III. Quanto valeu?

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Sexta-feira, 28 de maio de 2021. Rio de Janeiro, Brasil.

– Você parece feliz hoje – Marcela fala assim que me sento à sua frente – chegou sorrindo e com o rosto corado...

– Cheguei? – pensa rápido, pensa rápido – deve ter sido o calor, essa blusa aqui esquenta demais.

"Pensa rápido mas pensa algo decente, Bianca. Hoje milagrosamente o Rio de Janeiro está se acabando com chuva e você falando que está calor, é uma anta mesmo"

– Calor? – o olhar de Marcela é quase como um "sei que você está mentindo" – quer que eu diminua a temperatura do ar?

– Não precisa não, assim está ótimo, logo logo passa o calor.

– E além do calor, aconteceu mais alguma coisa? – ela questiona – talvez queira conversar sobre o motivo do seu sorriso hoje.

"Talvez não seja a melhor ideia do mundo falar que cheguei sorrindo assim porque estava conversando com a sua irmã, e ela estava me falando várias gracinhas e por isso cheguei sorrindo igual uma idiota."

– Apenas tive uma boa semana, a nossa conversa na semana passada foi muito boa, me fez pensar bastante.

– Como você se sente agora depois de tudo o que conversamos na semana passada e depois de descobrir tudo aquilo que você me contou sobre a conversa com sua mãe?

– No começo eu fiquei confusa, mas parece que o universo está conspirando para me fazer enxergar algumas coisas sabe – ri com a lembrança do que aconteceu segunda-feira.

– Me explica melhor isso aí – Marcela também sorriu.

– Segunda eu fui almoçar em um restaurante novo que abriu perto da empresa, e acabei encontrando com uma ex-colega de faculdade. Conversa vai, conversa vem, ela acabou me contando sobre a atual situação dela. Lembro que no tempo da faculdade ela comentava que tinha alguns problemas com o seu pai, mas nunca aprofundava muito, aí na segunda ela acabou me contando sobre isso. O pai dela nunca foi muito presente, estava sempre saindo e costumava passar todo o fim de semana fora, traindo a mãe dela, e causando brigas constantes. E para piorar o marido dela parece está seguindo o mesmo rumo, e ela tem medo de terminar da mesma forma que a mãe – relembro as palavras dela – ela disse que não foi uma criança e adolescente feliz por viver dessa forma, e sabia que a mãe também não era feliz assim, e o maior medo dela era ficar presa na mesma história que a mãe e acabar levando esse sofrimento para o filho dela também.

– E você relaciona isso ao que sua mãe te contou...

– Exato. E se meu pai não tivesse ido embora? – pergunto retoricamente – talvez meu destino tivesse sido parecido. Minha mãe poderia ter sofrido em um casamento que não era perfeito e nunca conheceria o verdadeiro amor da vida dela, eu poderia ter tido uma infância infeliz só por ser criada por uma pessoa que também não conseguia ser feliz.

"Mamãe estava certa, nós não éramos parte da equação do meu pai, assim como ele nunca foi parte da nossa"

– Eu fico orgulhosa de te ver enxergando tantas coisas em tão pouco tempo – o tom de voz de Marcela é genuinamente feliz – Isso me faz pensar que já está na hora darmos outro passo nos seus problemas.

"Por favor, não diga superar trauma de abandono em relacionamentos, não diga superar trauma de abandono em relacionamentos."

– Superar esse trauma que você tem de ser abandonada em seus relacionamentos, e que te impedem de se abrir para novas pessoas – Marcela fala e logo sinto o meu divertidamente do medo ativando o botãozinho do pânico.

InefávelWhere stories live. Discover now