Tanatofobia

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"E as crianças, em algazarra perguntavam: Sibila, o que anseias? E em meio aos mais pungentes lamentos, a voz sussurrava, cava: Ah, eu anseio morrer".
- Ovídio (Metamorfoses).

"A existência precede a essência."
- Jean-Paul Sartre.

"Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro."
- Machado de Assis (O Espelho).

*Narração de Rachel*

Olhei a minha volta, tudo estava completamente escuro, havia apenas eu e minha tia, completamente mudada.

- Este, é o Átrio, é meio que uma parte da mente de cada um, diria que cada sonho seu, cada pensamento, foi mostrado em um lugar assim em sua cabeça.

- T-tia? - eu estava completamente ignorando o que ela havia dito, finalmente estava vendo a pessoa que pensava estar morta, que pensava ter traído.

Mas estava acontecendo algo muito errado.

E nem era o fato de agora ela ter a pele de uma folha de papel e marcas de "x" nos olhos, tinha algo mais por trás.

Parecia que faltava uma sensação, algo estava faltando naquilo tudo, um cheiro.

A vida, não havia sensação de vida ali, parecia tudo morto, tudo vazio, sem vida.

Eu senti um movimento em minha perna e um latido ao longe, o cachorro ainda estava ali, em meio a toda aquela escuridão, me senti como se estivesse tendo um sonho muito pesado e alguém tentasse me acordar frequentemente.

Depois de muito esforço, consegui olhar diretamente para minha tia.

Consertei minha postura e procurei achar palavras para falar, nenhuma delas pareceu correta. Foram anos sem eu a ver, como poderia dizer algo que fosse merecedor desse momento? Impossível.

- Oi - falei, quase gaguejando, eu estava funcionando praticamente no automático, não sabia como me comportar em uma situação assim, nunca imaginei que eu estaria falando com ela novamente.

Comecei a suar como no dia que me encontrei com minha mãe na casa dela em meu retorno a Towerkuns. Isso seria engraçado se nessa situação não fosse deprimente.

- Olá, sobrinha - minha tia disse calmamente e de uma forma estranhamente nostálgica e aconchegante - tem muito a ser explicado não é mesmo?

Ah, havia, e como havia.

- Bom, toda história começa pelo começo não é mesmo? - disse ela, parecendo querer enrolar, falando coisas sem importância. Suspirou, de alguma forma sem soltar ar, o que me assustou - era uma vez uma pessoa ingênua, uma pessoa com um medo terrível de um destino do qual não poderia fugir, de um destino selado e decretado a todos os amaldiçoados com a vida, a inevitável morte.

Eu estava ainda esperando alguma espécie de armadilha doentia. Talvez algum lobisomem horroroso pulasse das sombras e arrancasse minha jugular, quem sabe?

Lúcia, minha tia, estava mesmo ali? Ou era apenas alucinação?

Ela vive mesmo?

- Sempre tive esse medo, o medo do fim, por que tudo tem de acabar não é? Eu estava assustada, assustada com o que estaria além da moeda, do que estaria além da vida. Se é que havia algo, e esse destino que me apavorava mais, o de sumir, o de deixar de existir, o de simplesmente e sem nenhum drama ou ponto final adequado... Poof, acabou.

"O que será que havia? Ninguém voltou para contar então como saber não é mesmo?" Ela riu de maneira deprimente e irônica, estranhei muito aquilo, não soava humano, não soava sequer vivo "Ou será que a alma continuaria a existir, mas presa em uma escuridão eterna sem sons, cheiros ou sensações? Ou será que acabaria vagando eternamente por um gramado sem fim, vazia de minhas próprias memórias e de emoções? Será que eu iria acabar em um local de tortura eterna até meu ser queimar? Como saber? Não tinha como, e isso me assustava, precisava saber, precisava me libertar, precisava impedir tal destino grotesco e existencial."

A Essência da Morte: O Olho VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora