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Halsey enrolava uma mecha de cabelo no dedo enquanto esperava do lado de fora da sala de Susie, não que tivesse prestado atenção quanto tempo fazia que o amigo tinha entrado na sala, mas acreditava ser mais que o habitual.

Ele havia lhe contado sobre o reflexo que viu, na hora ela o confortou falando que poderia ter sido qualquer outra coisa, igual quando uma pilha de roupas pode parecer com uma pessoa o observando. Mas pelo ângulo não tinha uma janela, não tinha como ser um reflexo da rua, tão pouco alguém ali de fato, a porta sempre estava trancada. Ela aprendeu a mantê-la assim.

Puxou o capuz para cima da cabeça quando ouviu o barulho da porta sendo aberta, sorriu ao ver Ashton e logo se pôs de pé.

— Como foi? — Perguntou, entrelaçando o braço ao do amigo quando ele ficou ao seu lado.

— Acho que correu tudo bem, mas, ela está cogitando a possibilidade de remédios...

— Uh, isso é... — Colocou os óculos escuros, a distância entre a rua estava sendo encurtada a cada passo. — O que você acha?

— Fletcher! — Susie gritou, ainda na porta de sua sala, começou a andar em sua direção. — Esqueceu o folheto explicativo.

Halsey se desvencilhou do braço alheio e continuou andando, sem olhar para trás, alcançou a rua e sumiu do campo de visão das duas pessoas no pequeno corredor.

— Ah, sim. — Forçou um sorriso ao alcançar o folheto das mãos delicadas da moça. — Obrigado.

— Tudo bem com ela?

— Acredito que sim, ela gosta do sol... Bom, pensarei sobre. — Ergueu o papel antes de seguir rumo a rua. Encontrou a amiga a sua espera, encostada em uma árvore logo ao lado da entrada. — Fugiste?

— Até parece. O que você esqueceu lá dentro? Esse papel? — Tomou da mão do amigo e deu uma lida rápida. — Entendo.

— Psiquiatra. Para caso precise da medicação.

— Vamos a sua casa hoje. Sinto que faz tempos que não vou lá. — Mudou de assunto, vendo como o outro estava para baixo.

— Mas a sua casa é mais perto, tínhamos combinado de ir para lá. Tem certeza?

— Podemos levar pizza e ficar trancados no seu quarto até a sua mãe me expulsar de lá!

— Aceito a pizza. — Deu-lhe um sorriso triste, enquanto andava pela calçada.

Halsey disse não precisar passar em casa, ligou para a pizzaria para não perder tempo esperando a pizza ficar pronta, não queria perder o ônibus.

A casa de Ashton era mais afastada, em uma área onde as casas não eram grudadas uma a outra. Tinha uma certa paz morar ali, ao mesmo tempo que era ruim precisar de algo por ser longe de quase tudo.

A garota sempre dizia que ir a casa do amigo era como estar em outra dimensão, fora da cidade, fora de órbita. Ela gostava daquela atmosfera, mas não conseguiria ficar mais que um dia, estava acostumada demais a todo o movimento constante, por mais que fosse irritante em alguns momentos. O fato é, você se acostuma a tudo, até mesmo com o que não deveria por ser algo ruim.

A viagem durou uma hora. Halsey usou todo esse tempo pra contar sobre sua nova série favorita, assunto esse que prendeu a atenção do amigo, mas não o suficiente pra convence-lo a assistir.

— Você pareceu gostar, por que não assistimos um episódio juntos? — Insistiu pela terceira vez.

— Outro dia. Hoje eu não estou no clima. — Suspirou, procurando as chaves de casa.

Nunca, nesse caso. Ouvir música te ajudaria a entrar no clima?

Ashton sorriu, achava interessante como a amiga conseguia falar naturalmente coisas de duplo sentido. Às vezes tinha medo de que ela fosse mal interpretada mas felizmente isso parecia não acontecer.

Girou a chave e abriu a porta. O silêncio pareceu suspeito para a garota de cabelos curtos, por isso ela não entrou, cruzou os braços abaixo dos seios e encarou o loiro.

— O quê? Por que está me olhando assim?

— Sua casa... Está vazia?

— Ah, é. Por algumas horas será só nós dois aqui. Isso te incomoda? Minha mãe deve voltar em duas ou três horas, não tenho certeza.

— Eu gosto da sua irmãzinha... Certo, a casa é nossa! — Pulou em comemoração antes de entrar.

Não que isso fizesse muita diferença, não se sentia desconfortável na presença da mãe do amigo.

A garota seguiu até o quarto de Ashton, caminho que saberia fazer de olhos fechados. Entrou e se jogou na cama, encarou o teto por alguns segundos antes de reparar no quarto.

— Por que cobriu metade das coisas?

— Não gosto mais delas. — Deu de ombros.

— Não gosta dos espelhos... Virou os portas retratos... Fechou as janelas com cortinas... Engraçado, todas as superfícies com reflexo estão cobertas. Tem relação?

— Por que fugiu quando a Susie apareceu? — Mudou de assunto. Falar em voz alta faziam as coisas parecerem piores.

— Eu não fujo, evito conflitos. É diferente.

— Conflitos? Você tinha me dito que eram amigas...

— E você está mudando de assunto. Pode confiar em mim, eu não vou julgar. E sim, eu e Susie fomos amigas, mas isso aconteceu há algum tempo. Meio que eu não sou a pessoa que ela mais gosta atualmente. Mas isso não é importante. Me fala, as coisas estão piorando?

— Então vocês não são amigas?

Halsey revirou os olhos, sabia que o outro estava mais interessado em saber o que aconteceu entre ela e Susie do que contar sobre como se sentia. Ela alcançou a bolsa que tinha deixado no chão e pegou o celular, passou a ignorar o amigo e focar apenas no que estava fazendo. Isso durou pouco tempo.

— Entendo. Está com medo de estar alucinando. Não acredito... Cara-

— Invasão de privacidade!

— Eu sei, mas é por uma boa causa... E é a última vez que farei isso.

— Espero que realmente seja. Faz assim, vai esquentar a pizza enquanto vou tomar banho. Não quero pensar sobre tudo isso agora.

— Certo, certo. — Levantou da cama, andou até a porta mas parou, virou para olhar o amigo. — Se você tivesse uma banheira, te acompanharia no banho. — Sorriu com falsa malícia.

— Vai se foder, burguesa safada. Eu vou me trancar no banheiro por precaução.

Ela piscou antes de sair, deixando o clima menos pesado. A verdade é que ela gostava de descontrair, nem que fosse de maneiras não convencionais.

i watch youWhere stories live. Discover now