulheres que conhecia nos concertos já não lhe pareciam interessar tanto e aguardava o momento em que se fundia no corpo sensual da sua musa, era por ela que produzia, era por ela que respirava e era graças a ela que ainda tinha inspiração para trabalhar, tinha muito que lhe agradecer.

- Que achas do meu nome? – perguntou ela na voz agradável a que já se tinha acostumado. 

Jonah pensou durante alguns minutos na resposta.

- É bom…adequa-se.

- Achas que sim? Resume-me, não é? Os meus pais foram muito meticulosos, mas arriscaram muito, podia ter saído uma Jasmine.

- Não te resume, mas caracteriza uma parte de ti.

- Ainda que eu seja uma total estranha para ti.

O Pijama da GataWhere stories live. Discover now